Papa Francisco

 Morreu Francisco.

Não esperam os leitores que o primeiro presidente da Associação Ateísta Portuguesa (2008/20020) se manifeste desolado com a morte do Papa. Nem sequer sinto tristeza, sinto-me, aliás, aliviado pelo fim do sofrimento do homem bom e generoso.

Deixo a consternação aos parasitas da fé, aos narcisistas que se gabam dos minutos de vida que estiveram com o líder dos católicos, aos vampiros do seu prestígio.

Ainda ontem vi o moribundo exibido e explorado pela Cúria, pelos funâmbulos da Cruz, como o fazem há dois mil anos ao corpo de Jesus, usando palavras dos versos de Guerra Junqueiro. Obrigaram-no a receber J. D. Vance, um celerado mais próximo do Opus Dei do que do Papa.

Agora que morreu, é ver os parasitas a explorar os sentimentos dos devotos para fins de propaganda pessoal, o Moedas a atribuir ao Papa o tratamento por tu que lhe teria dado, o Paulo Rangel a dizer que, para lá das questões que foi tratar como ministro, Francisco quis saber quem era o Paulo Rangel (sic), e o comentador Jorge Botelho Moniz, o nome causa calafrios a quem recorda o papel de outro Jorge Botelho Moniz na Guerra Civil de Espanha, a enaltecer o Papa que o horrorizou nas declarações sobre a guerra na Ucrânia.

Falta Marcelo a usar o telejornal das 20H00 para manifestar a bajulação habitual de um PR a que a Constituição exige respeito pela laicidade e de Montenegro que usará a sua morte para proveito próprio como fazem todos os parasitas da fé.

Os que se calam perante as perseguições aos cristãos e os seus templos que metódica e inexoravelmente vão sendo queimados pelo fundamentalismo islâmico, os que ocultam a vindicta contra os cristãos na Síria por um terrorista da Al Qaeda promovido a aliado do Eixo do Bem, são aqueles que agora manifestam compunção com a morte do Papa.

Como ateu, recordo o líder de uma teocracia que é hoje a sede espiritual de uma religião bem melhor do que qualquer outra da concorrência, o primeiro pontífice que condenou a pena de morte, quem foi a Lampedusa chamar a atenção para os refugiados sobrevivos do Mediterrâneo e que foi insultado por defender a paz quando o belicismo interessava aos que vivem do negócio das armas. Destaco particularmente a oposição às guerras na Ucrânia e em Gaza, que lhe valeram a ira dos responsáveis e o silêncio dos covardes.

Pela influência que o Papa exerce em milhões de crentes e pelo exemplo que pode dar a não crentes, desejo que os cardeais que criou, uso o termo canónico, não traiam e votem em quem seja capaz de continuar o seu profícuo magistério.


Comentários

Manuel M Pinto disse…
http://ladroesdebicicletas.blogspot.com/2025/04/jorge-francisco.html

«Este é um homem simples e direto, que se dirige a crentes e não-crentes, a todos, sem deixar de fazer distinções cruciais. Como já disse, é melhor ser-se ateu do que ir à missa e depois semear o ódio. Esta encarnação do cristianismo autêntico estava a pensar em políticos como André Ventura, certamente, nos vendilhões de todos os templos e de todos os tempos. Afinal de contas, Francisco já tinha defendido, em 2016, o seguinte:
“São os comunistas que pensam como os cristãos. Cristo falou de uma sociedade em que os pobres, os débeis e os excluídos é que decidem. Não os demagogos, os Barrabás, mas o povo, os pobres, tenham fé em Deus ou não”.
Prudentemente, um dos Barrabás nacionais decidiu evitar Francisco, indo para a Madeira. A verdade assusta-o. Os testemunhos de Francisco, a sua economia moral, são sempre um excelente antídoto contra os novos rostos do fascismo gerados pelo neoliberalismo.
Até à próxima, Francisco.»
Postado por João Rodrigues às 21.4.25
Manuel M Pinto disse…
https://www.abrilabril.pt/internacional/morreu-o-papa-francisco-0 
... ... ...
"Para a História ficará a intervenção do Papa Francisco no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, no dia 2 de Agosto 2023, durante a Jornada Mundial da Juventude que decorreu em Portugal. Na altura, Francisco, para além do acutilante repto que lançou à Europa, questionando o velho continente sobre a possibilidade de conseguir ou não «uma diplomacia da paz que extinga os conflitos e acalme as tensões», requereu respostas aos governantes de cada um dos países da União Europeia, nomeadamente, sobre as «vias inovadoras para acabar com a guerra na Ucrânia e com tantos conflitos que ensanguentam o mundo». Questionando ainda a disponibilidade dos líderes europeus para a edificação de «uma Europa que inclua povos e pessoas, sem correr atrás de teorias e colonizações ideológicas» e sobre o saber se a União Europeia «tem por objectivo promover a paz, os seus valores e o bem-estar dos seus povos»."
Carlos Antunes disse…
Carlos Esperança
Belo texto e uma boa análise.
Concordo inteiramente consigo.
Eu que não sou “crente”, mas também não sou “ateu”, vivendo naquela franja dos “agnósticos”, também fui um admirador de Francisco.
E admirava-o, mesmo sendo agnóstico, especialmente pelas suas intervenções sobre a actual economia capitalista “economia que mata” e o modelo neo-liberal «O mercado por si só não pode resolver todos os problemas, por mais façam a gente acreditar nesse dogma da fé neoliberal». «Não condeno o capitalismo “da forma como alguns me atribuem”, nem sou “contra a economia”, sou é a favor do que João Paulo II definiu como uma economia social de mercado”. “Isso implica a presença de uma autoridade reguladora que é o Estado, que deve mediar as partes”, disse, destacando que “é uma mesa com três pernas: o Estado, o capital e o trabalho», in “El Pastor”, livro dos jornalistas argentinos Francesca Ambrogetti e Sergio Rubin.
Ou quando ressalvava que a “riqueza produzida tem de ser distribuída por todos” para que seja “justa” e pedia uma reflexão global sobre um “novo mundo do trabalho”, com base no “trabalho justo”, no respeito no “processo produtivo” de forma a permitir o crescimento humano das pessoas, a harmonia dos tempos de vida familiar e laboral, e no direito do movimento sindical à negociação de condições de trabalho decentes e dignas com base na contratação colectiva (Carta encíclica "Fratelli tutti”, Mensagem aos participantes da 109ª Conferência Internacional do Trabalho, Homília “o Trabalho é a vocação do homem”, “Terra, Casa, Trabalho - Discursos aos movimentos populares, etc.)»
Cordiais saudações


Carlos Antunes disse…
Se me permite, e ainda sobre aqueles a quem bem chamou os “parasitas da fé”, aí vai o ponto mais alto da hipocrisia de um deles, do católico praticante AV:

“Eu acho que este Papa tem prestado um mau serviço ao cristianismo. Acho que tem mostrado a esquerda revolucionária quase como heróica e a esquerda europeia marxista como a normalidade. Acho que este Papa tem contribuído para destruir as bases do que é a Igreja Católica na Europa e acho que em breve vamos todos pagar um bocadinho por isso”.
André Ventura, entrevista a João Pedro Henriques, DN 31 de Outubro de 2020

“Hoje é um dia de tristeza e sofrimento para os cristãos do mundo inteiro. O Papa Francisco deixa uma marca inspiradora de proximidade e simplicidade que a todos tocou profundamente. Que a sua vida intensa seja um exemplo para todos os que querem servir a causa pública”.
André Ventura, rede social X, 21 de Abril de 2025

Um sorriso para as posições de André Ventura, um homem tão pequenino que cabe numa casa de 30 metros quadrados e ainda lá cabe o Moedas.

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