"OPREÇO DE ESCREVER SEM MEDO"
Por Onofre Varela
Copiei o título desta crónica de uma notícia do jornal espanhol “El País” (15/08/2022) que o usou para noticiar a tentativa de homicídio do escritor Salman Rushdie.
O ataque à faca de que o autor foi vítima constituiu um lembrete das ameaças de que são alvo vários autores de todo o mundo. No último ano aconteceram mais de 200 casos de intimidação a escritores, jornalistas e desenhadores perseguidos, sofrendo ameaças e detenções (em estabelecimentos prisionais ou nos seus domicílios) por terem usado da liberdade de expressão. Nestas duas centenas de vítimas não figuram os autores assassinados ou desaparecidos.
Da lista fazem parte jornalistas e escritores Bielorrussos, Libaneses, Ruandeses, Nicaraguenses, Turcos e Egípcios, entre outros. O caso do apunhalamento de Salman Rushdie, autor indiano condenado à morte pela autoridade islâmica por ter escrito o livro “Versículos Satânicos”, esteve esquecido durante cerca de 30 anos, até que um fanático perpetrou a tentativa de homicídio em Nova Iorque, no dia 12 de Agosto de 2022, quando se preparava para dar uma palestra.
Também grupos terroristas independentes de governos islâmicos atentam contra a vida de jornalistas, como acontece no México e no Brasil, e aconteceu em Espanha com a ETA ameaçando intelectuais e também jornalistas, como o filósofo Fernando Savater.
Salman Rushdie, na sua obra (que é um romance e não um ensaio nem uma narrativa histórica) fabulou sobre a vida de Maomé e o contacto que o fundador do Islão disse ter tido com o arcanjo Gabriel. O Ayatollah Khomeini, descontente com o conteúdo do livro, proclamou a condenação do autor, prometendo três milhões de dólares a quem lhe tirasse a vida.
Ao mesmo tempo ordenou a queima de livros do autor nas ruas de Londres, e ataques a livrarias na Índia (país de origem de Salman Rushdie), Paquistão, Egipto e África do Sul. O tradutor do livro para japonês, Hitoshi Igarashi, foi assassinado à facada na universidade onde leccionava em Tóquio. O tradutor para italiano e o editor do livro em língua Norueguesa, também foram atacados em 1993.
Em Portugal José Saramago não foi assassinado, nem sobre si foi proclamada uma Fatwa (ordem islâmica de assassinato) só porque tal proclamação eliminatória não faz parte da nossa cultura… mas figurativamente foi condenado por um tal cidadão de nome Lara que, em 1992 (ao serviço do PPD ocupava o lugar de secretário de Estado da Cultura do Governo de Cavaco Silva) boicotou a candidatura do romance “Evangelho Segundo Jesus Cristo” ao Prémio Europeu de Literatura Aristeion (criado pela Comissão Europeia em 1990).
Em consequência, Saramago abandonou Portugal e foi viver para a ilha espanhola de Lazarote. Cavaco Silva, em 2016, condecorou o tal Lara com a Ordem do Infante D. Henrique por ter “prestado serviços relevantes a Portugal, no país e no estrangeiro (?!)”. Mais tarde, este ex-secretário de Estado do governo Cavaco, foi porta-voz do Chega. Já José Saramago foi muito mais longe: mereceu o Prémio Camões em 1995 e o Prémio Nobel de Literatura em 1998.
(O autor não obedece ao último Acordo Ortográfico)
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