Hollande e a UE

A ‘guarda avançada’ europeia sugerida por François Hollande para ‘governar’ a Europa link é, no momento em que surge, um facto político verdadeiramente surpreendente, representando uma ‘fuga em frente’, perante o descalabro à vista.

No plano interno, retoma as preocupações – tantas vezes esquecidas - de um francês que foi um lídimo ‘obreiro’ da ideia europeia, Jacques Delors, e assume vagas reminiscências com um remoto 'gaullismo'. Nada de 'socialismo' é vislumbrável.
Percebe-se bem a razão do tacticismo do momento. Trata-se de uma tentativa de melhorar a imagem doméstica de um presidente caído em desgraça perante os seus eleitores. Imagem que se foi degradando, entre outras coisas, pelo titubeante exercício de uma medíocre e desequilibrada co-liderança europeia (com Angela Merkel). 
Esta é uma situação que, a médio prazo, ameaça a sociedade francesa porque a cedência a políticas de austeridade faz paulatinamente o seu caminho (de progressivo empobrecimento) sob a batuta de Hollande/Valls.

A 'proposta' funciona, por outro lado, como um tampão colocado para estancar uma incoercível hemorragia. Não é líquido que tenha êxito e será preciso, nas contas a efectuar, ter em consideração situações mais recuadas como, por exemplo, o resultado do referendo francês sobre a ‘Constituição Europeia’ elaborada por (um outro político francês) Giscard d’Estaing, para perceber o equívoco desta proposta.

Quando se evocam (convocam) os países subscritores do Tratado de Roma (episódio tão longínquo das actuais políticas europeias), como uma hipotética ‘guarda avançada’ europeia, há uma lamentável confusão entre Estados e governantes. Isto é, mistura-se o que é transitório com aquilo que se apresenta perante a diversidade de povos como soberano. Interessaria saber qual foi o facto fundamental nos tempos primordiais da cooperação europeia pós II Guerra Mundial (a CEE). Resta saber se foi fundamental a convergência política dos governos de Itália, Alemanha, França, Bélgica, Holanda e Luxemburgo ou a liderança e a visão estratégica de alguns vultos políticos oriundos desses países como Monet, Spaak, Schuman, Adenauer, Gasperi, entre outros. Políticos como os atrás referidos não são comparáveis – nem de perto, nem de longe - aos actuais figurantes (Merkel, Hollande, Juncker, etc.) o que justifica o estado das coisas.
Para reduzir esta discrepância a um jargão nacional todos sabemos que que não é possível, nem aceitável, comparar um guarda-chuva com a feira de Espinho.

No plano externo, a sugestão do presidente francês é uma proposta que navega à boleia da suspensão (temporária) do Grexit.
Hollande tenta - através desta manobra - arquitectar, a partir desse facto, um modelo de governação europeia onde pretende explorar o incipiente protagonismo que terá desempenhado em relação a crise vivida pelo novo governo grego no seio do Euro Grupo. Trata-se, contudo, de um balanço efémero sob uma situação terrível que não permite qualquer tipo de alteração na liderança da Europa, nem conduzirá à alteração das suas políticas. O único rebate de mudança perceptível poderá ocorrer no interior da governação alemã, à volta de um 'desentendimento' Merkel/Schauble.
Na verdade, a resolução acordada no Conselho Europeu sobre a dramática situação grega não contem motivos de júbilo (para qualquer uma das partes) e, por outro lado, a crise europeia - entendida na sua globalidade e profundidade – não foi aí ultrapassada.

A proposta de Hollande, vista sob uma perspectiva de futuro para a Europa, é extemporânea e, acima de tudo, ambígua.
Entre uma Europa Federada, dos Estados e a dos Povos existem múltiplas nuances. E o denominador comum passará por democratizar as estruturas e instituições europeias, através de escrutínios populares, retirando poder aos burocratas e dando espaço a que surjam dirigentes europeus com estatura.
Não existem ‘malabarismos’ políticos capazes de camuflar esta realidade.

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