Canavilhas "satisfeita", porquê?

A Cultura – independentemente da superestrutura que a coordena – sempre foi maltratada, neste jardim à beira mar plantado.

O Estado, nesta área, frequentemente se balanceou as "suas políticas" entre o “laissez-faire” e apoios a incitativas, projectos ou eventos de maneira esparsa, aleatória e, como se imagina, descontínua.
Concedemos que é difícil, para qualquer Governo, delinear uma “política cultural” sem – de imediato - ser acusado de dirigismo. Deste modo, a inércia cultural reinante é tentada a ancorar-se em pontuais distribuições de benesses...

No tempo do fascismo, a Cultura esteve confinada em vários antros [era um apêndice do Ministério da Educação] e a definição da sua acção era ditada por convicções políticas [situacionistas], decorrente de relações pessoais, de efemérides comemorativas ou de "paisagens" marcadas .
Os “artistas do regime”, eram poucos, arrogantes, insondáveis mas, acima de tudo, conformistas [conviviam amigavelmente com a censura] . A queda do regime salazarista ocupou-os com processos de "branqueamento" do seu passado. Pouco tempo e menos discernimento sobrou para ser dedicado à criacção.
Nestes tempos ditatoriais, as únicas ilhas de liberdade, na área da Cultura - como todos nos recordamos - gravitavam à volta da Fundação Calouste Gulbenkian [um virtual Ministério da Cultura, no fascismo]

No pós 25 de Abril havia o pressentimento de que estaria eminente uma "explosão" cultural. Largos anos de repressão cívica e social, deveriam libertar das suas entranhas muita e inovadora produção cultural. Na verdade, nada disso aconteceu. A Cultura continuou submetida a condicionalismos estruturais e submissa ao nível da superestrutura dirigente. Não explodiu, nem se engrandeceu. A carga cultural que julgávamos guardada na gavetas da História, não existia. A repressão tinha embotado as mentes e assassinado a produção cultural.

No actual regime democrático a Cultura - no nível estrutural - andou a deambular entre Secretarias de Estado e Ministérios. Conforme a direcção do vento político ou ao sabor de inclinações e diferenciações individuais.
Cabe aqui salientar que foi o VIII Governo Constitucional presidido por Francisco Pinto Balsemão o criador do 1º. Ministério da Cultura [associado à Coordenação Científica], ocupado por Francisco Lucas Pires e só no IX Governo Constitucional [1983-85], dirigido por Mário Soares, foi criado um Ministério da Cultura [strictu sensu], sob a responsabilidade de António Coimbra Martins.
Foi sol de pouca dura. O cavaquismo [1985 – X Governo Constitucional] de acordo com a dinâmica empreendorista, logo procurou despromover, politicamente, este importante sector da vida nacional [o betão era fulcral…] regressando aos Secretários de Estado. Só, dez anos depois, em 1995 António Guterres retomaria o Ministério da Cultura com António Maria Carrilho. Pelo meio, inefáveis figuras culturais como Pedro Santana Lopes, Sousa Lara, etc. …
Este sinuoso percurso de promoções e despromoções mostra o fadário da cultura neste País, num sector que, tem dificuldade em sobreviver autonomamente, recorrendo frequentemente a esquemas de subsidiodependência.

Esta introdução para chegarmos à actual Ministra Gabriela Cavanilhas uma personagem oriunda da área, pianista, docente do Conservatório Nacional de Lisboa, ex-secretária Regional da Cultura [Açores], etc.
O primeiro ano da sua tutela no Ministério da Cultura foi mais elegante, diria mesmo sedutor, do que expedito ou eficiente.
Mas, em 2010, a crise económico-financeira [e a consequente austeridade] atingiu duramente o seu Ministério. Começam, então, os problemas.
A recente demissão do Director-Geral das Artes, Jorge Barreto Xavier, veio incendiar o meio cultural onde, neste momento, se digladiam interesses constituídos [digamos institucionais] versus nascentes e inovadoras correntes nas Artes [a "lutarem" por novos estímulos e apoios financeiros].
As razões invocadas pelo demissionário centradas no campo das divergências com a Ministra "sobre o modo de desenvolvimento das políticas de apoio às artes", serão a ponta do iceberg onde jaz este ardiloso, snob, petulante e difícil Mundo da Cultura. Até aqui, nada de novo!

A grande gafe política [ e a conciliação da Arte com a Política é sempre problemática] foi a aceitação, por parte da Ministra, desta demissão, exprimindo sentimentos de satisfação. Transmitiu para o exterior a ideia que, há cerca de 1 ano, se mantém, organicamente, prisioneira de um membro da sua equipa, um "seu" subordinado [hierarquicamente falando…], que carecia de confiança política para permanecer no cargo.
Não é difícil adivinhar que nos tempos vindouros o Ministério da Cultura [...e não só por estas razões] será novamente despromovido ["reestruturado", é a gíria politiqueira], para penitência dos portugueses e eventual aviltamento da Cultura nacional.

Não havia "nexecidade"...!

Comentários

Graza disse…
É um feeling, mas o Governo ainda vai ter amargos de boca com esta Ministra. A não ser que fique sossegada para não lhe acontecer como o elefante na loja de cristais.

Há belezas que não são tão cristalinas como parecem. Aqui aconteceu qualquer coisa;
http://rendarroios.blogspot.com/2010/05/pianistas.html

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