Peregrinações eleitorais e eleições piedosas – votos e terços

O presidente da Junta de Freguesia de Grijó organiza a peregrinação a Fátima com 800 idosos, bem comidos, viajados, confessados e comungados e o presidente da câmara de Esposende aluga 32 autocarros para peregrinar 2 mil idosos, também a Fátima, e, com 5 mil euros, a juntar aos 32.500 € da deslocação, dá-lhes a ferramenta que alimentará os seus últimos dias – 1 terço a cada idoso –, para não esquecerem os cuidados da alma e os votos que no dia das eleições irão depor na urna.

A fé viaja com indulgências autárquicas por estradas de Portugal com destino a Fátima. Os pios edis, em vez de ficarem com 1 terço de cada adjudicação, doam um terço a cada idoso que peregrina. O Governo anseia vê-los em defunção, na urna que lhes guardará os ossos, a fim de aliviar a pressão sobre a Segurança Social, mas os autarcas preparam-nos para a urna onde deporão o voto. Entre os votos pios que os autarcas estimulam e os votos partidários que solicitam, é sempre no setor terciário que se movem.

O terço, não a fração nos negócios, o artefacto com que se rezam novenas e se passam os dias a cuidar da alma, são uma imaginativa prenda que só almas sensíveis ao pedido da Irmã Lúcia, são capazes de imaginar. E é tanta a devoção, que nem se lembram de os pagar do seu bolso, renetem a fatura para as despesas da autarquia.

Na idade em que as hormonas se aquietam e os pecados estão ausentes, não há melhor remédio para as tendinites do que dedilhar as contas do rosário e, com padres-nossos e ave-marias, cuidar do caminho do Paraíso. O terço, não a fração dos lucros em negócios autárquicos, o verdadeiro terço, aquele que a Irmã Lúcia recomendou a rogo da senhora mais brilhante do que o sol, é o poderoso demonífugo que os pios autarcas entregam nas mãos devotas que não esquecerão a prenda no dia das eleições.

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