O réptil* – Dedicado ao André Ventura e ao seu saprófita Pedro Pinto
O réptil tem a pele grossa e respira por pulmões. Não controla a temperatura. Aquece-se nos média e foge do calor para o ar condicionado do escritório ou da AR. É exímio na arte de se camuflar, mas é um carnívoro que não larga as presas. Põe um cravo na lapela quando lhe convém, e abomina-o se lhe interessa. Defende os Direitos Humanos para ter um diploma e serve-se desse diploma para os combater.
O réptil é viscoso e repelente, e consegue atrair as presas.
O réptil não tem passado, tem fome de futuro. E adapta-se muito bem ao ambiente
terrestre.
O réptil passa pelas pessoas e parece normal. Psicopatas,
marginais e cadastrados veem no réptil a luz que os ilumina, o arauto da nova
ordem que germina no ódio à liberdade, o aríete contra as minorias e a
democracia.
O réptil foi, em Portugal, o primeiro animal a conquistar um
lugar na casa da Liberdade, para a combater, fazendo jus à história evolutiva,
em que os répteis foram os primeiros vertebrados a conquistarem o ambiente
terrestre.
O réptil adora a ditadura e defende a democracia, odeia a
diferença e alicia indiferentes. Grita que é perseguido quando persegue e
continua ruidoso quando lacera as vítimas.
O réptil desfila na Avenida da Liberdade, alheio ao nome que
pretende extinguir. Finge apreço pela diferença e faz da manifestação de força
a força da provocação que deseja.
O réptil defende a lei para a modificar, a ordem para a
subverter, as forças de segurança para as atrair para a vingança e a violência.
O réptil mente e atribui aos outros a indignidade própria. É
um traste que evita referir as avenças de que vive, o biltre que atribui aos
outros a náusea que é, fazendo das intrigas factos e das calúnias verdades.
O réptil é um professor dispensado da docência para insultar
o Governo ou o escriba em comissão de serviço nos média para corroer a
democracia.
O réptil não nasceu réptil. Fez-se, debitou baba e peçonha
nas televisões e cevou-se com os detritos que bolçou. Entrou na política
através de um imbecil e acabou a rastejar por conta própria, a regurgitar
calúnias e a atribuir aos adversários os retratos de si próprio.
O réptil é um invejoso e vingativo sem escrúpulos. É filho
do acaso. Despreza a justiça e apresenta-se como justiceiro. Se não aprovarem a
justiça que apregoa, dispõe de outra. Como não tem moral, a moral não conta.
Tem a moral que lhe convém. Por isso defende qualquer moral. E finge que tem
moral. Faz mal aos outros, e gosta, e, depois, faz-se de sonso. O réptil rouba
a honra que não tem e que dispensa.
O réptil é um cobarde perverso quando ofende e ataca
políticos. O réptil não tem pudor. Ouve marginais úteis e senis raivosos e tira
conclusões. Depois diz que não concluiu e esconde-se atrás do que ouviu. O
réptil é labrego nos jornais, grosseiro nas televisões e boçal nas entrevistas.
O réptil é um político que é mestre a rastejar.
O réptil é um furúnculo recheado de pus. É a cabeça de uma
infeção em marcha que se alimenta do ódio e das feridas que escarafuncha. É a
metáfora da nostalgia salazarista.
O réptil é o talibã que fere e mata, mas larga os explosivos
depois de esconder o corpo. O réptil não é monárquico nem republicano, de
esquerda ou de direita, ateu ou crente, é um animal que roja o ventre e rasteja
ao sabor do vento.
O réptil é perigoso porque nos habituamos a conviver com
ele.
(in Ancoradouro pág. 45/46, à venda nas livrarias) – *texto adaptado
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