Praxes vão a tribunal


As praxes violentas colocam-se ao nível dos touros de morte, em Barrancos. Talvez um deputado aficionado, faça agora uma proposta de lei para legalizar praxes violentas nas universidades onde se realizem, há mais de um lustro, ininterruptamente, e sempre com estudantes estropiados. O respeito pela tradição é o orgulho de muitos e a desgraça de alguns.

Os movimentos saudosistas não se convencem pela inteligência, basta-lhes o argumento da tradição. Não apelam ao intelecto, satisfazem as bizarrias herdadas por gerações que se deleitaram a humilhar os outros, a satisfazer instintos primários e a divertirem-se à custa do sofrimento alheio.

Em 2001 morreu um aluno de Famalicão, em 2007 ficaram incapacitados dois. Umas vezes é a coragem solitária de uma vítima, outras a tragédia devastadora a que conduziu a brincadeira, que trazem à luz do dia uma tradição de violência e boçalidade mantida no mutismo e conivência do espaço universitário.

Todos sabem, e alguns patifes acham graça, das humilhações sofridas por adolescentes do sexo feminino vítimas da imaginação perversa de alguns «doutores».

Hoje vão a tribunal alguns presumíveis meliantes. Até trânsito em julgado são inocentes mas se, por ironia do destino, se fizer prova que os incrimine, que não trema, ao lavrar a sentença, a mão do meritíssimo juiz.

É a primeira vez que, em Portugal, alguém responde por um crime de praxe, cinco anos depois dos acontecimentos. Não são apenas seis os arguidos que vão sentar-se no banco dos réus, é a praxe que vai ser julgada.

Comentários

Anónimo disse…
Este é um tema e um post de encher chouriços...o que a juventude carece, é de esperança no futuro, de formação capaz e de emprego.

Não é produzindo licenciados a granel...para ganharem, o ordenado minimo, que o país vai para a frente.

Pior, estão os milhares e milhares de licenciados que nem emprego conseguem ter.
RJ disse…
Quem tenha dois dedos de testa sabe que não é assim que se recebe um colega novo. Uma alternativa sem as brincadeiras de praxe penso que não terá tanta piada, pois o "doutor" perde a sua autoridade.

Se os jovens saíssem do secundário com alguma cabecinha, aposto que grande parte disto não se passava, tanto da parte dos caloiros em não se deixarem humilhar como da parte dos "doutores" nas práticas impostas.
Muitos dos maiores idiotas (nem todos) que praxam nunca foram ninguém na vida e veêm-se pela primeira vez numa posição superior.
A palavra passa de ano para ano.
Os caloiros que foram praxados no ano anterior resolvem ir praxar no ano seguinte em conformidade com o que lhes fizeram. Tudo em nome da tradição, quase de maneira inconsciente.

Atenção que nem tudo é mau nas tradições académicas. Há coisas "saudáveis" e abusos, há a Praxe e as praxes, há a camaradagem e a estupidez.

Esperemos que este julgamento "crie jurisprudência" neste assunto e que acalme certas e determinadas tradições estúpidas. São todos responsáveis, desde os autores das brincadeiras às pessoas que gerem os estabelecimentos de ensino superior.
ana disse…
Espero que desta vez alguém tenha a inteligência e serenidade necessárias para punir estes complexados, que se servem dos seus pequeninos e transitórios poderes para humilhar os mais fracos, muitas vezes com consequências dramáticas.

Anónimo:
"Não é produzindo licenciados a granel...para ganharem, o ordenado minimo, que o país vai para a frente.
Pior, estão os milhares e milhares de licenciados que nem emprego conseguem ter."

Combatendo o negócio das privadas e a vaidade dos pais, que querem filhos licenciados em qualquer coisa, desde que sejam drs, talvez haja menos licenciados a granel, sem preparação para coisa alguma.E com a classe de "empresários" que temos, não vejo que caminhemos para outra coisa que não seja o abismo.
Anónimo disse…
Honro-me de pertencer a uma geração que, por volta de 1969, aboliu a praxe em Coimbra.
Lembro-me de que há uns anos, houve um colóquio na TV, em que interveio Manuel Serrão, defendendo a praxe, e criticando os outros intervenientes, que a atacavam, por estes defenderem a irreverência de esquerda e não admitirem a irreverência de direita, que seria justamente a praxe. Esta afirmação é notável e inteligente: a praxe é realmente a "irreverência" da direita. Enquanto a irreverência de esquerda visa os que estão por cima, os mais fortes -professores, governantes, e outros poderosos - a "irreverência" da direita visa humilhar os mais fracos, pisar quem está por baixo.
Os praxistas de hoje dão razão a Vicente Jorge Silva, quando num célebre editorial falou de uma "geração rasca". Os praxistas de hoje são os exemplares mais típicos desse carácter "rasca".
Anónimo disse…
Esqueci-me de assinar o comentário anterior, o que faço agora: António Horta Pinto
É que não me entendo com as novas formas de assinar.
Anónimo disse…
Honro-me de pertencer a uma geração que, por volta de 1969, aboliu a praxe em Coimbra.
Lembro-me de que há uns anos, houve um colóquio na TV, em que interveio Manuel Serrão, defendendo a praxe, e criticando os outros intervenientes, que a atacavam, por estes defenderem a irreverência de esquerda e não admitirem a irreverência de direita, que seria justamente a praxe. Esta afirmação é notável e inteligente: a praxe é realmente a "irreverência" da direita. Enquanto a irreverência de esquerda visa os que estão por cima, os mais fortes -professores, governantes, e outros poderosos - a "irreverência" da direita visa humilhar os mais fracos, pisar quem está por baixo.
Os praxistas de hoje dão razão a Vicente Jorge Silva, quando num célebre editorial falou de uma "geração rasca". Os praxistas de hoje são os exemplares mais típicos desse carácter "rasca".
António Horta Pinto
Anónimo disse…
"É a primeira vez que, em Portugal, alguém responde por um crime de praxe, cinco anos depois dos acontecimentos. Não são apenas seis os arguidos que vão sentar-se no banco dos réus, é a praxe que vai ser julgada."

Permita-me discordar, eventualmente poderão ser julgados por um dos seguintes crimes:

coacção, sequestro,ameaça,ofensa à integridade fisica, mas nunca pelo crime de praxe!

1º porque o crime de praxe ao que julgo saber não está tipificado ( nullum crime sine lege).

2º depois o que supostamente foi feito não foi praxe ( foram eventualmente práticas sádicas que estão tipificadas no codigo penal). Por isso é que foram a tribunal.

3º A praxe exige o conluio e assentimento de todos os envolvidos (o consentimento em alguns crimes exclue a ilicitude ou a culpa.)

A praxe não é um argumento politico que distinga esquerda de direita, barbaros de civilizados.

A praxe é uma singela brincadeira entre jovens, uma forma de integração ( se um qualquer selvagem trajado assassinar um colega de curso, ninguem se lembrará de lhe chamar praxe pois não?, então porque razão quando se praticam outros crimes se lhe chamam praxe?)

Mais, todas as profissões têm as suas praxes, não é só os estudantes.

Por favor não se confunda as estações, a Praxe vem de Praxis - Prática, e tal como o nome indica é uma iniciação a algo. Quando toma alguns contornos deviam sem alegorias ou metáforas que a ser compreendidas ajudariam os neófitos num "Novo Mundo" onde se vão situar e ter de agir.

Penso que em 1969 o luto académico e consequente abolição da praxe, foi por outras razões e que à data se justificavam e teve as repercussões que todos conhecemos.
Mas foi há 40 anos num contexto politico-social muito diferente. Nenhuma "viuva" é tão saudosita que fique de luto 40 anos, por isso a Academia e bem ( a meu ver) levantou esse luto.

nenhuma brincadeira entre estudantes que sejam susceptiveis de configurar factos tipicos ilicitos objectivos podem ser designados por praxe ( aqui talvez os "codigos de praxe" tenham de ser alterados!!). As praxes têm de ter como limite o socialmente aceitável e condutas que não sejam susceptiveis de conduzir a ilicitos criminais.

Praxei ( e em consciência sei que não abusei nem zombei dos meus caloiros, brinquei sempre muito àquem do que é permitido pelo "código da praxe", porque sempre entendi que acima desse livrito estavam as lei da República).

Fui praxado ( brincaram comigo na exacta medida até onde achei que não me beliscavam minimamente a minha dignidade...e gostei!!).

P.s. VJS chamou à minha geração rasca, pois retribuindo-lhe o mimo, mais rasca foi a geração dele que não soube ou não quis trasmitir à minha geração axiomas éticos, pois foi a geração dele que nos fez vir a este mundo e que nos educou!
RJ disse…
"As praxes têm de ter como limite o socialmente aceitável e condutas que não sejam susceptiveis de conduzir a ilicitos criminais."

Ao Anónimo do comentário anterior,

A sua frase faz sentido, mas infelizmente o nome "praxe" está associado a práticas quase bárbaras e é usado pela comunicação social como metáfora para todas os rituais de boas vindas aos caloiros.
O problema está (principalmente) em alguns institutos cujas tradições são susceptíveis de violar o código penal.

E no meio de isto tudo saliento o facto do "consentimento" do caloiro nem sempre ser sincero. O medo de não se integrar, de ser enxovalhado ou de represálias leva a que muitos não se manifestem contra estas práticas, apesar de não acharem piada. E os que praxam claro, abusam.
E sei eu que a maioria dos praxistas tem perfeita consciência do que faz.
Unknown disse…
Este comentário foi removido pelo autor.

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