Marcelo ou a 'vã glória de mandar'...
A frase proferida há 2 dias por Marcelo nos Açores onde afirmou que “o Presidente da República é o ‘órgão supremo’ das instâncias políticas nacionais…link” deixa adivinhar, nas entrelinhas, uma conceção de exercício presidencial no mínimo polémica.
Não será esse o entendimento generalizado – ou até a prática – acerca do cargo que presentemente é ocupado por Marcelo Rebelo de Sousa.
Estando um pouco em desuso a denominação de ‘Chefe de Estado’, dada a usura que sofreu a designação durante a ditadura, a conceção comum é que o Presidente sendo o mais alto representante da República, é um garante da independência nacional, da unidade do Estado e do regular funcionamento das instituições democráticas. A sua cartilha é a Constituição da República Portuguesa. Ponto final.
Quando se introduz uma nova conceção e se afirma como sendo um ‘órgão supremo das instâncias políticas’, será difícil esconder o resvalar para protagonismos deslocados, quando não espúrios.
Não sendo um constitucionalista (Marcelo é-o) a presente fórmula parece carregar uma conceição pouco clara do nosso regime caracterizado como ‘semi-presidencial’. Um problema frequente das situações que não são carne, nem peixe.
A Presidência da República será – sem dúvida – um alto cargo político mas definir-se tout court como um ‘órgão supremo das instâncias políticas nacionais’, hierarquiza posições onde deve pontificar a separação de poderes e subalterniza outras funções da Presidência como a representativa e a moderadora.
Aliás - que os portugueses tenham entendido - a eleição de Marcelo Rebelo de Sousa para a Presidência não foi acompanhada pela divulgação de qualquer programa de intervenção política. A tónica foi de que a sua candidatura era independente dos ‘jogos políticos’, nomeadamente, afirmando um distanciamento de apoios partidários. Na altura de candeias às avessas com Passos Coelho, esta era a posição confortável. Hoje transparece que para além de confortável era, também, ambígua.
Ora, a assunção - no presente - de uma conceção de liderança política (‘órgão supremo!’) , isto é, armadilhando um terreno onde os partidos (políticos) assentam os seus arraiais e devem ter um espaço de protagonismo, revela-se muito pouco propicia à sua função moderadora (que deverá exercer em todos os assuntos nacionais).
Sem desvalorizar a sua persuasiva ação e presença na ‘crise dos incêndios’ muitos prefeririam que a Presidência da República ficasse pela tradicional ‘magistratura de influência’.
Por exemplo, não estará na hora de abrandar um pouco a agitação solista onde se embrenhou e endereçar uma mensagem à Assembleia da República onde explicite as suas expectativas e possibilite – para além dos repetitivos gestos afectivos - uma discussão política sobre a ‘emergência grave’ representada pelo ‘Verão incendiário’ que nos varreu o País e repetidamente tem sido objecto de perorações presidenciais ?
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