A ponte 25 de Abril e os saudosistas do fascismo

Há 50 anos, no dia de hoje, foi inaugurada e convenientemente benzida a primeira ponte que ligou Lisboa à margem sul do rio Tejo. Américo Tomás, mordomo do déspota, quis que o apelido do ditador desse o nome à ponte que inaugurou fardado de almirante.

Gonçalves Cerejeira, cardeal e amigo do ditador, com um báculo de dois metros, a mitra e um vistoso vestido rendado, rodeado de clero, fascistas e pides, não poupou o latim e a água benta, e aspergiu vigorosamente o hissope, exibindo o anelão a reluzir ao sol.

Foi uma obra grandiosa e necessária no país que liderava a Europa no analfabetismo, na mortalidade infantil e materno-fetal, na pobreza e no atraso. A partir daí, aos lavadoiros, fontanários, caminhos e escolas, o ditador juntou a glória de mandar construir a Ponte com o seu nome.

As prisões estavam cheias de opositores; a emigração clandestina era o destino de quem fugia à miséria; a censura exercia-se nos jornais, revistas, livros, rádio e televisão; em Angola, Moçambique e Guiné continuavam a morrer jovens numa guerra injusta, inútil e criminosa; os Tribunais Plenários tinham juízes com vocação de algozes e em Caxias, Peniche e na R. António Maria Cardoso a tortura era o método de investigação; o poder discricionário da ditadura ia do Minho a Timor.

Faltavam quatro dias aos dois anos que ainda separavam o ditador da queda da cadeira, uma eternidade para quem sofreu a tirania a que não faltou um precário sucessor.

Hoje, os trogloditas que sobraram, e os que nasceram depois, não deixarão de incensar o tirano e gostariam que o seu nome tivesse perdurado na ponte. O 25 de Abril é chumbo derretido que os dilacera, e a História, embora tarde, fez justiça.

Os nomes de Franco, Hitler e Mussolini também foram banidos da toponímia, a bem da salubridade pública, mas há saudosistas em cujo devocionário se escreve a memória dos carrascos que oprimiram os seus povos.

Há meio século, no dia de hoje, foi aberta ao trânsito a Ponte 25 de Abril. Era sábado, também.


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