Para que serve uma primeira-dama?

A existência de uma primeira-dama, numa República, é um anacronismo que diminui a indeclinável igualdade de género e um fenómeno que alimenta as revistas cor-de-rosa onde a ociosidade de princesa prevalece sobre a dignidade profissional da mulher. É um resquício monárquico preservado como adereço de presidentes e primeiros-ministros em viagens de Estado ou como electrodoméstico para cuidar do marido nas deslocações internas.

Seja como instrumento de propaganda, ou como hábito, é maior a humilhação do que a glória e o paradigma obsoleto destrói o exemplo de mulher moderna e emancipada de que precisam os povos habituados a sistemas patriarcais e tradições misóginas.

Lamento que Portugal, há quatro anos, não tenha encontrado uma mulher para candidata às eleições presidenciais, não faltando mulheres cultas, inteligentes e bem preparadas que teriam exercido o cargo com dignidade.

A eleição de uma mulher simbolizaria, no exercício da mais alta magistratura da nação, o carácter emblemático da igualdade de género, quando já ninguém duvida da qualidade com que as mulheres exercem cargos de topo na magistratura e na diplomacia, funções que a ditadura lhes negava.

A qualidade da democracia também se avalia pela igualdade entre homens e mulheres. A discriminação é intolerável e a existência de uma primeira-dama só contribui para a perpetuação de uma simbologia em que à mulher está reservado um papel subalterno.

Não importa que os EUA e o Reino Unido, ou mesmo a França, sejam os campeões do mau exemplo. A emancipação feminina não se compadece com papéis que o progresso e a civilização tornaram anacrónicos.

Ponte Europa / Sorumbático

Comentários

e-pá! disse…
“ALWAYS PRESENT, NEVER THERE”…


A noção de “primeira-dama” parece ter nascido nos EUA, i. e., no novo Mundo, provavelmente, como contra-ponto às prepotências e arrogâncias das realezas europeias, que nunca foram vistas com bons olhos no “novo Continente”.
Mesmo assim, existem vozes discordantes na “cultura yankee”, como por exemplo, Jacqueline Kennedy [que viveu longa temporada na Europa], ao chegar à Casa Branca, na qualidade de mulher de JF Kennedy, afirmou detestar o epíteto de "First Lady", dizendo lhe soava a nome de cavalo…

Na velha Europa, até meados do séc. XX, as esposas dos presidentes tinham um papel discreto, participando nas recepções oficiais no Palácio [sim porque a residência oficial é sempre um Palácio] onde estava sediada a Presidência.
A progressiva emancipação da mulher e a sua entrada em força no mercado de trabalho, trouxeram, por arrasto, uma maior intervenção das esposas dos presidentes - muito embora algumas delas tenham abdicado das suas profissões – e, por regra, ocupavam-se de intervenções [geralmente simbólicas] na área social, da benemerência… [inclusive invadindo o mundo povoado por socialite’s].

Hoje, o papel de “primeira-dama” foi objecto de algumas perversões evolutivas. Tanto poderá ser um trampolim para sucessões “dinásticas” [como se verificou com Isabel Perón, Cristina Kirchner, etc.] ou, então, estará subordinado a motivações mediáticas [caso de Bruna Bruni, etc.].

Em Portugal, ao que julgo, a “primeira-dama” tem uma existência – no terreno oficial – meramente protocolar [figura na regulamentação do protocolo de Estado], como acompanhante do(a) titular do órgão de soberania, devendo o(a) cônjuge ser expressamente convidado(a) para esse acto público.
A imagem de “excesso de zelo, inusitado intervencionismo e de frenético fervor religioso” que a actual “primeira-dama” transmitiu ao país, durante a recente visita de Bento XVI, deverá levar-nos a questionar se tal postura se enquadra dentro dos princípios republicanos que devem nortear o comportamento público de uma “primeira-dama”.
Na verdade, julgo que os(as) cônjuges de altas entidades eleitas, não devem poder representá-las, nem substituí-las, porque, creio que a representatividade de uma eleição pelo sufrágio popular não pode ser equiparada a um contrato social celebrado entre dois cidadãos. Uma coisa é o Povo enquanto entidade colectiva e soberana que diz respeito à “res publica, outra será o núcleo familiar, naturalmente privado, íntimo.

Na verdade, apesar de ser uma expressiva [e assertiva] definição [oriunda de um reino pejado de rituais protocolares], foi o marido de uma [ultra] conservadora primeira-ministra inglesa, Dennis Thatcher, quem melhor definiu o papel de cônjuge de um representante eleito para um alto cargo público: "always present, never there".
Neste estrito pormenor […e só neste] - completamente de acordo!
e-pá! disse…
Errata:

Onde se lê:

"...ou, então, estará subordinado a motivações mediáticas [caso de Bruna Bruni, etc.]."

deverá ler-se:

"...ou, então, estará subordinado a motivações mediáticas [caso de Carla Bruni, etc.]".
ana disse…
Esta, coitada, é patética. De tão ridícula, faz pena. Devia dedicar-se apenas à sua colecção de presépios e a dar catequese aos netinhos.

Mensagens populares deste blogue

Divagando sobre barretes e 'experiências'…

26 de agosto – efemérides