Nós não somos a Grécia...
Com os cofres vazios e a enfrentar uma fuga maciça dos
depósitos, Alexis Tsipras, após a reunião de anteontem à noite, com Merkel,
Hollande e um grupo restrito de credores, foi abandonado no pelourinho do
Eurogrupo.
Portugal não é a Grécia, condenada à morte, é um país que se
deixa morrer lentamente, com cuidados paliativos, por entre elogios aos
estrategos da morte lenta.
Não temos um Governo que se bata pelo povo mas que lhe bate,
em nome de interesses alheios. Temos a cobardia de gente videirinha, incapazes
uns, capazes de tudo, outros. A dívida soberana dilatou e a estridência de plástico
das vuvuzelas do Governo amplificou o volume para anunciar a saída da troica e
o regresso aos mercados no doce enlevo do embuste que estupefaz.
Nós não nascemos no Jardim
de Academus, sob os auspícios de Platão, 384 anos antes da era vulgar, como
comunidade consagrada ao culto das Musas de Apolo, próximo da cidade que
tem o nome de Atena, deusa da guerra, é certo, mas também da civilização,
das artes, da sabedoria e da justiça. Nós vimos do século XII com um bravo
guerreiro, nado em sítio tão incerto quanto a tareia à mãe, hábil a alargar
fronteiras com a espada.
Somos a Grécia, na cultura helénica que assimilámos, na
judaico-cristã que nos moldou, no Renascimento, no Iluminismo e na Revolução
Francesa de que somos herdeiros. Somos ainda a Grécia no volume aproximado da
dívida soberana, impossível de pagar, na tragédia do desemprego e na miséria a
que chegámos, mas divergimos na fantasia de que teremos um destino diferente,
para melhor.
A falência financeira, o desastre económico, o desemprego e a
rutura do tecido social são, na Grécia e Portugal, o resultado do liberalismo
económico e do aventureirismo financeiro internacional, a que se juntaram erros
próprios e corrupção.
A Grécia, posta entre a espada e a parede, elegeu a primeira,
com Portugal ao lado dos algozes, a desejarem o seu fracasso. Portugal,
embalado no torpor da propaganda, crente perene do sebastianismo, espera a
manhã de nevoeiro. Não basta a negritude de cada dia e o fulgor da
incompetência permanente de quem nos governa.
Nós não somos a Grécia mas teremos o mesmo destino, sem a
dignidade dos gregos. Os algozes preferem que as vítimas vão para o açougue
pelo próprio pé.
Ave, Troika, morituri
te salutant.
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