No aniversário da morte de Pio 12

A garantida canonização de Pio 12

Mesmo com o atual Papa, de que a ICAR teve necessidade, como as nódoas de benzina, após dois pontificados a perder freguesia, os milagres perduram na indústria de produtos pios e no exercício ilegal da medicina por mortos de longa defunção.

Os santos continuam a nascer como cogumelos em noite de orvalho e Pio 12 parece ser dos que estão bem colocados no certame e nas intenções devotas.

Pio 12 não foi um celerado que arrancasse olhos aos sérvios, um carrasco que estivesse nos campos de concentração a assassinar judeus, um biltre que usasse as próprias mãos para despachar hereges a caminho do Inferno.

Pio 12 foi apenas um Papa católico, amigo da ordem e da paz, antissemita como os seus pios antecessores e anticomunista como os sucessores. Foi com muita mágoa – dizem os panegiristas de serviço –, que assistiu em silêncio ao extermínio dos judeus e, depois da guerra, para compensar, converteu conventos e seminários em refúgios nazis, enquanto o Vaticano emitia os respetivos passaportes para a América do sul.

Não se pode condenar Pio 12 pelo antissemitismo. É um dever que o Novo Testamento impõe, é o culto de uma tradição que alimentou as fogueiras do Santo Ofício e o preito de gratidão a todos os santos que acossaram judeus, moiros e hereges, e dilataram a fé.

Pio 12 apenas queria celebrar concordatas com os Estados fascistas, proteger as famílias cristãs dos malefícios do divórcio e assegurar às crianças o ensino obrigatório da sua fé. Haverá odor que mais praza a Deus do que o da combustão de hereges ou delícia maior do que a tortura de quem professe uma religião errada?

Pio 12 deve ser canonizado. Muitos bem-aventurados de duvidosa reputação o foram já. O que o prejudica é não ser incluído em grupos numerosos e, na singularidade papal, ter ainda quem recorde que o Vaticano foi um antro de colaboração com o fascismo a que deve o Estado em que se transformou.

Mas não aconteceu o mesmo com JP2, um papa que já fazia milagres em vida, apesar de só os mortos terem alvará no ramo?

Faz hoje 58 anos que faleceu o papa cuja infalibilidade definiu o dogma da Assunção de Maria em 1950. Foi ele que, no uso do dogma da sua infalibilidade, criou o da subida de Maria ao Céu, em corpo e alma, ainda que estas subidas e descidas sejam exclusivas das vias de comunicação celeste e do nunca editado mapa de estradas do reino da fé.

Este Papa, venerável desde 2007 e com uma estátua em Braga, é inábil a obrar milagres, mas não lhe faltam virtudes heroicas, algumas a necessitarem de esquecimento.

Canonize-se o defunto. Com tantos anos de defunção, há muito que não fede.

Comentários

e-pá! disse…
Independente das questões relativas às posições anti-semitas de Pio 12, não totalmente esclarecidas, exactamente porque o Vaticano não facilita o acesso aos seus arquivos há um facto que tem um insofismável significado e de que há registo: a concordata que o papa (então núncio em Berlim) negociou e assinou com o III Reich em 1933 (já com Hitler no poder) onde consta que os clérigos ficariam obrigados a um juramento de lealdade ao governador local ou ao presidente do Reich.
Até que ponto iria esse 'lealdade' é uma interrogação que persiste. E, bem vistas as coisas, o arcebispo Pacelli, era, na altura, em clérigo em Berlim. Terá jurado?

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