Eleições, abstenções e leituras eleitorais
Há quem procure deslegitimar os atos eleitorais denegrindo os resultados e o mérito dos eleitos com base nas abstenções, apoucando o valor do sufrágio e corroendo os valores democráticos.
O voto, não sendo obrigatório, é um dever, e o civismo
mostra-se no seu cumprimento. Quem não vota não conta, e perde o direito moral
de contestar os resultados. Portugal é uma democracia recente onde, mesmo em
clima de pandemia, as restrições de liberdade exigem o escrutínio parlamentar
pluripartidário.
As democracias não se avaliam pela percentagem de votantes,
mas na prática de valores que as definem. O respeito pelas leis, a igualdade de
tratamento para todos os cidadãos, a proteção das minorias e o respeito pelos
adversários são exigências democráticas cujo modelo existe nos Estados de direito
democrático.
Que as democracias são frágeis, ao contrário das ditaduras,
vê-se pela facilidade com que os ditadores se servem da liberdade para subverterem
e confiscarem o poder. Ficará na memória o assustador exemplo de Trump. As eleições
democráticas só não garantem o espírito democrático dos eleitos.
Mas vejamos as últimas eleições portuguesas. A enorme
quantidade de emigrantes, que normalmente não votam, as pessoas confinadas, e os
mortos que costumam permanecer nos cadernos eleitorais, porque o número
influencia as remunerações dos autarcas, já justificavam uma elevada abstenção.
A garantia da reeleição do PR, que aconteceu com todos os antecessores, e a popularidade
de Marcelo retiraram o interesse competitivo.
Mesmo assim,
No dia de eleições, em clima de medo pandémico, com as TVs a
anunciarem máximos de infetados e mortos, com as previsões a colocarem nos 30%
o número de votantes, com chuvas intensas em alguns períodos do dia, quase 40%
de eleitores, em relação aos números registados nos cadernos eleitorais, foi boa
participação. Mas, fosse qual fosse o número dos abstencionistas, não são estes
que decidem, são os que votam.
A desvalorização das eleições, com base nas abstenções, é intolerável,
o que não impede o dever de incentivar a participação eleitoral e de incrementar
a votação eletrónica.
Ponte Europa / Sorumbático
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