Morreu Francisco (2)
Para lá do escândalo da TV pública a dedicar infindáveis horas
dos três canais à morte do Papa e das piruetas dos que nunca o apreciaram,
surpreendeu a transferência dos comentadores das guerras na Ucrânia e na
Palestina para o comentário pio.
Podiam ter-nos poupado a ouvir tantos padres e bispos, e a ver
tantas batinas e tantos colares romanos a emoldurar cachaços eclesiásticos,
enquanto o mundo continuou a girar e as outras notícias importantes foram
omitidas!
Quando disseram que Francisco sucedeu a um Papa erudito,
ignoraram o valor dele e a razão dos padres jesuítas, os mais preparados, não
quererem ser bispos, salvo em casos excecionais, o motivo por que foi ele o
primeiro Papa oriundo dos discípulos de Loyola.
Foi inaceitável a manutenção do protocolo salazarista na
declaração de três dias de luto para chefes de Estados amigos falecidos em
funções, pelo que decretou três dias de luto insólito por Hitler, em teimoso zelo
fascista que os Aliados ignoraram.
Era importante dizer por que motivo provável Francisco optou
pela Casa Santa Marta, onde morou desde a eleição em 2013, mais salubre do que
os aposentos papais e com menos riscos alimentares ou medicamentosos em vez do habitat
tradicional do Vaticano. Talvez o desejo de ser enterrado longe dos
antecessores revele uma mensagem do único Papa jesuíta, o que infligiu uma colossal
derrota ao Opus Dei seita que, após dois papas seus, fracassou com Francisco, para
azedume de todos os Venturas do mundo.
Ver os próceres das religiões concorrentes que não poupam a
vida aos crentes das outras religiões a manifestar consternação pela morte de
Francisco, é como ver um vegetariano com sanduiches de leitão na marmita ou um
pacifista com o cinto de bombas à cintura.
Falta julgar os ratos de sacristia portugueses eleitos para
os mais altos cargos do Estado, inimigos da descriminalização da IVG, das leis
da Eutanásia, do planeamento familiar, e da autodeterminação sexual da mulher.
É urgente analisar o mal que o catolicismo fez às mulheres para impedir o que
podem fazer religiões bem mais misóginas e perversas.
Foram pobres os testemunhos dos eclesiásticos sobre o Papa
Francisco e oportunistas os dos políticos que se colaram ao cadáver na
suposição de que renderá votos. Até o tartufo Ventura teve direito a um comício
pio antes do tartufo-mor, um parasita da fé, ir debitar às 20H00 um ror de
adjetivos laudatórios. E desperdiçou-se a oportunidade de discutir a
discriminação da mulher nas Igrejas incluindo a do Papa que se finou.
Para quebrar a unanimidade podiam ter sido ouvidos João
Monteiro e Ricardo Alves, respetivamente presidentes da Associação Ateísta
Portuguesa e da Associação República e Laicidade no desfile no espaço
televisivo onde até a taróloga Maya teve lugar.
As televisões preferiram ouvir as ovelhas mediáticas do rebanho católico com estúdios transformados em redis onde ecoaram redundantes e repetidos balidos encomiásticos!
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