O Sudário e o corpo nele embrulhado

Por Onofre Varela

Provavelmente Lisboa irá receber uma exposição itinerante sobre o “Santo Sudário” e o corpo de Jesus Cristo que, hipoteticamente, o lençol mistificado teria embrulhado. 

Presumo que a mostra estará incluída nas atracções que farão parte do “programa de festas” de Lisboa em 2023, quando o papa Francisco I cá estiver fazendo parte do número de peregrinos que darão corpo à Jornada Mundial da Juventude, que será a “Festa do Avante” da Igreja Católica. 

A notícia deste evento, que foi divulgada pelo Jornal de Notícias (JN) na sua edição do dia 23/10/2022, começa muito mal ao usar o título “Ciência ajuda a recriar homem do Santo Sudário morto há dois mil anos”. 

E começa mal porque a jornalista redactora do texto não teve em linha de conta uma outra notícia que o JN publicou em 30/09/1988, segundo a qual o exame pelo método Carbono-14 a que o Sudário foi sujeito em 1986, garante que aquele lençol foi feito entre os séculos XIII e XIV… portanto não poderia ter embrulhado o corpo de Jesus Cristo falecido cerca de 1300 anos antes de o lençol ser tecido! 

O responsável da mostra pretende oferecer uma imagem tridimensional de um corpo que, segundo as suas palavras, “toda a comunidade científica e médica concorda que, neste pano, esteve envolto um homem torturado, com 250 marcas de flagelação em todo o corpo, hematomas e um corte de uma lança que lhe perfurou o pulmão”. 

Este discurso configura uma mentira de todo o tamanho! Nas manchas do sudário não é possível observar-se tanta coisa ao mesmo tempo nem nos é permitido garantir as 250 feridas e hematomas, nem a profundidade do golpe de uma lança no peito, e muito menos afirmar a perfuração de um pulmão… e ainda que aquele homem estava circuncidado, como na notícia se diz!…

Para além do mais a Ciência já provou que nas manchas do Sudário de Turim pode haver tudo… talvez óxido de ferro… mas não há sangue!… É o que afirmam os resultados de uma investigação de hematologia realizada ao sudário em 1978, divulgada pelo mesmo JN no dia 11/04/1978. 

A exposição tem um nome inglês, como é moda: The Mystery Man. O misterioso homem é uma escultura em latex que Álvaro Blanco, o comissário da exposição, é peremptório em afirmar na sua fé: “Eu não tenho dúvida de que estamos perante o corpo de Jesus Cristo”. 

Esta sua certeza contraria todos os estudos sérios já realizados ao Sudário e que eu divulgo no livro “O Homem Criou Deus” (Edium Editores, Dezembro de 2011 [esgotado]). E afirma mais… “que os pés e as mãos possuem vestígios de terra, tal como foi possível perceber pelos exames ao sudário”… o que também é mentira. 

Embora Blanco diga que aquele boneco não pretende ser realista, desde logo porque quem o fez não é artista, o bispo de Salamanca, José Luís Retana, terá dito: “cada detalhe, o tom de pele, os pelos dos braços… é impressionante, e convido todos para que possam vir contemplar”. 

Obviamente que a entrada para a exposição será paga… e os promotores esperam arrecadar boa receita. 

Milagres da fé! 

(O autor não obedece ao último Acordo Ortográfico) 


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