Moções & Emoções...
O Bloco de Esquerda [BE] anunciou no último debate parlamentar – depois de desafiar José Sócrates a apresentar uma moção de confiança na AR – que, no dia 10 de Março, apresentaria uma moção de censura ao Governo. E explicou porque datou esta moção. O PR toma posse a 9 de Março passando, a partir desse dia, a exercer a plenitude das suas competências constitucionais. Isto significa que o BE pretende credibilizar a sua moção carregando-a com todas as consequências políticas, i. e., provocar a queda do Governo e Eleições Legislativas antecipadas.
Este anúncio caiu de supetão na AR. Desencadeou uma imediata reacção do 1º. Ministro, na própria AR, resposta que começou com sorrisos nos lábios para acabar com um tom de alguma altercação.
Todavia, este arremedo político tem, por detrás, alguma história. Na verdade, há cerca de uma semana, o PCP, pela voz do seu secretário-geral, Jerónimo de Sousa, tinha aventado a hipótese de apresentar uma moção de censura ou, então votar favoravelmente qualquer moção de censura, mesmo vinda da Direita. Passados alguns dias, na Madeira, faria um recuo a esta posição e a sugestão, publicamente enunciada, seria encaminhada para o Comité Central. A hipótese de esta posição ser interpretada como um bónus à Direita e, mais importante ainda, ficar dependente da sua agenda política [da Direita], levaria o PCP a deixar em banho-maria o despoletar de uma crise política. O PCP, por outro lado, não tem por hábito correr atrás de foguetes, devendo estes processos ser longamente planeados e amadurecidos. Quando optasse por apresentar uma moção de censura, esta deveria surgir em momento próprio e uma vez criado o clima propício. E, a agenda dos comunistas passaria, obrigatoriamente, pela criação de condições objectivas que afastassem o espectro de ser penalizado por uma atitude voluntariosa que acabaria por favorecer o Centro-Direita. Assim, o PCP, a apresentar uma moção de censura, fazia-o antes de Outubro – quando é previsível em tempos de decisões orçamentais a Direita avançar – mas sempre depois do 1º de Maio, altura em que prevê que a crispação social e a contestação política atinjam um ponto alto.
Toda esta dialéctica política e o evidente enredo táctico do PCP, perturbou o BE e levou-o a, apressadamente [para não dizer precipitadamente], avançar com o anúncio da referida moção para daqui a 1 mês [logo após a posse do PR]. Esta situação tem sido interpretada como uma competição no espectro político à esquerda do PS e caracterizada como uma disputa em busca de protagonismo político. Mas foi pior do que isso: o BE acabou, com alguma ligeireza, por concertar-se com uma obscura agenda de poder que mistura as aspirações do Centro-Direita com a reeleição de Cavaco Silva.
A moção a apresentar pelo BE não deve ser – como foi – classificada como “irresponsável”. Na realidade ela não deixa de ser coerente com a carga ideológica e doutrinária e a praxis desta formação política. Embora represente um incómodo em relação às soluções encontradas [definidas pelo PS/PSD mas assumidas isoladamente pelo PS] para enfrentar a crise, a oposição às medidas de tomadas [austeridade, contenção orçamental e estagnação do investimento público] é legítima. Existem, em relação à actual crise, leituras díspares e, consequentemente, liberdade de pensar outras propostas, tomar posições políticas de repúdio ao modelo actual. As políticas engendradas para responder à crise sendo, em larga medida, concertadas no seio da UE, são vistas pelo BE como uma deriva neoliberal, dada a preponderância de Governos conservadores nos Estados europeus, bem como das estruturas partidárias transnacionais como, p. exº., o Partido Popular Europeu que domina o Parlamento Europeu e a Comissão Europeia.
É neste quadro que deve ser avaliada a posição do BE que, de certo modo, é uma reacção primária a um novo pacote de medidas ditas “estruturantes” [a proposta Merkel/Sarkosy no último Conselho Europeu], como moeda de troca para o reforço dos Fundos de resgate europeus [Fundo de Estabilização Europeu].
Claro que a situação do País é grave em termos económicos e financeiros e a iniciativa do BE será – pelos "situacionistas" – considerada como inoportuna. Em política, uma coisa é a oportunidade e outra será a responsabilidade. O regime democrático sai lesado na sua capacidade de gerar soluções [na sua “democraticidade”] quando o confronto de posições, de ideias, ou simples enunciado de políticas alternativas é, de imediato, apodado de “calamitosa irresponsabilidade”.
Em suma, a política é feita por homens e mulheres, enfim, seres humanos com convicções, emoções, certezas, dúvidas, rejeições, adopções, etc..
É neste sentido que, o anúncio do voto de censura pelo BE não deve ser considerado uma irresponsabilidade [mormente para os preponentes]. Pode ser, para os visados ou, transpondo para o âmbito nacional, para o País, politicamente inoportuno. Mas mal de um País que não suporta este tipo de confrontos que são a essência do regime, em nome de uma imagem a exportar para a Europa ou para o Mundo. De facto, ninguém sabe onde residem os mercados e em que terreno atacam os especuladores.
Feita esta longa ressalva, o voto de censura agendado pelo BE veio revelar outros factos menos visíveis. E um deles, que tem sido pouco referido, foi a notória incapacidade do PSD em reagir a um novo facto político, não agendado, imprevisto. Surpreendido - como muitos outros - enquistou-se e entrou em súbita hibernação caucionando esta posição no dilatado tempo que mediará entre o anúncio e a apresentação formal do voto de censura. Anuncia que vai estudar os termos concretos da moção, refugia-se em formalismos. As razões do voto de censura não diferem da prática política do BE, ao longo do último decénio. Mas para ganhar tempo finge não perceber. Entretanto, na ribalta política, agitam-se as vozes de barões, escudeiros e peões de brega, oscilando entre um aproveitamento da situação criada pelo BE ou na sua rejeição em nome princípios éticos, de distanciamentos partidários, do “interesse nacional”, etc. De facto, a moção pode não ser só inoportuna para o País, será também para a agenda de tomada do Poder, desenhada pelos estrategas do PSD. Veio cedo demais. Foi extemporânea. Embora desfrutem de boas projecções nas sondagens não estão preparados para assumir responsabilidades e consequências da governação. A táctica do momento é endossar o ónus para o PS. É, ainda, cómodo ficar na Oposição.
De resto, a moção de censura não terá resultados práticos para o Governo ou para o País, além de provocar o reacendimento do debate político e partidário. Os dirigentes políticos sabem isto, o PR idem e, os mercados, também. Dramatizar é que pode prejudicar os portugueses.
Toda a gente sabe que o PSD vai enveredar pelo corriqueiro: “não me comprometam...”. E, pomposamente, em nome do interesse nacional, da estabilidade, da responsabilidade, vai abster-se. Tem sido assim desde que Passos Coelho dirige o partido. A regra é abster-se em questões fulcrais e politicamente delicadas e, no momento, vir para a praça pública cantar loas que foi o grande facilitador para, no dia seguinte, branquear prévios compromissos, pedir desculpas ou, simplesmente, pôr-se de fora.
Até quando? Com certeza que até à discussão do OE de 2012. Essa é a sua agenda política há muito denunciada. Na verdade, o suspense dura há mais de um mês. Persiste desde as eleições para a presidência da República.
Este anúncio caiu de supetão na AR. Desencadeou uma imediata reacção do 1º. Ministro, na própria AR, resposta que começou com sorrisos nos lábios para acabar com um tom de alguma altercação.
Todavia, este arremedo político tem, por detrás, alguma história. Na verdade, há cerca de uma semana, o PCP, pela voz do seu secretário-geral, Jerónimo de Sousa, tinha aventado a hipótese de apresentar uma moção de censura ou, então votar favoravelmente qualquer moção de censura, mesmo vinda da Direita. Passados alguns dias, na Madeira, faria um recuo a esta posição e a sugestão, publicamente enunciada, seria encaminhada para o Comité Central. A hipótese de esta posição ser interpretada como um bónus à Direita e, mais importante ainda, ficar dependente da sua agenda política [da Direita], levaria o PCP a deixar em banho-maria o despoletar de uma crise política. O PCP, por outro lado, não tem por hábito correr atrás de foguetes, devendo estes processos ser longamente planeados e amadurecidos. Quando optasse por apresentar uma moção de censura, esta deveria surgir em momento próprio e uma vez criado o clima propício. E, a agenda dos comunistas passaria, obrigatoriamente, pela criação de condições objectivas que afastassem o espectro de ser penalizado por uma atitude voluntariosa que acabaria por favorecer o Centro-Direita. Assim, o PCP, a apresentar uma moção de censura, fazia-o antes de Outubro – quando é previsível em tempos de decisões orçamentais a Direita avançar – mas sempre depois do 1º de Maio, altura em que prevê que a crispação social e a contestação política atinjam um ponto alto.
Toda esta dialéctica política e o evidente enredo táctico do PCP, perturbou o BE e levou-o a, apressadamente [para não dizer precipitadamente], avançar com o anúncio da referida moção para daqui a 1 mês [logo após a posse do PR]. Esta situação tem sido interpretada como uma competição no espectro político à esquerda do PS e caracterizada como uma disputa em busca de protagonismo político. Mas foi pior do que isso: o BE acabou, com alguma ligeireza, por concertar-se com uma obscura agenda de poder que mistura as aspirações do Centro-Direita com a reeleição de Cavaco Silva.
A moção a apresentar pelo BE não deve ser – como foi – classificada como “irresponsável”. Na realidade ela não deixa de ser coerente com a carga ideológica e doutrinária e a praxis desta formação política. Embora represente um incómodo em relação às soluções encontradas [definidas pelo PS/PSD mas assumidas isoladamente pelo PS] para enfrentar a crise, a oposição às medidas de tomadas [austeridade, contenção orçamental e estagnação do investimento público] é legítima. Existem, em relação à actual crise, leituras díspares e, consequentemente, liberdade de pensar outras propostas, tomar posições políticas de repúdio ao modelo actual. As políticas engendradas para responder à crise sendo, em larga medida, concertadas no seio da UE, são vistas pelo BE como uma deriva neoliberal, dada a preponderância de Governos conservadores nos Estados europeus, bem como das estruturas partidárias transnacionais como, p. exº., o Partido Popular Europeu que domina o Parlamento Europeu e a Comissão Europeia.
É neste quadro que deve ser avaliada a posição do BE que, de certo modo, é uma reacção primária a um novo pacote de medidas ditas “estruturantes” [a proposta Merkel/Sarkosy no último Conselho Europeu], como moeda de troca para o reforço dos Fundos de resgate europeus [Fundo de Estabilização Europeu].
Claro que a situação do País é grave em termos económicos e financeiros e a iniciativa do BE será – pelos "situacionistas" – considerada como inoportuna. Em política, uma coisa é a oportunidade e outra será a responsabilidade. O regime democrático sai lesado na sua capacidade de gerar soluções [na sua “democraticidade”] quando o confronto de posições, de ideias, ou simples enunciado de políticas alternativas é, de imediato, apodado de “calamitosa irresponsabilidade”.
Em suma, a política é feita por homens e mulheres, enfim, seres humanos com convicções, emoções, certezas, dúvidas, rejeições, adopções, etc..
É neste sentido que, o anúncio do voto de censura pelo BE não deve ser considerado uma irresponsabilidade [mormente para os preponentes]. Pode ser, para os visados ou, transpondo para o âmbito nacional, para o País, politicamente inoportuno. Mas mal de um País que não suporta este tipo de confrontos que são a essência do regime, em nome de uma imagem a exportar para a Europa ou para o Mundo. De facto, ninguém sabe onde residem os mercados e em que terreno atacam os especuladores.
Feita esta longa ressalva, o voto de censura agendado pelo BE veio revelar outros factos menos visíveis. E um deles, que tem sido pouco referido, foi a notória incapacidade do PSD em reagir a um novo facto político, não agendado, imprevisto. Surpreendido - como muitos outros - enquistou-se e entrou em súbita hibernação caucionando esta posição no dilatado tempo que mediará entre o anúncio e a apresentação formal do voto de censura. Anuncia que vai estudar os termos concretos da moção, refugia-se em formalismos. As razões do voto de censura não diferem da prática política do BE, ao longo do último decénio. Mas para ganhar tempo finge não perceber. Entretanto, na ribalta política, agitam-se as vozes de barões, escudeiros e peões de brega, oscilando entre um aproveitamento da situação criada pelo BE ou na sua rejeição em nome princípios éticos, de distanciamentos partidários, do “interesse nacional”, etc. De facto, a moção pode não ser só inoportuna para o País, será também para a agenda de tomada do Poder, desenhada pelos estrategas do PSD. Veio cedo demais. Foi extemporânea. Embora desfrutem de boas projecções nas sondagens não estão preparados para assumir responsabilidades e consequências da governação. A táctica do momento é endossar o ónus para o PS. É, ainda, cómodo ficar na Oposição.
De resto, a moção de censura não terá resultados práticos para o Governo ou para o País, além de provocar o reacendimento do debate político e partidário. Os dirigentes políticos sabem isto, o PR idem e, os mercados, também. Dramatizar é que pode prejudicar os portugueses.
Toda a gente sabe que o PSD vai enveredar pelo corriqueiro: “não me comprometam...”. E, pomposamente, em nome do interesse nacional, da estabilidade, da responsabilidade, vai abster-se. Tem sido assim desde que Passos Coelho dirige o partido. A regra é abster-se em questões fulcrais e politicamente delicadas e, no momento, vir para a praça pública cantar loas que foi o grande facilitador para, no dia seguinte, branquear prévios compromissos, pedir desculpas ou, simplesmente, pôr-se de fora.
Até quando? Com certeza que até à discussão do OE de 2012. Essa é a sua agenda política há muito denunciada. Na verdade, o suspense dura há mais de um mês. Persiste desde as eleições para a presidência da República.
Comentários
sobre uma simples moção de censura neste momento, e neste país...
mas defeito é meu de certeeza...
abraço
político tem emoções?
só das mais primárias
Para complementar o que pretendi dizer no post sugeria a leitura da notícia do JPúblico, de hoje, referente a este assunto. link
Na verdade o post é demasiado extenso mas não tive nem engenho nem arte para sintetizá-lo, pelo que me penitencio dessa inabilidade.
Estou completamente de acordo que uma moção de censura, aliás inconsequente, não deveria levantar tanta celeuma política. Mas na realidade está a levantar.
Ontem, o congresso “Novas Fronteiras” organizado pelo PS, no Centro de Congressos de Lisboa, foi dominado [e inquinado] por esta questão…
1. Desculpe, se calhar fui brusco minha analise e escrita.
agradeço link enviado.
2. Quanto esta questão do BE em si mesma, e da respectiva moção censura
acho que PS aproveita (e bem...) ocasião - outros puseram-se a jeito...
e contrataca PSD no seu oportunismo de sempre, evidenciado por aquelas, e a Outra, cabecinhas pensadoras na antecipação de permanentes crises,
residualmente o BE que tem feito seu grande objectivo, a dividisão do PS
3. Suponho que ira ficar isolado na sua moção, o que sera uma estrondosa derrota daquela deliquencia intelectual
abraço, desculpe e obrigado seu tratamento amigo
Esta moção de censura assume, assim, o aspecto de quem quer limpar a face.
Por mim, todos três (Alegre, Louçã e Sócrates) podem bem limpar as mãos à parede.
E o PCP (se prepara a cama para o regresso ao poder do PSD e do CDS), também.