A União Europeia, a Grécia e o que adiante se verá
Enquanto a Europa se debate em contradições internas, entre
uma Europa cada vez mais alemã e a Alemanha progressivamente euro-evasiva, a
fome, vinda através do Magreb, afoga-se no Mediterrâneo ou, se sobrevive, entra
por Lampedusa, Chipre ou pelas ilhas gregas onde se perde o rasto de origem dos
esfomeados.
A UE lambe feridas na Ucrânia, onde o entusiasmo mal pensado
mantém um conflito de interesses entre os EUA e a Europa, com uma guerra no
horizonte. Gorbatchov avisou a Europa das injustiças contra a Rússia, com a
obsessão da Nato a querer cercá-la. Dentro de fronteiras, as mesquitas e
madraças são uma ameaça constante à paz e à liberdade.
É neste caldo de cultura, onde se joga a paz e a democracia,
que a luta ideológica toma o lugar do pragmatismo no diferendo interno que opõe
a Grécia aos credores que desejam vacinar os povos contra a esperança, perante
um Golias que deseja salvar da fome o seu povo enquanto os governos de Portugal
e Espanha têm sido a escória dos falcões.
A luta do Governo grego é uma gesta heroica de quem não
renuncia à luta, sabendo que a vitória é difícil e mitigada. Tem contra ele a
rede de interesses partidários e a sede de vingança dos que, fazendo chantagem
sobre os eleitores gregos, se viram vencido nas urnas. A vitória da coragem,
inteligência e patriotismo esbarra no medo do contágio do eleitorado dos países
que se renderam e deixaram humilhar.
A Europa devia ser uma federação de países e não um mosaico
de interesses nacionais, uma união civilizacional e não a arena onde se
digladiam interesses nacionalistas a que nem o internacionalismo capitalista –
o único que subsiste –, parece conseguir opor-se.
Penso que a Grécia merece a solidariedade de todos e uma
contenção na luta ideológica dos que, de um lado e doutro, pretendem tirar
dividendos do sacrifício de um povo e dos patriotas que têm nas mãos a
responsabilidade de o defender. Paradoxalmente, Merkel e Hollande deram-se
conta do perigo europeu de humilharem a Grécia enquanto Rajoy e Maria Luís foram
os rostos da desonra e da degradação política.
A vingança dos fracos é a catarse da impotência e da
vergonha quando o futuro é cada vez mais imprevisível e o presente já não é o
que julgávamos.
Comentários
Em vez de se dar rendimento social de inserção, ou subsídio de desemprego a muitos cidadãos que não têm emprego, deslocam-se unidades de produção de zonas em que estão a mais para zonas onde estão em falta. Autoeuropas.
Em vez disso, o que os gestores da União fizeram, foi dar subsídios às indústrias dos países do Norte sob a forma de doação dos “fundos (perdidos) de coesão” aos países do sul. Ao responderem a esse apelo, os países do sul endividaram-se, ou seja, a indústria dos países do norte obteve negócios que nunca teria tido se os países do sul tivessem resistido à tentação de se endividar. Os países do Norte ficaram com a prosperidade, os do sul ficaram com as dívidas, e também com boas infraestruturas é certo, que nunca teriam tido se não se tivessem endividado. Resta-nos esperar que essas boas infraestruturas venham a servir uma futura política de distribuição racional das indústrias europeias em todo o território europeu. Uma política de união.