Isto, a ser verdade, é muito grave

Segundo o Público, ao advogado João Pedroso, foi encomendada uma empreitada de sistematização do corpus juris sobre educação pelo valor de 290 000 Euros, cujo resultado se saldou em meia dúzia de caixotes de cópias de diplomas legais abandonados numa arrumação do Ministério da Educação. Ora isto, a ser verdade, é muito grave.

- 290 000 Euros seria financiamento suficiente para um projecto bianual multidisciplinar envolvendo pelo menos dez investigadores e um professor coordenador, atingindo-se os objectivos esperados com muito melhor qualidade científica, e ainda outros estudos (artigos, teses de mestrado e doutoramento) relacionados, gerando-se valiosas sinergias e reforçando-se o output de I&D. Com cinco universidades públicas ensinando direito, com profissionais altamente qualificados e recurso a jovens investigadores de alto mérito, porquê entregar a um advogado sem especiais pergaminhos tal empreitada? Para mais, 290 000 Euros é talvez muito mais dinheiro do que o que seria estritamente necessário para tal encargo.

-Porquê um ajuste directo numa empreitada de montante tão elevado? Porquê João Pedroso, uma pessoa com ligações ao partido no poder?

-O que fazem os juristas do Ministério da Educação, que há partida deveriam ser os melhor preparados para levar a cabo tal empreitada?

-Se o trabalho executado não tinha a qualidade convencionada, porque razão houve pagamento, ainda que parcial? Quem avaliou e fiscalizou a sua conformidade?

-Se foram pagas centenas de milhares de euros por esse trabalho, porque motivo foi "arquivado" e não colocado em uso?

Esta notícia, a ser verdadeira, demonstra cabalmente o desperdício de recursos do erário público, a falta de transparência na adjudicação das empreitadas públicas, e como estas são frequentemente adjudicadas a entidades com falta de perfil para as executarem profissionalmente.

Comentários

e-pá! disse…
O jurista João Pedroso é um espcialista em matéria de Educação?

Quem aceita esta afirmação como se tratasse de um axioma, deveria ser sujeito a participção à PGR, por suspeita de favorecimento pessoal...

Todo este regabofe de assessorias, consultorias, experts, "spin doctors", etc., que enxameiam os gabinetes ministeriais e outros departamentos do Estado, deveriam ser sujeitos a uma regulamentação especial, publicamente debatida.

E relembro que, na função pública, a norma de contratação é o concurso público, mesmo para os CIT's.

A contratação directa, selectiva e pessoalizada, deve ser uma excepção, carente de pormenorizada justificação, pelo menos, junto ao Tribunal de Contas.

António Guterres bateu-se por isto. Alguém, dentro do PS, boicotou-o.
O resultado está à vista!

Only, jobs for the boys...
Rui Cascão:

O ambiente é de desconfiança generalizada. Não ponho em causa a honestidade dos jornalistas. Mas que há bruxas, há.

Há dias que pacheco Pereira louva o jornalista que dá a notícia.

Honestamente não sei o que pensar.
Rui Cascao disse…
Eu disse "isto, a ser verdade...".
O que me parece é que tudo isto devia ser rigorosamente investigado.

Eu não compreendo porque é que o Estado, tendo numerosos juristas nas suas fileiras não os ocupa com estas matérias, ou porque não cria gabinetes de projecto com duração temporária para estes trabalhos. Ou ainda porque não encarrega as universidades públicas, que têm o know-how necessário para estas empreitadas (com a vantagem de assim se reforçar o investimento de investigação e desenvolvimento).

Por outro lado, penso que não se poderá ter ilusões quanto a qualquer eventual superioridade ética do PS relativamente ao PSD no que diz respeito a conflitos de interesse entre Estado/partido/pessoas ligadas ao partido/grande capital/etc.

Como o epá referiu, Guterres tentou introduzir alguma ética nesta matéria, o que não resultou. Isto porque o PS não estava preparado (e ainda hoje não está), e não estará até voltar a ter um líder com a verticalidade de Guterres.

Antes do 25 de Abril, o Estado fascista estava subordinado aos interesses dos grandes oligopólios e dos lóbis clericalistas. Depois do 25 de Abril, a um breve período em que o ciclo político foi dominado por personalidades políticas cuja integridade ética fica acima de quaisquer suspeitas (Sá Carneiro, Cunhal, Soares, Freitas do Amaral), muitos medíocres das fileiras dos partidos de Governo (PS e PSD) foram catapultados para posições-chave dentro do aparelho do Estado, nomeadamente graças ao surto de "tachos" que surgiu com as nacionalizações.

Hoje o panorama é ainda mais negro, uma vez que hoje em dia os grandes partidos são dominados por "aparatchniki", "boys" que desde a sua tenra idade foram filiados num partido, e que ao mesmo tempo nunca desenvolveram qualquer actividade profissional remunerada independentemente da política ou das influências relacionadas com a política. Penso que não será necessário referir nomes. Ora, para estes profissionais da política não à plano B fora da política, enquistando-se no aparelho do Estado, do partido, e influências conexas. Por outro lado, muitas das pessoas de craveira que poderiam apresentar uma mais-valia para a política, salvo raras e honrosas excepções, preferem manter-se na zona cinzenta da eminência parda, muitas vezes extremamente rentável.

O problema do poder nas mãos dos boys e do outsourcing parasitário de actividades do Estado não é só problema nosso- decorre em todo o mundo, em toda a Europa (em menor escala contudo nos países escandinavos).

No entanto, não se pode ficar de braços cruzados. Todos estes "outsourcings", intermediários, agentes, comissários, etc. devem ser fiscalizados, monitorizados e avaliados, e tudo o que envolve o recurso a eles (concurso, contratação, acompanhamento e avaliação) deve ser público e transparente. Para além deste caso do "especialista em direito da educação", seria ainda útil saber em que termos se tramita o pedido de pareceres a algumas sociedades de advogados, quais as vicissitudes da aquisição de material militar e a razão da inexecução das contrapartidas contratualmente estipuladas, etc.

Não sei se a peça do público é verdadeira e rigorosa, mas sabendo-se como funciona o Estado, e não havendo transparência nestes procedimentos, a suspeição é inevitável.
Rui Cascao disse…
não há plano B, queria eu dizer, perdoe-se o "lapsus calami".
Rui:

Sinto-me amargamente solidário e preocupado com o que escreveu.

Mas a torrente de lama que certa canalha lança leva-me a desconfiar de muitas notícias.

Partilho, em relação a Guterres, uma admiração sem limites pela honestidade e dedicação à causa pública. Foi o melhor primeiro-ministro de sempre e veja o que a canalha lhe fez.

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