O Vaticano, o Papa e a tradição
O Vaticano
recusou informações a uma comissão da ONU sobre investigações internas de
abusos sexuais de menores, cometidos pelo clero, sob o pretexto de que é política
da Igreja manter sigilo sobre tais casos.
Ao recusar partilhar informações com a ONU, o Vaticano
revela uma duplicidade que pode anular a gigantesca campanha de promoção do
Papa, ajudada pela figura retocada de simplicidade e determinação onde o
despojamento pessoal, a atenção aos crimes do clero e as investigações ao Banco
do Vaticano eram as linhas de força para o branqueio da imagem do Vaticano.
O Papa Francisco é uma fonte de contradições. Perante uma
imagem de sinceridade e de bondade, permanece subjugado à Cúria que parecia
estar a caminho da cura. Face a uma ideia de modernidade, insiste nos milagres
e exorcismos que são mais mortíferos para a credibilidade da Igreja do que um
PIM de Almada a fustigar o Dantas.
O Papa Francisco afirmou ontem no Vaticano que a fé na
“ressurreição da carne”, referida no Credo, é uma “verdade”, que está
ligada à ressurreição de Jesus. A fé e a razão detêm um litígio de difícil
solução mas não se entende que a leitura literal de uma crença possa ser
promovida sem reflexão crítica.
A antiguidade da Terra, biliões de mortos, 7,5 mil milhões
de vivos e muitos biliões que ainda nascerão, são números colossais que o
Antigo Testamento não previu. Como se convence um mortal, no pleno uso das suas
faculdades, que no Vale de Josafá, ora Vale de Megido, terá lugar a Batalha do
Armagedão, apenas para não deixar mal colocado o profeta Daniel, que a previu?
Quem pode crer na ressurreição física de todos os mortos no
exíguo espaço do Vale de Megido, onde aos transplantados serão reclamados os órgãos
alheios? Quem imagina as cinzas dos
incinerados em vida, pela Inquisição, ou dos mortos, por vontade própria, a
refazerem a anatomia do corpo e a complexidade do cérebro?
Do pavor que a Igreja insiste em infundir, escapam três anos
e meio em que o anticristo, personagem escatológica que dominará
provisoriamente o mundo, fará um reino de ‘paz mundial, estabilidade económica
e liberdade religiosa’ antes do fim dos tempos, ou do Armagedão, a tragédia fatal
para derrotar Satanás, como se o importante fosse dar razão ao profeta Daniel
ou a Mateus (24:3, 21) cujas profecias eram o seu modo de vida.
Quem quererá a Igreja católica convencer, para além dos que
se habituaram a crer nela desde o nascimento?
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