Momento de poesia


Estela é nome de mulher…

Estela é nome de mulher. Aqui, no entanto,
é o nome de três mulheres, uma real,
de corpo de haste fina, que balouça com o vento,
tímida, atraente, rosto ovalado e olhos negros,
e que põe à roda a cabeça de Eustácio,
comerciante remediado da rua do Comércio,
que melhor nome para uma rua do que aquela
onde se estabeleceu, vai para 20 anos, antes
de lhe ter crescido aquela enorme barriga,
que lhe desequilibra o andar e lhe desfeia a figura.
A outra Estela, é aquela que surge dos rascunhos
de Marco Vigo, pseudónimo de Alberto Fernandes,
um jovem talento literário a despontar para a
celebridade, soterrado naquele quarto dos fundos,
alugado ao Eustácio, e que recebe do labiríntico
saguão a luz coada do dia
e a humidade que se lhe entranha nos ossos,
mas que lhe rasga o horizonte da esperança
 e alvoroça o sangue e a inspiração
quando Estela não fecha as portadas da janela
do seu quarto e se deleita sobre a cama
a acariciar o corpo, ou quando se mira alegremente
no espelho do guarda fatos, dançando e cantarolando
o último êxito musical, corrido na rádio.
Talvez a terceira Estela seja a mais difícil de descrever.
É aquela que Eustácio e Marco Vigo não conseguem ver,
toldados que estão, um, por uma paixão viscosa
não correspondida, e que lhe atormenta a alma,
o outro, pela etérea alucinação do seu espaço
literário, que lhe consome resmas de papel
e noites de vigília criadora.
E esta Estela, a verdadeira, apenas tem um único desejo,
o de alugar um quarto, sem vistas para um saguão.

Alexandre de Castro

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