Desemprego (2): o crepúsculo da "flexisegurança"...


Voltando à questão do emprego problema central da social da actual crise, os actuais problemas relativos aos ditos “Países Nórdicos”, nomeadamente, a Dinamarca, onde se congeminou o sistema de flexisegurança que, de certo modo, seduziu a social-democracia europeia, incluindo Portugal, mostra evidentes sinais de posições sociais claudicantes e um perigoso deslizamento para uma menor segurança.
Quem entre nós não citou as excepcionais condições e a generosidade dos Estados de Bem-Estar que constituíam o grupo de Países escandinavos?
Quem não elogiou os cuidados dispensados aos recém-nascidos, a existência de uma sistema de saúde gratuito (não tendencialmente…), os cuidados domiciliários aos idosos como prática generalizada, avultados subsídios para a educação…?

A flexisegurança que “oferecia” flexibilidade no mercado de trabalho às empresas e segurança aos trabalhadores despedidos, criada pelos governos centro-esquerda sob a inspiração de Lykketoft (então ministro da Economia… hoje desconhecido deputado), onde constava um seguro de desemprego durante 4 anos e a possibilidade de requalificação baseada numa formação profissional bem organizada pela Agência de Emprego Estatal, etc.
O sistema baseava-se na mobilidade do mercado do emprego: as empresas contratavam sem receios porque podiam libertar-se da mão de obra excedentária sem custos empresariais – já que os serviços públicos suportavam esses custos.

É neste caminho que a Dinamarca se torna “the best country for business” sendo para o patronato um paraíso e para os trabalhadores uma aparente garantia de “quase” pleno emprego… Baseava-se este sistema em 3 pilares: liberalismo político e económico, bom clima para os negócios e na paz social…

Chega a crise financeira e económica e a flexibilidade permanece e intensifica-se e gera não a paz social mas uma grande insegurança.
Até ao início da crise a Dinamarca exportava a metade do seu PIB. Este facto condicionava e determinava as negociações sociais reconheceu a Danish Industry – associação patronal dinamarquesa.
Com a crise a exportação caiu mais de 20% num ano e, cada mês que passa, as “quebras” suplantam as anteriores.
O exemplo mais paradigmático foi a falência da companhia área de low cost Sterling Airways…
Começa o intenso movimento de despedimentos. Desde o último Verão o aumento do desemprego duplicou o francês. Só em Junho de 2009 provocou 107.000 desempregados...


Num ápice, uma crise que começou no sistema hipotecário imobiliário americano, na ganância dos gestores e na avidez dos correctores da Wall Street e congéneres, estendeu-se ao Mundo e “matou” um temporáriamente concertado sistema de organização social (no tempo das vacas gordas) que, tentou vender à UE e foi o orgulho da Dinamarca.
O sistema político e económico liberal de lá, como em toda a parte, não teve condições, nem coerência política e, mais grave, clarividência económica para resistir aos cantos da sereia do neoliberalismo... e a elegia do mercado livre!
Portugal foi um dos Países que "embarcou" nestas concepções de flexisegurança que de certa maneira "inspirou" o actual Código de Trabalho. O que pensará sobre este assunto a nova Ministra que conhece as experiências europeias e, que, à priori, tantas reservas levanta às confederações empresariais, melhor diria, patronais.

Será que a crise tem potencialidades de transformar o frágil welfare num workfare, selvagem?

Vamos esperar pelo programa de Governo...

Comentários

Graza disse…
(...)"embarcou" nestas concepções de flexisegurança que de certa maneira "inspirou" o actual Código de Trabalho (...).
E vamos lá ver o que é que nos vai fazer "inspirar" agora na Economia.
andrepereira disse…
Caro é-pá. Imagine agora que grandes economias exportadoras, como a alemã, a dinamarquesa, a holandesa e a japonesa não tinham esse mercado de trabalho flexível, com generosos apoios aos desempregados (o que nem sempre acontece no Japão). Sabe o que aconteceria? Muitas dessas empresas que deixaram de poder exportar não tinham apenas reduzido a sua produção, não tinham despedido alguns (ou muitos) trabalhadores. Não. Teriam acumulado prejuízos imensos e em breve estariam a ENCERRAR DESPEDINDO NÃO ALGUNS, MAS TODOS OS TRABALHADORES. E sobretudo, quando voltar a retoma, sabe o que acontece? Essas empresas estão lá, com a estrutura montada, com o know-homw, com os canais de distribuição, com as marcas, com os contactos empresariais e RAPIDAMENTE AUMENTAM A PRODUÇÃO E VOLTAM A CONTRATAR OS TRABALHADORES! Que entretanto puderam fazer formação profissional, melhorar as suas qualificações e não sofreram grave prejuízo (talvez entre 20 e 30% do seu rendimento, é certo).
A alternativa seria começar TUDO DO ZERO e com trabalhadores com as mesmas qualificações de há 1 ou 2 anos atrás! É essa a diferença, por isso, a social-democracia e muito do que foi defendido na TERCEIRA VIA está certo e esta crise pode ser a prova disso. Veja como está a Itália, ou como estaria Portugal se não se tivesse permitido o Lay-off! - com sistemas empedernidos, com mentalidades paralisantes do patronato e dos sindicatos. No fundo, o Código do Trabalho de Vieira da Silva veio salvar muitas empresas e milhares de postos de trabalho!
Morcego disse…
Começo a pensar que não existe outra via possível senão a flexibilidade da lei laboral, conjugada com medidas mais efectivas de protecção social.
Parece-me impossível conjugar o actual modelo económico mundial, baseado no livre comércio entre países e regiões com condições económicas, políticas e sobretudo sociais, substancialmente diferentes. Refiro-me em concreto à China, India e Cia. Na generalidade das situações, não é possível competir directamente com eses países. A única saída é tentar competir nas actividades mais valiosas das redes de valor: a marca, os serviços, a concepção de produtos, o design, enfim as actividades altamente especializadas e a inovação. A questão é que nós não temos capacidade para sair por aí. Falta-nos qualificação de trabalhadores e gestores, dinàmica e empreendedorismo e temos uma ainda algumas características da nossa cultura que atrapalham. Nós vamos conseguindo, temos bons exemplos, empresas de "nova" geração, mas o processo é muito lento e gradual.
Neste contexto, julgo que não flexibilizar o mercado de trabalho é uma contradição. De livre vontade ou forçados entrámos nesta "economia mundial" que a isso nos exige. A diplomacia e os grandes interesses económicos atraíram para este "sistema económico mundial" paises como a China que competem deslealmente connosco. Qual a alternativa no curto/médio prazo?
Morcego disse…
André, concordo consigo mas convenhamos que os seus argumentos são os usados pelos economistas liberais, complementados com a preocupação pela segurança social. E tem razão. Neste paradigma económico, não temos alternativa senão pensar de duas formas: ou lutamos pela mudança no contexto mundial, invertendo o livre comércio internacional com os países que não cumprem as suas obrigações sociais básicas como a China (dumping social), o que é muito difícil, ou temos que adoptar o paradigma de pensamento dominante, o neo-liberal. Eu gostava de ver mais alguém na cena internacional a discutir abertamente a primeira via, embora seja politicamente muito arriscado.
e-pá! disse…
Caro André:

Parte da resposta às suas pertinentes questões está no 2º. comentário de "morcego".

A recente crise, em minha opinião, não veio consagrar qualquer 3ª. via, muito menos em relação ao País que usei para referência (Dinamarca),,,

A recente crise veio, acima de tudo, consagrar que as economias "tradicionais", com toda a regulamentação que as envolve, não terão espaço perante as ditas economias "emergentes", nomeadamente, as orientais, já que o processo da America do Sul é, digamos, um processo de libertação colonial das suas economias.

Chegaremos a um ponto em que a retoma será bloqueada por um próspero, mas esclavagista, Oriente.
E, aí, ou os organismos internacionais têm capacidade para impôr regras humanitarias, sociais e económicas com carácter universal e equitativas que reponham a lealdade da competitividade e da produtividade, ou os povos da velha cultura industrial, teconológica e das lutas sociais pela dignificação do trabalho e dos trabalhadores, pelo controlo da qualidade, terão de lutar pela sua sobrevivência.
Hoje, a palavra de ordem na economia não é a restauração do neoliberlismo que a dita 3ª. via favoreceu, mas antes a necessidade de erguer uma nova ordem económica mundial, condicionada e limitada por questões ambientais e sociais e assente nos escombros do mercado livre, desregulado, selvagem. Todos os dias ouvimos da boca de empresários (melhor, velhos patrões...) dizer que é preciso pôr o mercado a funcionar.
Mas, qual mercado?

Caro André:
Convidava-o a perder alguns momentos a reflectir sobre o que aconteceu em Portugal à incontrolável proliferação de restaurantes, ditos chineses...
Bastou um apertado controlo de qualidade (do tipo não deixar vender gato por lebre...) ou acha que "isso" se deve a "maldadades" da ASAE?

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