Sugestões para uma verdadeira política realista de esquerda em Portugal

Algumas sugestões pessoais para uma verdadeira política realista de esquerda em Portugal. Bastante simples no papel, mas dolorosas para os interesses instalados e difíceis de colocar em prática. O que me parece que devem ser as duas grandes prioridades em Portugal: (1) crescimento sustentável em convergência com a UE e (2) redução das desigualdades.

A política de EDUCAÇÃO é a verdadeira pedra de toque do futuro do país. E como já disse antes, a avaliação dos professores é porventura de importância menor em todo o puzzle. Os dois grandes desafios da escola pública prendem-se com o fraco rendimento dos alunos e com o abandono escolar. Ora se por um lado os graves problemas sociais de parte da sociedade se repercutem no rendimento escolar dos alunos e no abandono escolar, o laxismo generalizado dos sucessivos ministérios da educação muito têm contribuído para o actual status quo. Por um lado falta DISCIPLINA nas escolas. Não estou a falar na disciplina liceal autoritária como no Estado Novo, mas sim num valor essencial em qualquer sociedade democrática: respeitar as regras. Há uma indisciplina generalizada nas escolas que prejudica a aquisição de conhecimentos por parte dos alunos. Hoje em dia os professores praticamente não têm quaisquer mecanismos disciplinares à sua disposição. Por outro lado, falta um sentido de RESPONSABILIDADE por parte dos encarregados de educação no quadro da gestão democrática da escola. Muitos encarregados de educação, quando se interessam de todo, estão mais interessados em exercer pressão sobre a escola e os professores, muitas vezes através de chantagem descarada e recurso a tráfico de influências, de forma a que os seus educandos obtenham benefícios não merecidos. Poucos encarregados de educação se envolvem genuinamente nas actividades escolares, mais encarando a escola como um depósito das crianças. E finalmente falta EXIGÊNCIA relativamente aos objectivos que devem ser alcançados pelos educandos. A avaliação deve ser séria e exigente, só devendo transitar para o nível superior os alunos que tenham alcançado os objectivos. Mais ainda, deve haver uma consciência firme que nem todos os alunos conseguirão capitalizar as competências necessárias para prosseguir uma via liceal que lhes dê acesso à universidade, devendo logo no nono ano haver uma triagem entre as vias académicas e profissionalizantes. O que têm feito os sucessivos governos, incluindo os do PS na área da educação? Laxismo, burocratização do ensino, politização da administração da educação (as direcções regionais de educação são antros de boys), passagem quase administrativa de alunos para níveis superiores sem terem adquirido as competências necessárias, de forma a assim falsificar as estatísticas para a OCDE, etc.
Sem uma política eficiente de educação, o futuro do país está hipotecado.

A política ECONÓMICA e FINANCEIRA deverá ser alterada. o Estado deverá passar de "estado dono da obra" que alimenta uma rede de empreiteiros clientes fortemente imbricados nas estruturas político-partidárias para passar a ser um estado incubador de empresas. A carga fiscal deve ser distribuída de forma mais justa e equitativa. Os rendimentos capital não reinvestido devem ser fortemente tributados. O sistema fiscal deve ser simplificado e os benefícios fiscais racionalizados e restringidos. O Estado deverá apoiar preferencialmente as actividades económicas reprodutivas de alto valor acrescentado, nomeadamente na área da tecnologia.

A SEGURANÇA SOCIAL e a POLÍTICA de EMPREGO devem ser reestruturadas de forma eficiente e sustentável, procurando reduzir as desigualdades, introduzindo flexibilidade do factor trabalho, apoiando os trabalhadores nos períodos de desemprego e adaptação (flexisegurança). Aqui o governo PS parece andar bem, ainda que devagar. Havendo possibilidade, os salários deveriam subir.

Outro sector essencial é o da JUSTIÇA. Sucessivos governos demonstraram um quase total vácuo de ideias. Apesar de esforços recentes, nomeadamente os julgados de paz, os processos simplificados, etc. o sector continua em agonia profunda. Faltam juízes, os juízes que há trabalham de forma ineficiente. É necessário formar mais juízes, formar diferentes tipos de juízes (criação por exemplo de uma carreira de juízes não togados, com requisitos de acesso menos exigentes e menor tempo de formação), facilitar o acesso de juristas de mérito aos tribunais da relação e ao STJ (apesar de os magistrados de carreira entenderem a magistratura como a sua coutada privativa), introduzir carreiras de gestão de tribunais, de assessores de juiz, assim limitando a actividade do juiz a julgar, libertando-o da perda de tempo com assuntos administrativos e despachos de mero expediente. Para além disso várias reformas na área processual são necessárias. Há que mudar a mentalidade dos cidadãos de recorrer aos tribunais por bagatelas (os romanos tiveram há dois milénios essa clarividência: de minimis non curat praetor). Os tribunais estão entupidos com processos verdadeiramente irrelevantes, como crimes de injúria, litígios de vizinhança, pequenas dívidas, que facilmente poderiam ser resolvidos por juízes não togados ou através de resolução alternativa de litígios (arbitragem, mediação, conciliação) assim desentupindo os tribunais. As custas judiciais devem ser aumentadas e as alçadas substancialmente elevadas: não se compreende, por exemplo, que caiba recurso para a relação de um processo com o insignificante valor de 5001 Euros.

Outros assuntos haverá, mas essencial é ainda a MORALIZAÇÃO DOS APARELHOS POLÍTICO-PARTIDÁRIOS e o fim da PROMISCUIDADE ENTRE PARTIDO, ESTADO e GRANDE CAPITAL. O clientelismo instalado, a politização da administração pública e das empresas públicas, o trânsito de ex-governantes para cargos em empresas públicas e institutos públicos sem para tal terem quaisquer qualificações relevantes são verdadeiras gangrenas no Estado.

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