Sucinto balanço político após a aprovação do Orçamento de Estado...
O XXI Governo Constitucional – designação que a Direita evita - completou 2 anos de mandato. Estamos a meio de uma legislatura inovadora em termos políticos já que foram derrubadas as peias restritivas construídas à volta de fantasiosos ‘arcos de governação’ ou do ineludível segregacionismo de um círculo de ‘partidos do poder’.
O atual Governo viabilizado a partir de posições conjuntas subscritas pelo PS, BE, PCP e PEV, que constituiu o mínimo denominador comum daquilo que se pode catalogar como uma política de Esquerda e tem vindo a cumprir o acordado nomeadamente no campo da reposição de rendimentos e manutenção do controlo da despesa pública o que contrariou todas as previsões catastrofistas da Direita.
O novo cavalo de batalha (de Troia?) da Direita é que este acordo ‘esgotou-se’ em 2 anos e daqui para a frente assistiremos, penosamente, à gestão corrente da República, isto é, da ‘coisa pública’. Na verdade quando se lê os documentos assinados em Novembro de 2015 entre o PS e o PCP link, BE link e PEV link, praticamente decalcados uns dos outros (o carácter ‘conjunto’ reside nesta concertação) verificamos que a morte do atual Governo - desejada pela Direita, - será (mais) um anuncio prematuro.
Existe ainda algum caminho a percorrer dentro do âmbito das posições conjuntas assinadas há 2 anos. A Direita não quer que assim seja e sempre que surge mais uma medida inscrita na posição conjunta ou implícita no texto (a interpretação literal será redutora) grita que se trata de uma reversão cega das medidas tomadas pelo Governo de Passos Coelho que ‘salvaram’ o País e custaram tantos sacrifícios. Na verdade, só uma parte desta gritaria tem um fundo de verdade, isto é, quando se refere aos sacrifícios. Interessaria saber se sacrifícios eram absolutamente necessários ou faziam parte de um castigo popular incentivado por Berlim e adoptado pela maioria PSD/CDS.
Cada ano que passa é a demonstração cabal da perversão sacrificial ensaiada.
O que está a ocorrer não são propriamente reversões mas a correcção de perversões que foram impostas pelo exterior sob a forma de ‘ajudas’ ou então desenhadas e adoptadas pela deriva neoliberal de 2011-2015.
As ‘posições conjuntas’ dos partidos de Esquerda são, ao fim e ao cabo, a expressão pública de um compromisso político quanto ao cumprimento do ‘contrato social’, firmado ao longo de gerações, entre os cidadãos e o Estado, abundante violado durante a governação PSD/CDS, que é a base de toda a relação de confiança com o País e que tão vilipendiado foi durante o último Governo de Direita.
A devolução de rendimentos não é destacável de ‘contra-reformas’, por exº., incidindo sobre a legislação laboral, facto que incomoda a Direita e tem sido um cavalo de batalha dos ‘grémios empresariais’ na concertação social.
A Esquerda não pode ser ingénua nem embarcar em miragens. Todas as reposições que tiveram lugar não são sustentáveis (para usar uma terminologia da Direita) se, por acaso ou, pior, por negligência política, a Direita regressar brevemente ao Poder. O resto da legislatura deverá ser consagrado à consolidação dos ganhos obtidos com a reversão da austeridade (ainda não completada). As tarefas de consolidação envolvem muitos parâmetros e a concertação de soluções comuns não será obtida com rapidez.
Claro que a normalização da vida dos portugueses pressupõe novas capacidades de crescimento económico e melhores estímulos para desenvolver a produção nacional, num contexto tão influenciado pela conjuntura internacional. E aqui entra um dos problemas que não estando na letra das ‘posições conjuntas’ informou e condicionou, sub-repticiamente, a sua génese: a renegociação da divida. Esta a grilheta que condiciona o desenvolvimento.
Há, portanto, muito caminho a fazer. Cada dia que passa solta-se na arena política a estridência da Direita com macabros anúncios de caos e anarquia e enxovalhadas retóricas sobre radicalismos à Esquerda para tentar esconder o desespero de continuar a defender uma mortífera austeridade que impuseram no passado, está desmontada e negada pela praxis.
Muita coisa tem corrido mal ao Governo nos últimos meses. É o natural desgaste do meio da legislatura a cavalo de uma sequência de incidentes ou mesmo de acidentais catástrofes.
Mas os arautos das desgraças não têm razão para bradarem aos céus. Ainda não tivemos um sobressalto tão violento como foi a demissão irrevogável (Paulo Portas) ou a declaração de incapacidade de um ministro charneira (como era Vítor Gaspar).
Daqui para a frente 'o caminho faz-se caminhando', como diria poeta castelhano Antonio Machado.
Complicado, previsivelmente, muito difícil, será a elaboração e aprovação de um 4º. Orçamento de Estado à volta desta maioria já que o guião terá de ser mais flexível e as condições a acordar muito mais exigentes. A actual maioria parlamentar vai entrar na fase das leituras subjectivas dos acordos, refazer contas, balancear resultados.
A Direita está a tentar refazer-se depois do desastre que foi a oposição de Passos Coelho. Entretanto, não é expectável que a Esquerda venha a fazer um haraquíri.
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