Crimes em nome de Deus
Garden of Eden - Jan Brueghel |
Deus está, de facto, para azar dos homens, em toda a parte. O deus mais verdadeiro é o que tiver mais devotos, armas e fanatismo a seu favor. Sempre que deus está em alta, a liberdade estiola; quando os homens adoram o seu deus, odeiam os alheios. Os crentes rogam-lhe favores com o mesmo fervor com que acalentam o ódio ao deus dos outros.
É por isso que a democracia fenece onde a religião floresce, a liberdade mingua onde a fé prolifera e o progresso estiola onde a piedade medra.
Não há democracia onde a religião domina o aparelho de Estado. Os direitos humanos não são respeitados onde o poder temporal e o religioso se confundem. Foi na base da separação de poderes e, sobretudo, na separação da Igreja e do Estado, que os modernos Estados de direito se construíram. Foi a laicidade que permitiu o pluralismo ideológico, refreando a vocação totalitária das religiões.
Quando parecia que o Estado laico se tornara paradigma das nações civilizadas, quando o multiculturalismo se convertera em modelo de convivência cívica e os preconceitos étnicos e culturais pareciam derrotados pela instrução, inteligência e sensibilidade dos povos civilizados, os demónios totalitários acordaram ao som das orações, fortalecidos com jejuns, pregações e penitências.
A Holanda, a doce Holanda, era um exemplo de convivência cívica entre etnias diversas e diferentes culturas, um oásis de tolerância entre distintas opções políticas e religiosas. Em 2003 ficou em choque, quando Pim Fortuyn, um político da direita populista foi assassinado. Depois, o homicídio do cineasta Theo Van Gogh, após a denúncia que fez da forma como o Islão trata as mulheres, e dos requintes de crueldade com que o tratou esse fanático, entrou em declínio a preservação do multiculturalismo holandês. Até hoje.
Incendeiam-se os templos e a opinião pública, e o racismo e a xenofobia crescem. A extrema-direita, que vive da intolerância, explora frustrações, instila o medo, manipula paixões e acicata ódios. A hostilidade aos estrangeiros desenvolveu-se. A fé das pessoas cultas e civilizadas nas sociedades multiculturais vacila. O fascismo islâmico rejubila com a intolerância de que é alvo. As religiões precisam de mártires. Os deuses querem sacrifícios. Os templos tornam-se quartéis que incitam soldados à guerra santa, e entram em desvario prosélito. A religião tem de ser contida, os Direitos Humanos defendidos, a igualdade entre os sexos exigida. A democracia precisa de ser salva. Urge conter a fé que corrompe, intimida e mata.
Os três últimos lustros acordaram o mundo árabe, no ocaso da sua civilização falhada, para uma vingança cega que a demente invasão do Iraque, em 2003, estimulou.
Desde então, não param de surgir devotos inebriados pelo martírio, em busca de virgens e rios de mel, na vertigem sangrenta que procura extinguir os infiéis do seu deus para garantir a sua verdade e as delícias de uma vida para além da que tão cedo prescindem.
E não há antídoto adequado na civilização que herdámos e nos cabe defender!
Comentários
Não se preocupe demais com a canalha desajeitada que por aí se pavoneia. Sabemos o que acontecerá,depois de muitos sacrifícios. Não sou eu que o digo: é a História