Associação Ateísta Portuguesa - Exposição ao Provedor de Justiça
Exmo. Senhor
Provedor de Justiça
Juiz-Conselheiro
Alfredo José de Sousa
Senhor Provedor de
Justiça
A Associação Ateísta
Portuguesa (AAP), inconformada com as injustiças cometida pelas dioceses, na
nomeação de professores de Religião católica nas escolas, e entendendo que são
imorais e lesivas do interesse de outros professores, para além de achar
injusta a promoção de uma religião particular, vem junto de V. Ex.ª solicitar o
alto patrocínio da Provedoria de Justiça para pôr cobro a tão lamentáveis
práticas, com a exposição dos factos de que tem conhecimento.
RELIGIÃO CATÓLICA NAS ESCOLAS
De acordo com o Artigo 19 da Concordata subscrita pelo Estado Português, a
República Portuguesa “garante as condições necessárias para assegurar, nos
ternos do direito português, o ensino da religião e moral católicas nos
estabelecimentos de ensino público não superior, sem qualquer forma de
discriminação”.
E acrescenta: “Em nenhum caso o ensino da religião e moral católicas pode
ser ministrado por quem não seja considerado idóneo pela autoridade
eclesiástica competente, a qual certifica a referida idoneidade nos termos
previstos pelo direito português e pelo direito canónico”.
Mais ainda: “Os professores de religião e moral católicas são nomeados ou
contratados, transferidos e excluídos do exercício da docência da disciplina
pelo Estado de acordo com a autoridade eclesiástica competente”.
Até 1989, o procedimento baseava-se na indicação, por parte do bispo, de
quem iria lecionar a área em cada escola. Aliás, o mesmo acontece ainda hoje no
ensino particular e cooperativo com contrato de associação, o qual tem uma
especificidade curiosa que abordaremos a seguir.
Em 1989, o decreto-lei nº 407/89 veio criar nas escolas dos 2.° e 3.°
ciclos do ensino básico e nas escolas do ensino secundário lugares do quadro
para professores da disciplina de Educação Moral e Religiosa Católica,
alterando a prática de indicação anterior. Estes docentes passam a fazer parte do corpo docente dos
estabelecimentos de ensino em que prestam serviço, “gozando dos direitos e
deveres inerentes à função docente”.
Podem ser opositores a esse concurso os professores “com habilitação
própria para a disciplina de Educação Moral e Religiosa Católica, desde que
sejam portadores de uma habilitação pedagógica complementar para o exercício de
funções docentes desta área fornecida pela Igreja Católica e de sua inteira
responsabilidade”. Esta habilitação pedagógica é conferida pela Universidade
Católica.
Como acima se referiu, e com as alterações que são justificadas pela
especificidade do ensino privado, estes procedimentos aplicam-se também ao
ensino particular e cooperativo com contrato de associação, com a
particularidade, neste caso, dos indicados pelas dioceses passarem a integrar
obrigatoriamente os quadros desses estabelecimentos, ao abrigo da legislação
laboral existente em Portugal.
Aqui deve falar-se apenas em pessoas “indicadas” porque, de facto, não há
concurso público similar ao que ocorre no ensino oficial. Normalmente em Julho
de cada ano, a diocese questiona as escolas privadas sobre o número de aulas
previstas e indica então a pessoa da sua confiança.
O curioso desta situação é o seguinte: um professor nomeado pelo bispo para
dar aulas de EMRC pode perder a confiança das autoridades eclesiásticas. Neste
caso a entidade patronal do colégio ou instituto viu-o entrar nos seus quadros
de pessoal e ou lhe dá aulas de outra disciplina que possa lecionar ou inicia
um processo de despedimento de uma pessoa para cuja contratação em nada
contribuiu.
Tranquilamente, a igreja católica nomeia um novo professor, que substituirá
o primeiro, sem que daí lhe advenha nenhum especial constrangimento.
Acresce que os professores de EMRC, graças à contagem do tempo de serviço,
quando têm habilitações para outras disciplinas, mas não têm vaga, acabam,
através do tempo contado como professores de EMRC, por ultrapassar os seus
colegas para a colocação nas disciplinas para que têm habilitações.
Por parecer à Associação Ateísta Portuguesa (AAP) uma iniquidade a situação
exposta, pedimos a V. Ex.ª o apoio para a reparação de uma injustiça que, a
nosso ver, beneficia em exclusivo uma religião particular, fere a laicidade do
estado e acaba por prejudicar professores mais qualificados que se veem
ultrapassados por que foi discricionariamente colocado pelos bispos como
professores de EMRC.
Apresentando-lhe os nossos cumprimentos, esperamos o fim da injustiça
referida.
Comentários
Uma coisa é defender-se a justiça, outra é ser-se contra...
Haja honestidade!!!