Tomás da Fonseca – Missionário do Povo
Na passagem do 140.º aniversário do nascimento (10-03-1877) homenagear o escritor, pedagogo, ateu, maçon e combativo democrata, é um dever cívico. O mais anticlerical dos escritores portugueses combateu o obscurantismo religioso e as ditaduras, da de Sidónio Pais à de Salazar.
Ao designá-lo ‘missionário do povo’, retirei o título da notável biografia do investigador Luís Filipe Torgal, “Tomás da Fonseca Missionário do Povo”, obra indispensável para o conhecimento do militante cívico, perseguido e preso pela ditadura, arauto da laicidade e denodado lutador contra os embustes do jurássico catolicismo luso.
Deixo ao referido historiador a biografia. Reservo-me um depoimento de leitor precoce do escritor a quem Guerra Junqueiro disse um dia: «Ó Tomás, um padre com a barriga cheia, tanto lhe dá que as pessoas da trindade sejam três como trezentas».
Teria 13 anos quando, depois de ler dois livros seus, lhe escrevi a pedir um outro, que me enviou. Devo ter escrito que era o n.º 5 (?) da turma D, do 3.º ano do Liceu Nacional da Guarda e que gostava de o ler. Troquei ainda várias cartas e enviou-me alguns livros, tudo desaparecido, até me enviar um folheto que referia os títulos, preços e quantidades que a Pide lhe apreendera, num total de 19 mil e tal escudos e alguns centavos. A troca epistolar terminou com um postal, que me dizia escrito por um neto, por já se encontrar muito doente.
Depois, em 1960, li «Na Cova dos Leões», emprestado pelo ten. Pedro Joaquim, oficial na I Grande Guerra, perseguido do regime, e amigo de meu pai. E continuei seu leitor.
Aprendi com ele a troçar dos milagres. Guardo na memória a história de S. Guinefort, cão e mártir, injustamente morto pelo dono, e que virou santo, até que um papa mandou arrasar o templo em sua honra; a de duas mulas, mortas de exaustão, que a má tradução do grego transformou em mártires; a de St. ª Verónica que, depois de conhecido o significado (verdadeira imagem), foi apeada. E a Igreja a perder a santa e a ganhar três toalhas, relíquias pias que embrulharam o corpo de Cristo!
Revelou o logro de Fátima, visões de uma criança analfabeta que ouvia e via o que uma imagem feminina lhe transmitia a saltitar numa azinheira, visão oficial da mãe de Jesus que, de vez em quando, se deslocava ao espaço da catolicidade.
Os primos, com menos acuidade visual e auditiva, faleceram crianças, e Lúcia, depois de cativa das Doroteias em 17 de junho de 1921, por ordem do bispo de Leiria, não mais foi livre, tornando-se a mais antiga prisioneira do mundo, quando morreu com odor a santidade, em 13 de fevereiro de 2005, aos 97 anos. Encarcerada durante quase 83 anos, pôde, em vida, ver o Inferno, o Anjo de Portugal e Jesus Cristo, e reescrever os pedidos da Sr.ª de Fátima que, por não ler jornais, a enganou a anunciar o fim da guerra.
Tomás da Fonseca, com sólida preparação em Teologia, a única ciência sem objeto nem método, zurziu o clero, lutou contra a superstição e a ignorância, defendeu a laicidade e combateu a ditadura clerical-fascista. Foi uma referência cívica contra a transformação dos portugueses em bandos de beatos e idiotas fabricados nas sacristias romanas.
Não impediu que alegadas visões volvessem aparições, que terrenos rústicos, adquiridos pela Igreja, passassem do setor primário ao terciário, e que uma encenação pia, nascida contra a República, se transformasse primeiro na luta contra o comunismo e, depois da implosão deste, na luta contra o ateísmo.
Do poeta, escritor, jornalista, professor e militante republicano, ateu e maçon, termino com uma citação do livre-pensador, em “Sermões da Montanha”:
«…o protestantismo é a religião católica reformada. Não quer isso dizer que seja boa, porque não pode haver religiões boas. Dizer-se que uma religião é boa, equivale a proclamar os benefícios do cancro, as vantagens da varíola ou os confortos da sífilis.»
Ao designá-lo ‘missionário do povo’, retirei o título da notável biografia do investigador Luís Filipe Torgal, “Tomás da Fonseca Missionário do Povo”, obra indispensável para o conhecimento do militante cívico, perseguido e preso pela ditadura, arauto da laicidade e denodado lutador contra os embustes do jurássico catolicismo luso.
Deixo ao referido historiador a biografia. Reservo-me um depoimento de leitor precoce do escritor a quem Guerra Junqueiro disse um dia: «Ó Tomás, um padre com a barriga cheia, tanto lhe dá que as pessoas da trindade sejam três como trezentas».
Teria 13 anos quando, depois de ler dois livros seus, lhe escrevi a pedir um outro, que me enviou. Devo ter escrito que era o n.º 5 (?) da turma D, do 3.º ano do Liceu Nacional da Guarda e que gostava de o ler. Troquei ainda várias cartas e enviou-me alguns livros, tudo desaparecido, até me enviar um folheto que referia os títulos, preços e quantidades que a Pide lhe apreendera, num total de 19 mil e tal escudos e alguns centavos. A troca epistolar terminou com um postal, que me dizia escrito por um neto, por já se encontrar muito doente.
Depois, em 1960, li «Na Cova dos Leões», emprestado pelo ten. Pedro Joaquim, oficial na I Grande Guerra, perseguido do regime, e amigo de meu pai. E continuei seu leitor.
Aprendi com ele a troçar dos milagres. Guardo na memória a história de S. Guinefort, cão e mártir, injustamente morto pelo dono, e que virou santo, até que um papa mandou arrasar o templo em sua honra; a de duas mulas, mortas de exaustão, que a má tradução do grego transformou em mártires; a de St. ª Verónica que, depois de conhecido o significado (verdadeira imagem), foi apeada. E a Igreja a perder a santa e a ganhar três toalhas, relíquias pias que embrulharam o corpo de Cristo!
Revelou o logro de Fátima, visões de uma criança analfabeta que ouvia e via o que uma imagem feminina lhe transmitia a saltitar numa azinheira, visão oficial da mãe de Jesus que, de vez em quando, se deslocava ao espaço da catolicidade.
Os primos, com menos acuidade visual e auditiva, faleceram crianças, e Lúcia, depois de cativa das Doroteias em 17 de junho de 1921, por ordem do bispo de Leiria, não mais foi livre, tornando-se a mais antiga prisioneira do mundo, quando morreu com odor a santidade, em 13 de fevereiro de 2005, aos 97 anos. Encarcerada durante quase 83 anos, pôde, em vida, ver o Inferno, o Anjo de Portugal e Jesus Cristo, e reescrever os pedidos da Sr.ª de Fátima que, por não ler jornais, a enganou a anunciar o fim da guerra.
Tomás da Fonseca, com sólida preparação em Teologia, a única ciência sem objeto nem método, zurziu o clero, lutou contra a superstição e a ignorância, defendeu a laicidade e combateu a ditadura clerical-fascista. Foi uma referência cívica contra a transformação dos portugueses em bandos de beatos e idiotas fabricados nas sacristias romanas.
Não impediu que alegadas visões volvessem aparições, que terrenos rústicos, adquiridos pela Igreja, passassem do setor primário ao terciário, e que uma encenação pia, nascida contra a República, se transformasse primeiro na luta contra o comunismo e, depois da implosão deste, na luta contra o ateísmo.
Do poeta, escritor, jornalista, professor e militante republicano, ateu e maçon, termino com uma citação do livre-pensador, em “Sermões da Montanha”:
«…o protestantismo é a religião católica reformada. Não quer isso dizer que seja boa, porque não pode haver religiões boas. Dizer-se que uma religião é boa, equivale a proclamar os benefícios do cancro, as vantagens da varíola ou os confortos da sífilis.»
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