FMI - a "retoma" do nosso descontentamento...
OLIVIER BLANCHARD (foto abaixo) -
Economista-chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI), acredita que a recuperação da economia global, começou!
Aparentemente, uma boa notícia. Mas, esta previsão vem recheada de advertências, de condicionalismos, de avisos drásticos e veladas ameaças...
Num press release da agência Reuters de 18.08.09 link, afirma-se que:
"The crisis has left deep scars, which will affect both supply and demand for many years to come.", i e., "a crise deixou profundas cicatrizes que irão afectar tanto a procura como a oferta por muitos anos…"
Portanto, nada de transcendente. O vulgar cidadão há bastante tempo que se apercebeu dessa trágica eventualidade.
Como, também, já sabemos, este incipiente crescimento que se verificará nos próximos trimestres será sustentado pelo planos de ajuda e de estímulo promovidos pelos Estados, à custa de dinheiros públicos e, ainda, planos de emergência sociais (ao desemprego) e de concessão de créditos ao investimento produtivo. São – não disse Olivier Blanchard - os custos das derivas no sentido de desenvolver nas economias ocidentais doutrinas neoliberais (UE), ou neoconservadoras (EUA)!
O que o economista-chefe do FMI assegurou foi uma incontrolável pressão orçamental, a continuação de altos níveis de desemprego, etc., factos da economia real que, na opinião do especialista, só poderão ser corrigidos por um incontornável aumento dos impostos…
A velha receita: salvo o sector financeiro, oferecida solvência à Banca, o FMI, só vislumbra soluções que passem pela crucifixação do contribuinte.
Esta não é uma cicatriz da recuperação mas, antes, o estrangular da denominada “classe média”, em vertiginosa marcha para uma desamparada proletarização.
A minha dúvida, salvo o devido respeito pelo economista do FMI, é que provavelmente não haverá uma retoma global pela simples razão de que a crise não é mundial.
A crise é do Ocidente. Ou seja, é o colapso da prosperidade e do desenvolvimento económico baseado no crédito e, simultaneamente, numa progressiva perda de competitividade.
Para a China e Índia não há crise! Mantêm o seu excedente comercial, orientam a produtividade e o investimento económico para as exportações e, concomitantemente, controlam o crédito e o consumo interno…
Mas o trágico é que toda a estratégia de retoma, apresentada pelo responsável do FMI, pressupõe a irreversibiliddade da opção neoliberal. Isto é, a continuação do mercado livre, puro e duro.
Ao fim e ao cabo a persistência das causas fundamentais que nos conduziram à crise.
O FMI caminha no sentido de transformar-se num inadaptado organismo de cuidados paliativos!
Se a actual crise não provocar mudanças substanciais nas estratégias económicas e financeiras dos Governos e não for o exemplo paradigmático do fracasso do neoliberalismo, na realidade, a retoma será uma mera ilusão, que apenas servirá para alimentar o nosso (já profundo) descontentamento.
Comentários
Os governos ocidentais, verdadeiras correntes de transmissão dos detentores do capital financeiro, não podem continuar a esconder o falhanço das teorias neoliberais, já que, como ficou provado, o santificado e o tão glorificado mercado não conseguiu prescindir da decisiva ajuda do Estado para superar uma crise desta dimensão.E esta crise não é conjuntural, como alguns pretendem fazer crer. Ela é estrutural, ao mesmo tempo que anuncia um fim de ciclo, para anunciar um outro, com uma inevitável e progressiva mutação no poder político e económico a nível planetário.A crise de 1883 marcou o princípio do fim do poder hegemónico da Inglaterra, e o surgimento de uma nova potência, os Estados Unidos, que dominaram o mundo durante todo o século XX. O canto do cisne do domínio absoluto do mundo ocidental começa já a ouvir-se por todos os lados, com os governos a tentar abafá-lo com medidas, que não passam de meros e transitórios paliativos.
Subscrevo inteiramente o texto de "é-pá", que, numa síntese admirável, aborda a origem da crise, o seu desenvolvimento e as suas nefastas consequências.