A abertura do ano judicial

Por

E-Pá

A abertura do ano judicial trouxe à ribalta política questões verdadeiramente importantes.
A primeira das quais será uma promiscua relação entre a justiça e a política. A clarificação desde dois âmbitos é essencial. Nem a justicialização da política (p. exº. Brasil), nem a governamentalização da justiça (exº. Polónia) são boas soluções. 

A 'separação das águas' é fundamental para preservar a autenticidade democrática e o decorrer da abertura do ano judicial questiona se foi, de facto, isso que aconteceu. Todos temos queixas sobre o sistema judicial e desejamos que se resolvam bloqueios ancestrais que infestam este pilar da democracia.

Para além de questões pontuais como é a duração do mandato do(a) Procurador(a) Geral da República e o imbróglio com a República de Angola existem problemas de fundo. 
Um deles - para figurar como alerta - é a intromissão do Presidente da República numa área que pode e deve opinar, mas não deverá ser o seu 'condottieri'.

No ano passado o Presidente da República, em cerimónia idêntica, solicitou ao País, um 'Pacto de Justiça'. A 'super corporação' dos agentes judiciários (desde os oficiais de justiça até às mais altas magistraturas, passando pelos advogados e solicitadores) listou um conjunto de cerca de 90 medidas (avulsas?) para corresponder ao solicitado. 

A sessão de abertura do ano judicial deste ano foi dominada pelo tal 'pacto'. O Presidente incentivou os partidos, desde já, a aplicá-lo. Ora, parece existir em todo este processo um enviesamento. A questão da justiça é basilar para o processo democrático. Todos devemos ter opinião, todos devemos ser envolvidos na discussão, todos devemos disfrutar de capacidade proponente.

O pacto firmado pelos operadores judiciários - é necessariamente limitado - e não traduz uma situação imperativa. 

A Democracia moderna não convive bem com os corporativismos, resquícios dos tempos medievos.
A globalização tornou esses corporativismos em situações sistémicas que a 'financeirização' do sistema político é a sua expressão mais notória. A justiça no sentido tradicional e formal do termo foi colonizada pelos 'settlements', isto é, 'acordos' muitas vezes arbitrários. Exemplo gritante: os resgates bancários ocorridos como consequência da crise financeira, ...

Uma reforma da justiça é, com certeza, uma questão crucial para todos os regimes políticos democráticos. Todavia, o pacto acordado pelos agentes judiciários não é para impor aos portugueses, através dos partidos. Há algum enviesamento neste processo.

O pacto será, quando muito, um instrumento de trabalho para promover uma discussão pública, mesmo que esta metodologia auscultativa acarrete alguma demora na aplicação da 'reforma'. Entra aqui o aforismo popular: 'cadelas apressadas tem filhos cegos'...

Convinha não andar com a carruagem à frente dos bois. Coisa que o Presidente da República parece não entender... 

Apostila - Este comentário foi deixado pelo colaborador do Ponte Europa (e-pá) num post meu. Aqui fica para ter a visibilidade que merece.

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