A GRIPE e a ‘CRISE’ do SNS: Do Minho ao Algarve (Guimarães, Coimbra, Viseu, lisboa, Faro, etc.)...
Chove, faz frio e as madrugadas são gélidas. Um caldo de cultura apropriado para as síndromas gripais. O SNS rebenta pelas costuras. Mas há quem queira aproveitar-se da situação. Para fins corporativos.
Na realidade, o SNS está a sentir – ao retardador – os efeitos dos cortes impostos pela Troika e pressurosamente adotados pelo governo PSD/CDS. Quer o desinvestimento orçamental, quer o abandono da inovação, quer o estimulo ao êxodo dos profissionais de saúde não têm consequências imediatas. Só pontualmente, isto é, nas situações de maior stress da procura o sistema público de saúde exibe claramente as suas insuficiências.
Resumir tudo a uma questão de recursos humanos e, dentro desta visão limitada, reduzir as questões a um sector profissional não é propriamente lutar pelo SNS. Será antes aproveitar-se de uma situação concreta que estruturalmente aflige o SNS.
Os profissionais de saúde são o motor do SNS mas este não se resume a isso. A capacidade instalada degradou-se. A motivação esfumou-se. O voluntarismo esvaneceu-se. E o cansaço acumulou-se.
A primeira machadada no SNS foi desferida quando da revisão constitucional de 1989, se transformou a gratuitidade matricial e original que informa a Lei 56/79 de 15 de setembro, num vago e indefinido conceito de ‘tendencialmente gratuito’. Aliás, quando o PSD, em 2010, elaborou - na infindável deriva neoliberal - um projeto de revisão da Constituição propõe a eliminação do 'tendencialmente gratuito' e às características universais do serviço público (que não teve a coragem de eliminar) acrescentou uma indefinida e vazia classificação de ‘geral’.
Mas, apesar disso, o SNS teima em resistir, em sobreviver e continua a ocupar um espaço insubstituível no sector social o que origina por parte de alguns protagonistas políticos malabarismos verbais e de retórica absolutamente inacreditáveis. Uma coisa é certa: os danos causados pelo anterior Governo à sombra de cortes cegos justificados pela tentativa de redução sem critério, nem justificação do Estado, vão perdurar e demorar muito tempo a reparar. Iludir esta questão com acidentes casuísticos do momento é tentar tapar o sol com uma peneira.
Na verdade, todos sabemos que será necessário investir mais no SNS, dotá-lo de mais meios orçamentais (acabar com o subfinanciamento), reequipá-lo, modernizá-lo, desenvolver as atividades formativas, adequar os recursos humanos à dimensão da resposta, enfim, restituir um nível de operacionalidade que, em tempos, já teve.
Esta tarefa não é apanágio de uma qualquer classe profissional. É uma tarefa de todos, nacional. Melhores condições de resposta e de empregabilidade já existiram no passado apesar da ausência no terreno da Ordem dos Enfermeiros. Uma Ordem não é, nem se resume a, uma agência de colocação de profissionais. Nem gravita à volta de questões e atitudes sindicais.
A onda de denúncias que neste momento é lançada sobre os cidadãos não é uma coincidência temporal, nem traduz uma manifestação de inocência política. É o oportunismo de querer chegar cedo (antes do tempo e da planificação) que pretende inserir-se numa enviesada campanha, absolutamente deletéria, para a consolidação do Estado Social.
O SNS não é mais um mercado a pontificar, mesmo para aqueles que tem sensibilidade e levam em conta as particularidades do campo social.
Deve ser, acima de tudo, uma indispensável prestação social, relevante, equitativa e universal. Um pilar do Estado Social e um instrumento de coesão nacional. Num momento em que - à custa da Esquerda, convém não omitir - existe uma recuperação de rendimentos dos cidadãos, um razoável crescimento económico e se ultrapassou a saga persecutória da função pública (como estrato social privilegiado no entender do Governo PSD/CDS) a regra não poderá ser: sentei-me à mesa (do Orçamento) primeiro e por isso tenho direito ao maior quinhão.
Aqueles que colaboraram, quer pelo silêncio, quer ativamente, no denegrir dos trabalhadores da função pública, apresentando-os como sendo uns ‘gigolos’ sociais e predadores orçamentais, a farda de paladinos defensores dos serviços públicos (seja o SNS, seja a Segurança Social, sejam outros), assenta-lhes mal. É mais uma manifestação de falsidade, de embuste, do que outra coisa.
O zelo exibido pela bastonária da Ordem dos Enfermeiros, Ana Rita Cavaco, não é verdadeiro, nem confiável. Nem poderia ser. Quando muito será uma excrescência profissional de convicções políticas. As funções partidárias que exerce (Conselho Nacional do PSD) toldam-lhe a razão e está nitidamente a fazer alinhar uma ‘corporação profissional’ na chicana política que a Direita tece sobre o SNS.
A mesma Direita que votou contra a Lei de Bases do SNS (Lei 157/I de 1979) e que agora usa todos os subterfúgios ‘liberalizantes’ para perverter o caracter público e universal do SNS é bem conhecida dos portugueses.
Mais, denegrir a capacidade de resposta (difícil e incompleta, sem dúvida) com o fito de hipotecar esta prestação pública aos serviços de saúde privados, isto é, ‘consagrar’ o mercado da saúde. A mesma Direita oculta esta ‘solução, este ‘desastre’ (social e político) mas sabe que se vier um dia a acontecer a catástrofe (que intimamente deseja) a primeira coisa que o sector privado fará é uma ‘reestruturação’ dos serviços. E, como os profissionais de saúde bem sabem um dos pratos fortes deste tipo de reestruturações, gizados sob a batuta de lídimos gestores e volúveis administradores, são os despedimentos.
Mais, denegrir a capacidade de resposta (difícil e incompleta, sem dúvida) com o fito de hipotecar esta prestação pública aos serviços de saúde privados, isto é, ‘consagrar’ o mercado da saúde. A mesma Direita oculta esta ‘solução, este ‘desastre’ (social e político) mas sabe que se vier um dia a acontecer a catástrofe (que intimamente deseja) a primeira coisa que o sector privado fará é uma ‘reestruturação’ dos serviços. E, como os profissionais de saúde bem sabem um dos pratos fortes deste tipo de reestruturações, gizados sob a batuta de lídimos gestores e volúveis administradores, são os despedimentos.
Não vale a pena alimentar ilusões. O aparente surgimento de uma legião de inusitados ‘cristãos novos’, i. e., o PSD e o CDS apresentados como paladinos de um serviço público capaz e operativo, mostra que estes não se tendo reconvertido, nem rendido, às virtualidades do SNS o usam como arma de arremesso político com a pior das intenções: substituí-lo pelo cardápio liberal onde pontificam os cuidados privados, as seguradoras e as leoninas contratualizações (parcerias) público-privadas (PPP).
É nesta encruzilhada que nos encontramos!
O ‘barulho’ que se ouve – com algumas razões objetivas para lhe dar alguma credibilidade - pretende (tão somente) esconder a realidade (política e social) que lhe está subjacente.
Comentários
Mas cuidado com as generalizações: é tão errado « denegrir dos trabalhadores da função pública, apresentando-os como sendo uns ‘gigolos’ sociais e predadores orçamentais...» como sugerir que são uns "santos" aos quais nenhum "pecado" há a apontar. No caso do SNS, não faltam disso excelentes maus exemplos, com a promiscuidade entre publico e privado que é apanágio do excelentissimo corpo clinico no topo da lista.
Não pretendi generalizar nem apresentar os profissionais de saúde como sendo uns 'santos'. Até porque não acredito em 'santos', nem nas relações humanas e muito menos em conjeturas transcendentais (divinas).
Os 'maus exemplos' existem, devem ser denunciados e combatidos nas sedes próprias comos métodos que a Justiça disponibiliza e proporciona.
Mas a verdade é que os 'maus exemplos' não são apanágio da função pública fazendo, como sabemos, parte da condição humana.
Nas questões institucionais - como é o SNS - são ocorrências acidentais e comprometem, em primeiro lugar, o(a) prevaricador(a) não devendo envolver - por simples mecanismo de arrasto - a Instituição.
Pior do que os 'maus exemplos' é o estafado slogan, que ainda comove incautos, de que tudo o que é público é mau (e mal gerido) e o que é privado é bom (independentemente da qualidade de gestão).
O que se passa hoje nos CTT é um 'bom exemplo' dessa falácia.