Carlos César: eleições à porta e inefáveis 'tiques politiqueiros'…
Carlos César, presidente o grupo parlamentar do PS, nas últimas jornadas parlamentares, resolveu desembestar uma série de impropérios sobre aquilo que foi a ‘geringonça’ ou sobre o seu utilitarismo sob a perspetiva partidária para alimentar o desejo escondido de uma maioria absoluta.
A dita ‘geringonça’ funcionou como um modelo de coligação serviu para agitar águas lá fora, cavalgando aquilo que foi considerado um modelo inovador e, cá dentro, o que é mais importante impediu a direita de governar – o que não é pouco.
Não gosto de repetir uma conceção muito explorada pela direita de que foi o PSD o vencedor das eleições de Outubro de 2015. Na verdade, esta asserção é abusiva porque existe uma diferença substancial entre um partido dito vencedor e aquilo que se verificou, isto é, o mais votado.
Ficaria bem ao deputado Carlos César quando constata que ‘ o Bloco não manda no parlamento nem no país’ link que tivesse a noção que essa constatação, dita de maneira acintosa, é extensível ao seu próprio partido que, como todos sabemos, não recebeu qualquer mandato popular para 'mandar' isoladamente.
A governação dos últimos 4 anos só foi possível porque se concertaram ‘posições conjuntas’ envolvendo toda a esquerda parlamentar. Ninguém isoladamente recebeu qualquer indigitação ‘mandante’ até porque essa posição incorpora um outro conceito um pouco obtuso em termos democráticos, isto é, implica subordinação. O Governo vale enquanto for capaz de tomar 'posições conjuntas'.
Será caricatural – e só vale enquanto evidencia o burlesco da situação – retomar um conceito que os mais velhos ainda devem recordar e que versa a velha questão do ‘mando’ ou, se quisermos, do autoritarismo. Trata-se da célebre frase salazarista que era repetida ad nauseum no Estado Novo transformando-se no ‘grito de guerra’ de uma sinistra organização (Legião Portuguesa) que rezava assim:
Legionários, quem vive?
Portugal! Portugal! Portugal!
Legionários, quem manda?
Salazar! Salazar! Salazar!
Portugal! Portugal! Portugal!
Legionários, quem manda?
Salazar! Salazar! Salazar!
Não julgo que as declarações de Carlos César se possam encaixar neste contexto (a questão não é essa) mas convinha ter uma visão menos caseira e menos facciosa - menos troglodita - sobre aquilo que Manoel de Oliveira titulou em filme como - “Non, ou a vã glória de mandar” onde, artisticamente (pelo voz do personagem alferes Cabrita), se evoca episódios da nossa memória histórica.
‘Mandar’ é (em política) uma áspera expressão, muito senhorial e, no contexto social, algo possessiva e diletante. ‘Mandar’ é o que se faz intramuros, isto é, na nossa casa onde nem todos os que se arvoram em ‘mandantes’ na realidade o conseguem fazer.
Como dizia António Aleixo: “Há tantos burros mandando em homens de inteligência que, às vezes, fico pensando que a burrice é uma ciência…”.
Uma outra jactância foi tecida nas mesmas jornadas à volta dos percalços da governação. Aí, Carlos César, solicitou uma ‘grande votação’ para mais uma vez contornar a aposta sub-reptícia na maioria absoluta. E novamente comete uma outra gaffe ao fazer o saldo dos 4 anos de geringonça (sem os nunca citar explicitamente) para salientar não a concertação da esquerda que permitiu o governo da legislatura, mas citar os bloqueios e a inércia link.
Nesta última tirada, também para aqueles que já andam a alguns anos a calcorrear os caminhos da política e cidadania, vem à memória uma boutade cavaquista que ficou bem conhecida: “Deixem-me trabalhar!”.
Cavaco considerou, então, os outros agrupamentos partidários (e o Tribunal de Contas) como ‘forças de bloqueio’. Carlos César, dá a volta ao texto e considera, outrossim, os parceiros de Esquerda como um estorvo (ninguém ficou a saber para que decisões políticas).
Finalmente, C. César evocou uma abrupta inércia que não adere à realidade já que, na última legislatura, o que a governação tem como denominador subjacente e visível são empenhadas e permanentes negociações que levaram, p. exº., à aprovação de 4 Orçamentos Gerais do Estado.
Inerte (ou talvez pior) ficou a nova Lei de Bases da Saúde mas essa é outra história que os rodeios de César acabam por evidenciar.
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