O "NOVO RUMO" DE MÁRIO SOARES
O Dr. Mário Soares, acompanhado por mais oito cidadãos e cidadãs mais ou menos ilustres, fez ontem publicar um manifesto em que defende um novo rumo para a União Europeia e apela a todos os cidadãos europeus de esquerda para que se mobilizem na defesa desse novo rumo.
Como cidadão de esquerda, socialista e europeísta, estou inteiramente de acordo com os ideais defendidos nesse manifesto.
Não posso no entanto deixar de lhe fazer alguns reparos.
1. Em primeiro lugar, nele se compara a luta dos europeus por esses ideais com a luta da "rua árabe". Parece-nos tal comparação duplamente infeliz. Por um lado, a "rua árabe" revoltou-se contra regimes ditatoriais. Ora na União Europeia não há ditaduras que seja necessário derrubar "na rua"; há governos resultantes de eleições livres e democráticas, que podem ser derrubados legal e democraticamente. Por outro lado, ainda hoje não sabemos, infelizmente, se dessas lutas da "rua árabe" resultarão regimes democráticos ou regimes ainda piores que os derrubados.
2. Por outro lado, diz-se noutro passo do manifesto que "os obscuros jogos do capital podem fazer desaparecer a própria democracia, como reconheceu a Igreja", sem especificar qual Igreja. A Católica Apostólica Romana? A Anglicana Inglesa? A Luterana da Alemanha? A Ortodoxa grega? A IURD? Igrejas há muitas. Mas tudo indica que Mário Soares se referia à ICAR, que é a dominante em Portugal e cujo clero tem ultimamente feito algumas declarações no sentido apontado. Ora é sabido que a Igreja Católica, sobretudo em Portugal e na Espanha, sempre apoiou a direita e os regimes mais reacionarios. Em Portugal, particularmente, o liberalismo implantou-se contra a Igreja, a República implantou-se contra a Igreja e esta sempre foi um dos principais esteios do regime salazarista.
Que necessidade tinha o Dr. Mário Soares, que durante toda a vida nos habituou a respeitá-lo e a apoiá-lo como "republicano, socialista e laico", de vir agora abrigar-se debaixo do manto etéreo da Santa Madre Igreja?
3. Finalmente, há a questão da oportunidade da publicação do manifesto, datado e divulgado exatamente na véspera de uma greve geral em Portugal, decretada pelas duas principais centrais sindicais portuguesas e politicamente apoiada apenas pelo PCP e pelo BE, e não pelo PS. É evidente que não se trata de mera coincidência; em política não há coincidências dessas. Fica assim a parecer que o intuito da publicação do manifesto foi apenas o de apelar à adesão à greve e manifestar as divergências entre o Dr. Mário Soares e a atual direção do Partido que fundou - o Partido Socialista. Ou seja: sob a veste de grandiloquentes apelos a todos os cidadãos dos 27 países da U.E., tratava-se apenas de questões paroquiais. Contrariamente ao velho brocardo latino, os signatários do manifesto quiseram ir "ad angusta per augusta".
Como cidadão de esquerda, socialista e europeísta, estou inteiramente de acordo com os ideais defendidos nesse manifesto.
Não posso no entanto deixar de lhe fazer alguns reparos.
1. Em primeiro lugar, nele se compara a luta dos europeus por esses ideais com a luta da "rua árabe". Parece-nos tal comparação duplamente infeliz. Por um lado, a "rua árabe" revoltou-se contra regimes ditatoriais. Ora na União Europeia não há ditaduras que seja necessário derrubar "na rua"; há governos resultantes de eleições livres e democráticas, que podem ser derrubados legal e democraticamente. Por outro lado, ainda hoje não sabemos, infelizmente, se dessas lutas da "rua árabe" resultarão regimes democráticos ou regimes ainda piores que os derrubados.
2. Por outro lado, diz-se noutro passo do manifesto que "os obscuros jogos do capital podem fazer desaparecer a própria democracia, como reconheceu a Igreja", sem especificar qual Igreja. A Católica Apostólica Romana? A Anglicana Inglesa? A Luterana da Alemanha? A Ortodoxa grega? A IURD? Igrejas há muitas. Mas tudo indica que Mário Soares se referia à ICAR, que é a dominante em Portugal e cujo clero tem ultimamente feito algumas declarações no sentido apontado. Ora é sabido que a Igreja Católica, sobretudo em Portugal e na Espanha, sempre apoiou a direita e os regimes mais reacionarios. Em Portugal, particularmente, o liberalismo implantou-se contra a Igreja, a República implantou-se contra a Igreja e esta sempre foi um dos principais esteios do regime salazarista.
Que necessidade tinha o Dr. Mário Soares, que durante toda a vida nos habituou a respeitá-lo e a apoiá-lo como "republicano, socialista e laico", de vir agora abrigar-se debaixo do manto etéreo da Santa Madre Igreja?
3. Finalmente, há a questão da oportunidade da publicação do manifesto, datado e divulgado exatamente na véspera de uma greve geral em Portugal, decretada pelas duas principais centrais sindicais portuguesas e politicamente apoiada apenas pelo PCP e pelo BE, e não pelo PS. É evidente que não se trata de mera coincidência; em política não há coincidências dessas. Fica assim a parecer que o intuito da publicação do manifesto foi apenas o de apelar à adesão à greve e manifestar as divergências entre o Dr. Mário Soares e a atual direção do Partido que fundou - o Partido Socialista. Ou seja: sob a veste de grandiloquentes apelos a todos os cidadãos dos 27 países da U.E., tratava-se apenas de questões paroquiais. Contrariamente ao velho brocardo latino, os signatários do manifesto quiseram ir "ad angusta per augusta".
Comentários
“PS considera "oportuno" manifesto de Mário Soares
O PS considerou "oportuno" o manifesto assinado por Mário Soares e outras personalidades, apelando à mobilização social e à luta pelos direitos dos trabalhadores, mas afirma que mantém a sua abstenção na votação do Orçamento de Estado para 2012 (OE2012).”
O PS disse que "compreendia" as razões que levaram Mário Soares a apoiar o manifesto de apelo à mobilização social na luta contra as medidas de austeridade, mas enfatizou que o partido vai manter a sua abstenção na votação do OE2012, refere o Diário Económico. link