A nova liderança do PSD e as manobras em curso...

Os últimos desenvolvimentos à volta da nova liderança do PSD, corporizados na antevisão de qual será o papel e o desempenho de Rui Rio no contexto partidário e nacional, estão a desbravar um caminho sinuoso que, ainda, se mostra bastante nebuloso.
 
A campanha das ‘diretas’ no PSD foi dominada por uma antecipada candidatura a primeiro-ministro. Isto é muito importante em questões de poder mas pouco adianta em questões de posicionamento partidário. Na verdade o que o povo escolhe nas eleições legislativas é o Parlamento (230 representantes), não o primeiro-ministro. Este será um resquício do passado como era o ‘arco da governação’ e que, de certo modo, estava no pensamento de Passos Coelho, na saída das eleições de 2015. Um cenário que foi ultrapassado pelos ‘novos tempos’ que geraram novas práticas.
 
Na forja estará outra coisa, mais concretamente o ‘Centrão’ que responde aos desígnios de um sector privilegiado da burguesia empresarial nacional – representada pela CIP e economistas avulsos (mas politicamente conotados) - por defender interesses e perspetivas de crescimento (dos lucros, entenda-se) marcadamente vistos sob uma óptica mercantil e monetarista, onde as pessoas pouco ou nada contam.
 
O apelo ao ‘Centrão’ está – nos mentideros da política partidária - a tornar-se demasiado ruidoso facto que levou António Costa nas Jornadas Parlamentares do PS em Coimbra a proferir juras que estava confortável e em boa companhia  link
Só esta necessidade de enfatizar as assumidas ´posições conjuntas’ à Esquerda que permitem ao PS governar, mostra em que medida as eleições no PSD têm capacidade para mexer com os equilíbrios político-partidários estabelecidos. E como, a par de todas as negações, o ‘Centrão’ voltou, sub-repticiamente, à arena política portuguesa.
 
E prenúncio de uma ‘rentrée’  (do dito ‘Centrão’) apoia-se na falácia posta a correr (pela Direita e pelos cépticos da solução de Esquerda) de que as ‘posições conjuntas’ subscritas pelo PS, BE, PCP e PEV, esgotaram o seu programa, esvaziaram-se e estão incapacitadas de fazer as tão solicitadas (pela UE e Direita) reformas.
Ora vejamos: Conseguidas as reversões das situações mais gritantes resultantes das medidas de contenção orçamental e salarial oriundas da Troika (e 'colaboracionismo' do Governo PSD/CDS) que colaram ao País o ferrete do empobrecimento, demonizaram a função pública e exacerbaram um conflito intergeracional, é fácil constatar que resta ainda muito trabalho político e social por fazer.
 
Na ordem do dia estão tarefas inadiáveis, como sejam, a valorização do trabalho e dos trabalhadores e o controlo público sobre sectores estratégicos que foram vítimas das privatizações (outra receita neoliberal imposta), entre outras.
A valorização do trabalho e dos trabalhadores, o incremento da produção nacional, o fim das situações precárias, o regresso à contratação coletiva, novas políticas salariais e fiscais, etc., enfim, um conjunto de posicionamentos políticos que desfaçam os escalonamentos salariais e colaborem decisivamente para uma melhor redistribuição da riqueza e diminuíam o fosso que separa os pobres dos ricos, são trabalhos que estão na forja e deverão preencher a agenda política para os próximos tempos.
Este será o grande desafio da Esquerda. Difícil para o BE, PCP e PEV mas também problemático no interior do PS onde vozes da ‘ala Assis’ não esmoreceram e fantasmas à volta de indefinidos radicalismos ensombram a capacidade de convergência.
 
Por outro lado, a situação nos sectores económicos estratégicos revela uma desregulação impressionante e exibe uma demissão de uma intervenção (regulação) pública forte (vasto denominador comum de qualquer política socialista). De facto, as comunicações (CTT, PT), a energia (GALP, EDP, REN), os transportes (rede multimodal ferroviária, TAP, rodoviária e Metro), a comunicação social (Altice, p. exº.) estão num esquema de roda livre onde vale tudo e o prejuízo das respostas aos cidadãos é mais do que notório.
Resta saber quando a Tecnologia (e a suas inovações) bem como o Turismo deverão, ou não, entrar neste saco.
 
Finalmente, o sector social (Educação, Saúde e Segurança Social) mostra sinais de fraqueza e debilidade estrutural e orgânica sob uma compressão orçamental intensa. De futuro, terão de ser canalizados maiores esforços de investimento público (em meios, capacidade instalada e recursos humanos) para cumprir cabalmente (prontidão e qualidade) as suas funções de serviço público.
 
De fora, fica o sector financeiro (bancário) um autêntico pesadelo para os contribuintes nacionais porque sendo uma situação mais complexa é mais difícil de ‘reformar’ mas também por suscitar outro tipo de envolvimento (multinacional), nomeadamente em termos europeus, dada a existência de uma moeda comum e supervisão do Banco Central Europeu.
 
Os repetidos apelos ao ‘recentramento’, à moderação e ao regresso aos esquemas de haraquíri da social-democracia que se verificou em toda a Europa (fiquemos por aqui) está diariamente a ser colocado no caminho da Esquerda para esta Legislatura e mostra à saciedade como a concertação política ocorrida na sequência das eleições de 2015, não foi digerida pela Direita e só um diletante fair play lhe tem permitido manter alguma (pouca) compostura.
Os sucessivos apelos ‘à moderação do PS’ nada mais significam do que a tentativa de esvaziamento ideológico e confinam as suas opções políticas a um ‘liberalismo refrescado’ ‘, isto é, à emergência de uma ‘via social-liberal’.
 
O facto do ‘bloco central’ ter sido tão discutido pelos candidatos à liderança do PSD, embora renegando mecanicamente a sua possibilidade, interesse e oportunidade, dentro de uma bacoca postura de ‘quem desdenha que comprar’, mostra que o assunto está vivo, agudamente presente e a incomodar toda a estratégia da Direita que, não antevendo um regresso fácil ao poder em 2019, tudo fará para que se mantenha o status quo herdado de Thatcher, Reagan e até de Blair.
 
Ora, o bloqueio pela Direita de um conjunto de ‘reformas’ - que estão institucionalmente endossadas ao Governo, i. e., à Esquerda -  virá ciclicamente ao de cima, nesta 2ª. fase da Legislatura. A travagem de reformas necessariamente conotadas e desenhadas pela Esquerda,  só é possível com a (re)composição de um ‘bloco central’ que, contrariando as juras e promessas e bitaites diários, poderá inclusive ser tentada antes das próximas Legislativas.
 
A ‘paranoia dos consensos’ sobre tudo e nada tornou-se uma bandeira da política – abundantemente explorada por Marcelo Rebelo Sousa – cuja viabilidade só pode ser concebida à sombra de um ‘Centrão’, explicito ou não.
E, assim, em lugar de discutirmos as reformas laborais, a qualificação do emprego, criação de riqueza e a sua redistribuição, os sectores estratégicos da economia, o sector financeiro e a dívida pública, entre outros, vamos andar entretidos com previsões e ‘cenários’ sobre as ‘réplicas’ que a nova liderança do PSD poderá introduzir nos equilíbrios políticos presentes e que passam obrigatoriamente pela recomposição de um ‘bloco central’.
 
Todos temos a perceção de que o ‘Centrão’ é um risco enorme para o País e fatal para (toda) a Esquerda. Ocupar esta 2ª. fase da Legislatura com ‘manobras de diversão’ e ‘esgrimir fantasmas’ é embarcar na estratégia da Direita. O resto é paisagem...

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