Um Condecorado de Amanhã

Um dia acordou ás 6 da manhã, no seu quatro do já antigo prédio cinquentenário na R. Guerra Junqueiro e saltando repentinamente da cama gritou: “Vou ser político!! Político!!”.

A correr qual bombeiro em direcção à mangueira certeira, dirigiu-se para a casa de banho para tomar o seu duche de água bem quente, como habitualmente gosta, quer seja Inverno ou Verão. Durante o banho, foi reflectindo sobre a sua intenção e talvez devido à temperatura foi murmurando: “ Não sou capaz! Nunca o conseguirei! Todos se vão rir de mim!”.

Ainda meio moribundo das ideias agora imbuídas de dúvidas, de incertezas e de medos sai porta fora de uma independência há dois anos conquistada e corre em direcção à paragem do Mercado dos SMTUC. Apanha um 29, apinhado de gente, em direcção ao seu local de trabalho. “Lá, vou encontrar o meu amigo apaixonado por política que me dará a força que necessito, pois sozinho não sou capaz!” pensa não reparando nos olhares de espanto perante o seu aspecto, que prontamente lhe possibilita um lugar sentado. Umas vezes, até aceita qual malandro aproveitando-se da generosidade alheia, mas naquele dia mais consciencioso de que realmente não precisa disse amavelmente: “obrigado mas vou bem de pé. A melhor ajuda que me podem dar é perguntar se e como quero ser ajudado”.

Chegado ao destino, ao entrar pela porta principal dos HUC, colegas e utentes deram-lhe os bons dias aos quais respondeu com a mesma simpatia. Excepto aquele ali, escondido por detrás do placar informativo, o de sempre: o parolo de canadianas que parece que não tem espelho em casa: “Oh meu, já te viste hoje ao espelho? Para cima! Onde está essa auto-estima?” disse humoristicamente.

Orgulhosamente já em frente ao elevador chama-o carregando no botão posicionado a meio metro acima do chão. Sai no 3º piso e dirige-se para o seu gabinete. Senta-se em frente ao seu computador e à sua linda colega Mafalda. Feliz da vida vai fazendo etiquetas para colar nos processos dos utentes já falecidos, antes de irem para o arquivo.
Entretanto, aparece o amigo apaixonado pela política mas sem filiação partidária: o Dr. João cirurgião mãos de alicate, como carinhosamente lhe chama, para o convidar para um café e um dedo de conversa. “Vou-lhe perguntar o que tenho de fazer para ser político”, foi pensando enquanto se dirigiam para o fim do corredor onde se encontra a máquina de café, muito solicitada uma vez que o bar fica no piso -1. O Dr. lá lhe foi explicando, querendo sempre saber mais detalhes da sua intenção, pois nunca lhe ouviu tamanha façanha, mas obteve como resposta apenas um silencioso sorriso.

Passados os 15 minutos consentidos por si para descontrair e conviver, voltou às suas etiquetas e com rasgos mentais bem iluminados foi reflectindo sobre o seu futuro: “Gosto de aqui estar, o ordenado é pouquinho, é verdade... não é por isso que quero mudar mas sim porque acho que tenho vocação, sempre o quis e se os outros conseguem eu também consigo! Se analisar bem as coisas, desde os cinco anos que faço intervenções políticas, embora tenham sido apenas na minha rua. Aos seis na APPC continuei... e não é que tinha quorum: os médicos, os terapeutas, os auxiliares, os pais e os meus colegas deficientes. Aos oito na Escola Primária de Celas apesar de alguns cépticos, também consegui conquistá-los. E no José Falcão? Fui braço direito do Presidente da Associação de Estudantes... oh já lá vão uns anitos! E pá, se os meus amigos deficientes e não-deficientes não me apoiarem? É que no futuro também precisarei dos seus votos! Mas agora tenho de salvaguardar o meu lugar aqui, pois ainda não estou no quadro. Embora hoje não seja garantia de nada e com o desemprego que graça em pessoas na minha condição... não sei não!”.


Se quiserem terminem esta estória.

Digo-vos que este homem tem um milhão de nomes em Portugal.

Tem limitações físicas, mentais, sensoriais, auditivas e visuais, no entanto age e pensa sem as incapacidades e handicaps que os considerados “normais” por vezes têm.

Enfrenta diariamente a discriminação, o preconceito e os estereótipos que conduzem à desvalorização da sua Pessoa e Cidadania.

QUER:

- Os mesmos direitos e aspirações que os não-deficientes;
- Acesso à educação e formação bem como a resolução de problemas nas escolas de ensino especial e regular, contemplando as suas necessidades específicas;
- A possibilidade de sair de casa e de se movimentar na via pública;
- Ver descer a desvantagem em relação ao acesso ou manutenção do seu emprego;
- Adaptação dos postos de trabalho, remunerações e lugares justo de acordo com as suas competências;
- Intervir na formulação das políticas e programas que directamente o afectam;
- Transportes adaptados e acessíveis à sua condição;
- Ver as barreiras arquitectónicas à sua locomoção destruídas;
- O acesso à informação e comunicação para deficientes visuais e auditivos;
- Ver baixar o nº de violência física, sexual e psicológica junto dos seus pares;
- Ver encorajamento á sua descoberta sexual;
- Ver centros de Saúde com acessos, que combatam as sua dificuldades de orientação e locomoção;
- Centros de Reabilitação com condições mínimas quer técnicas quer humanas;
- Ver muitos medicamentos que não se enquadram no lote de produtos medicamentosos beneficiarem de comparticipação.

Quer e espera que a esta “crise silenciosa” que o afecta bem como à sua família seja invertida. Considera que pode contribuir para o desenvolvimento económico e social da sua comunidade. Adianta que é muito mais oneroso para a sociedade, do ponto de vista moral e económico, manter inúmeros cidadãos dependentes e isolados. Sente e acredita que é uma força produtiva e participativa tal como os não-deficientes!

Comentários

Anónimo disse…
Esta cidade

Quer eu queira quer não queira
Esta cidade
Há-de ser uma fronteira
E a verdade
Cada vez menos
Cada vez menos
Verdadeira

Quer eu queira
Quer não queira
No meio desta liberdade
Filhos da puta
Sem razão
E sem sentido
No meio da rua
Nua crua e bruta
Eu luto sempre do outro lado da luta

A polícia já tem o meu nome
Minha foto está no ficheiro
Porque eu não me rendo
porque eu não me vendo
Nem por ideais
Nem por dinheiro
E como eu sou e quero ser sempre assim
Um rio que corre sem princípio nem fim
O poder podre dos homens normais
Está a tentar dar cabo de mim
Cabo de mim


letra: João Gentil
música: Xutos & Pontapés
Anónimo disse…
Câmara de Góis- 09/06/2005 - 10h
Exclusão de vereadora fará de Cabeças candidato
R.ª

A próxima reunião da Comissão Política Concelhia de Góis do PS, convocada para segunda-feira, será decisiva no que toca à eventual candidatura de José Cabeças à presidência da Câmara local, como independente.

Preterido pelas estruturas distrital e nacional do seu partido, o médico – antigo líder do município goiense e da Administração Regional de Saúde do Centro – deverá recandidatar-se ao cargo autárquico caso a lista do actual presidente, Girão Vitorino, exclua a vereadora Lurdes Castanheira de um lugar elegível.
A edil, que declinou um convite do PSD, está na iminência de, pelo menos, descer um degrau, baixando para o quarto lugar da lista do PS com a eventual entrada do presidente da Junta de Alvares, Manuel Antão, para a terceira posição.
Lurdes Castanheira tem dito que reconhece a Girão Vitorino o direito de constituir o seu elenco, mas pressente-se nas suas palavras que se inclina para a hipótese de vir a ser preterida.
A situação da vereadora e a insistência do Movimento cívico “Cidadãos por Góis” no sentido de José Cabeças se candidatar à presidência da Câmara dão lastro a uma reunião da Comissão Política Concelhia do PS, a que o médico preside, aguardada com expectativa.
A decisão tomada superiormente pelo Partido Socialista aponta para a recandidatura de Cabeças à Assembleia Municipal. O assunto foi objecto de discussão no início de 2004, na sequência de divergências entre os líderes da Assembleia e da Câmara sobre a adesão de Góis à Área Metropolitana de Coimbra, altura em que o médico perdeu o «braço-de-ferro» pela inclusão do município na Comunidade intermunicipal do Pinhal.
Embora se tenha comprometido a recandidatar-se à AM, José Cabeças alega que ficaram por cumprir vários pontos de um acordo celebrado com Girão Vitorino.

Campeão das provincias
http://www.campeaoprovincias.com/noticias.asp?id=3156
Anónimo disse…
ESTE BLOG PERDEU A PICA.
BUT PARA WWW.POLITAEHOUSE.BLOGSPOT.COM
Anónimo disse…
Esta cidade

Quer eu queira quer não queira
Esta cidade
Há-de ser uma fronteira
E a verdade
Cada vez menos
Cada vez menos
Verdadeira

Quer eu queira
Quer não queira
No meio desta liberdade
Filhos da puta
Sem razão
E sem sentido
No meio da rua
Nua crua e bruta
Eu luto sempre do outro lado da luta

A polícia já tem o meu nome
Minha foto está no ficheiro
Porque eu não me rendo
porque eu não me vendo
Nem por ideais
Nem por dinheiro
E como eu sou e quero ser sempre assim
Um rio que corre sem princípio nem fim
O poder podre dos homens normais
Está a tentar dar cabo de mim
Cabo de mim


letra: João Gentil
música: Xutos & Pontapés
Anónimo disse…
Ó Cidade!
Anónimo disse…
Noémia,
Sempre a voz dos excluídos. Continue assim. Essa estória tem sempre um final triste.
Anónimo disse…
«Embora hoje não seja garantia de nada e com o desemprego que *graça* em pessoas na minha condição... não sei não!».

Essa ortografia é um desastre!

... o desemprego que grassa...,

Tem razão. O desemprego grassa, mesmo para quem sabe escrever.
Anónimo disse…
Quem sabe escrever e bem, como ela! Com conteúdo, significado e pensamento social! Sempre atenta com os mais desfavorecidos.
Se não é a pontuação é a graça!
Se não se é preso por ter cão esse preso por não ter. Haja Deus para tanto engraçado!! Vamos embora Drª deixe-os falar!
Anónimo disse…
quem devia ser condecorado era o POVO...pelos sacrificios que tem feito.
...mas como as condecorações estão de tal maneira desinflacionadas...que por coisa nenhuma lá se leva uma.....
Mano 69 disse…
No tempo da Monarquia diziam “foge cão que te fazem barão” e agora é o que se vê…
Anónimo disse…
Cara Noémia
Hoje o que interessa não é mudar mentalidades, o que tem REALMENTE importância.
O que interessa ás pessoas é a mesquinhez e as coisas pequenas.
OS assuntos sociais ficam na prateleira!

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