Lembram-se do choque fiscal do PSD?

Nos dois meses que precederam as últimas eleições autárquicas, o triunfo da direita tornou-se fortemente previsível. Os mais destacados elementos do PSD, que esperavam a oportunidade para despedir Durão Barroso, prevendo a vitória que se avizinhava, conformaram-se com o líder e multiplicaram-se em declarações de que o PS teria de saber extrair conclusões em caso de derrota.

E a derrota do PS aconteceu, extensa, profunda e avassaladora. Guterres tirou as conclusões e, num gesto que «El País» considerou de grande dignidade e um exemplo que apontou aos políticos espanhóis, apresentou a demissão. Não lhe perdoaram a decência e a nobreza os correligionários que viram as sinecuras perigar.

A direita, sôfrega do poder, fez pagar caro ao País a pressa e a impreparação. Após as legislativas, o cavaquismo acordou de seis anos de hibernação por interposto cherne dado à costa já sem fôlego. Com mais uma semana de campanha morreria exausto, à vista da praia, afogado em sumo de laranja amarga. Os oportunistas, desanimados com os magros resultados, capitularam perante um CDS radical, fizeram um casamento de conveniência e criaram o mito da «fuga» para disfarçarem as suas fragilidades e os seus fracassos.

O PSD teve nessas eleições legislativas o apoio do Benfica, da Conferência Episcopal, do Dr. Balsemão, do Eng.º Belmiro, da Associação Nacional de Farmácias, das empresas de construção civil, dos autarcas das maiores cidades e dos presidentes de Junta dos mais obscuros meios rurais, do Prof. Cavaco, do urânio empobrecido, da ponte de Entre os Rios, da taxa de alcoolemia, das eleições autárquicas, da meningite e do Prof. Marcelo. Tudo e todos apostaram numa maioria absoluta do PSD a que se juntaram os independentes do costume, ávidos de se sentarem à mesa do orçamento. Calcula-se a desolação de se verem reféns do Dr. Portas (Paulo) que construiu a desforra de feira em feira, a pulso e rancor, enquanto o Dr. Monteiro fazia campanha pelo inimigo e o Dr. Santana Lopes, pela primeira vez, reconheceu Durão Barroso como grande líder.

Se alguém prometeu o que não podia, e fez o contrário do que prometeu, foi a coligação que agora se despede do poder, sem deixar saudades. Durão Barroso quando disse que, enquanto houvesse pensões de miséria, não seria construído o aeroporto da Ota, limitou-se a anunciar que cancelava o aeroporto. Quando afirmou que ia acabar com as listas de espera nos hospitais apenas pensou em fazer pagar as consultas. Ao prometer tirar Portugal da cauda da Europa não foi a aproximação que conseguiu mas o afastamento que empreendeu, ao contrário do que sucedeu com os Governos que o precederam.

Nunca tantos esperaram tanto de quem tão pouco deu. Durão Barrroso desertou para Bruxelas, humilhado nas eleições europeias, endossando o partido e o Governo a Santana Lopes, um epifenómeno que o PSD agora renega como se a Comissão Nacional o não tivesse ungido em apoteótica unanimidade.

Quando ontem ouvi o PSD, que ainda é Governo, a verberar a eventualidade de recurso aos impostos pelo indigitado ministro das Finanças, veio-me à memória o «choque fiscal». Lembram-se?

Comentários

Anónimo disse…
É do professor e prosador economista César das Neves (PSD?) a constatação de um grave problema nacional - na política e no resto: «não ter vergonha»

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