Tempos difíceis...

Já nada – daqui a pouco ninguém - consegue iludir a inevitabilidade dos países periféricos da UE naufragarem na insustentabilidade.

O XIX Governo Constitucional, empossado recentemente, não conseguirá libertar-se desse estigma a prazo. Mas até lá, teremos os malabarismos políticos do Centro-direita que julgam ter chegado a hora de impor – uns atrás de outros – “pacotes neoliberais”. Sabem que o fazem sem qualquer capacidade de resolver [cabalmente] a calamitosa situação económica de financeira do País. Desfrutam de uma base política para o fazer. Não tão sólida como isso, mas suficiente impor retrocessos civilizacionais duradouros [o neoliberalismo ensinou-nos que nada é irreversível].

Um dia, quando a incapacidade política em governar vier à tona - já que a insistência em governanr contra as profundas aspirações da sociedade corrói a determinação dos "carrascos" - a santa aliança PSD/CDS soçobrará no meio de irreprimíveis convulsões sociais e políticas.

A recente medida que visa espoliação de 50% do 13º mês (não será literalmente assim já que será o excedentário dos 485€ do ordenado mínimo mas a imagem que passou foi o furibundo ataque ao subsídio de Natal) é mais um arranjo fiscal para engordar a receita em busca de soluções para problemas pontuais (o deslizar défice orçamental para 2011) e materialização da ideia peregrina de representar – para a Europa e para os "mercados" - o papel do “bom aluno”, diria mesmo, do diligente "pupilo" dos senhores reitores de Bruxelas.
Outros (problemas) virão em catadupa e cresce o receio que tendo o ano 12 meses haja um largo manancial de oportunidades para abocanhar fatias de remuneração mensalmente até ao completo exaurir dos bolsos dos cidadãos. Então, o País viverá o esplendor do neoliberalismo: a resiliência das instituições financeiras face ao descalabro de milhões de famílias sofrendo a calamidade do desemprego, a drástica diminuição do poder de compra e a perda das suas habitações, i.e., a total degradação do nível de vida, entretanto tornada incompatível com a dignidade humana.

O trajecto (histórico, político, social e cultural) não é - como sabemos - tão linear. A perspectiva de uma degradação progressiva e inexorável das condições de vida (aquilo a que a Direita glosa como sendo ”insustentáveis privilégios”) não é um processo histórico e social passível de ser desenhado a régua e compasso. Ninguém é arredado do bem-estar, excluído do progresso (material, social e profissional) de modo indiferente ou complacente.
O caso da Grécia – o tal que é sistematicamente considerado diferente do nosso – é paradigmático, sem ser inovador. Há muito que a História nos ensina isso. Situações drásticas de longa e sustentada austeridade, de imposição de pesados sacrifícios, descambam invariavelmente em fome e pobreza que são os rastilhos desencadeantes de uma demolidora violência social (quando já nada há a perder…quando não há futuro à vista).

Não existe uma baliza definidora para a eclosão das rupturas sociais. Muitas vezes ocorrem quando, aparentemente, tudo estava a correr bem e “a população” mostrava-se acomodada. Os confrontos sociais, a violência reactiva ao repetido espezinhar das pessoas, aparece de rompante, de modo autónomo, reprodutível e generalizada, i.e., de qualquer modo e por todo o lado.
Então a continuação de um sistema político que – conscientemente - optou pela destruição de vidas ao serviço de valores absurdos (“acalmar” os mercados, pagar juros usurários, vergar-se aos interesses dos grandes grupos financeiros escondidos por detrás da inocente designação de "investidores"), torna-se insustentável. Deixa de existir suporte social, embora possam prevalecer aritméticas políticas teoricamente viáveis.

Então existem duas saídas: A insurreição emergente da sociedade molda o poder ou o poder - perdida a autoridade e a legitimidade democrática - impõe pela força a supressão das liberdades fundamentais e prossegue o "massacre" dos cidadãos. A História não contempla situações intermédias.

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