José Saramago - escritor, ateu e comunista

José Saramago, o Nobel do nosso contentamento, faz hoje 85 anos, embora, segundo o registo, lhe faltem ainda dois dias.

Era aguardado no Convento de Mafra, localidade onde tem uma escola secundária com o seu nome, à revelia do edil que nunca autorizou o preito que o Governo de Guterres acabou por impor. Há 290 anos foi lançada a primeira pedra do Convento com que D. João V agradeceu a mercê divina de um herdeiro e delapidou o ouro do Brasil que lhe sobrou das oferendas ao Papa.

Não adivinhava o «Senhor Fidelíssimo», título e prémio papal ao desperdício com que deslumbrou o Vaticano, que o Mosteiro serviria de cenário a uma das mais interessantes obras literárias do maior ficcionista português do Século XX.

Saramago deu a Mafra a fama internacional projectada pelo «Memorial do Convento», um romance em que a funda erudição se associa à fábula, as alegorias mergulham na história e Frei Bartolomeu Lourenço acaba louco por entre dúvidas metafísicas e a perseguição do Santo Ofício, havendo ainda tempo para o amor entre Baltazar Sete-Sóis, ex-soldado maneta, e Blimunda Sete-Luas, que perscrutava vontades através dos corpos das pessoas, transparentes ao seu olhar.

A beleza literária e a linguagem inovadora criaram uma obra-prima a que o Convento de Mafra serviu de pretexto. Vinte e cinco anos depois da sua publicação e de 1 milhão de exemplares vendidos em Portugal, o Memorial do Convento aí está como obra imortal do génio de um escritor que a doença impediu de estar hoje presente.

José Saramago deslocar-se-ia hoje ao Convento de Mafra se a doença o não retivesse, quiçá entregue ao desvelo de Pilar del Rio. Terá sido a última vez que Saramago perdeu a primeira oportunidade de falar do Memorial do Convento no Palácio que lhe serviu de berço.

Parabéns, José Saramago, pelos 85 anos e, sobretudo, pela obra singular, em língua portuguesa, que rivaliza em solidez e imponência com o Convento de Mafra.

Comentários

Anónimo disse…
Parabéns Carlos Esperança por este excelente texto sobre genial obra e sobre o genial escritor.
e-pá! disse…
José Saramago bem merece as sentidas e expressivas palavras que integram este post.

Hoje, é moda, em Portugal, denegrir Saramgo, como escritor, como homem, como português.

CE: Congratulo-me pela sua verticalidade e honestidade intelectual.
Vítor Ramalho disse…
Ele que fique lá por Espanha. Os portugueses dispensam bem os Migueis de Vasconcelos.
Anónimo disse…
Exmo Senhor Vitor Ramalho:

Está completamente na moda!
ana disse…
Saramago: um homem vertical, um grande escritor. Lido e amado lá fora, vítima do preconceito e da ignorância no seu próprio país.
andrepereira disse…
Parabéns José Saramago. O nosso maior escritor vivo. O homem que recuperou o romance histórico, o criador de reflexões angustiantes e apaixonantes. Um mestre sem igual na língua portuguesa e na força do pensamento.
Discordo do comunismo que ele professa, mas concordo com a maior parte do que pensa e admiro o modo como escreve.
É um privilégio viver no mesmo tempo que este português que atravessará muitos e muitos séculos.
Anónimo disse…
agora é que fiquei confuso!

O José Saramago não é espanhol?
Anónimo disse…
Um texto superior acerca de um um Homem superior.
Que pena alguns ignorantes e resabiados serem também analfabetos, se não fossem não diriam tantas atoardas
Anónimo disse…
@ jrd:
"resabiados" es Castellano, por supuesto, no?

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