Urbano Tavares Rodrigues – um homem bom

Faleceu ontem Urbano Tavares Rodrigues, grande escritor e resistente antifascista. Era um homem delicado a quem muitos recorriam para lhes apresentar o livro que julgavam destinado ao sucesso. O escritor e jornalista era incapaz de recusar o pedido e procurava encontrar algum mérito na prosa que o obrigavam a ler.

Conseguia, quando o autor ajudava pouco, dizer umas palavras de estímulo perante os que tinham ido para ouvir o Urbano sem se importarem com quem tinha escrito o livro.

Conheci-o no início de 1970 no tumulto das manifestações contra a ditadura, através da palavra que nunca recusava, fosse na Cooperativa dos Pedreiros em Vila Franca de Xira ou na cooperativa Devir. Era fácil chegar ao Urbano, estabelecer com ele amizade, usar a sua disponibilidade para conversar.

Para além da imensa generosidade, de que muitos abusavam, era da sua natureza ser um homem bom. Recordo a paciência com que leu as redações e viu os desenhos dos meus alunos da escola primária, mérito da professora agregada que me entregou uma turma de eleição quando regressei da guerra colonial. Ficou maravilhado e pediu-me para lhos deixar publicar no Diário de Lisboa.

Objetei-lhe que eram crianças de 9 e 10 anos e que um dia podiam repudiar o que nessa idade escreveram e desenharam.

O Urbano disse: “tens razão, que pena!”. E ambos ficámos desconsolados. Os desenhos e os textos dessas crianças perderam-se numa qualquer limpeza aos arquivos da escola n.º 44, ao cimo da Rua da Beneficência. Que pena!

Tive o privilégio de ter sido seu amigo. Encontrei-me com ele várias vezes, deslocava-me onde ele ia fazer conferências. Ia aprender com o intelectual e gozar a companhia do amigo. Em 1973 aceitei ir trabalhar para Coimbra e ainda me encontrava com ele em alguns fins de semana na pastelaria Granfina, em frente ao Café Nova York, onde eu tinha a tertúlia habitual.

Depois veio o 25 de Abril e cada um de nós rumou aos sítios onde julgou fazer falta e não mais o vi. Acompanhei-o através da televisão, dos jornais e de alguns livros. E hoje, sinto a sua falta. Partiu um homem bom.

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