Reflexões sobre os resultados eleitorais
Conhecidos que são os resultados provisórios das eleições legislativas, deixo algumas reflexões.
Os vencedores da noite são o CDS e o BE. O CDS conseguiu canibalizar o PSD, aproveitando o descontentamento do eleitorado da direita com o PSD e a campanha sem brilho protagonizada por Manuela Ferreira Leite. Por outro lado, o BE conseguiu absorver parte do eleitorado do PS, duplicando a sua representação parlamentar, e conseguindo não só estabilizar os mandatos que já tinha conquistado nos grandes círculos eleitorais (Lisboa, Porto, Setúbal), mas conseguindo alargar a sua base geográfica a círculos menores, como Coimbra, Braga, Leiria, Aveiro e Faro. Apesar da vitória significativa, esta terá com toda a certeza sido agridoce, não tendo ultrapassado a barreira simbólica dos 10%, não se ter conseguido sagrar como a terceira força política mais votada, e finalmente de não ter conseguido o número de mandatos necessário para poder ser o único interlocutor do PS à esquerda.
O PCP sobe ligeiramente, mas cai para quinta força política.
Sócrates é um dos derrotados. Ainda que tenha ganho, perde parte da sua força política. Nota-se claramente que o PS é mais castigado por causa do estilo do seu líder do que das opções políticas do PS e da qualidade da governação. Finalmente, Manuela Ferreira Leite é a maior derrotada nestas eleições. Tendo iniciado a campanha numa situação de empate técnico, a sua campanha seca, sem brilho, sem ideias e concentrada em "fait divers" e mesquinhezas políticas conseguiu desbaratar a vantagem táctica com que partia. As facas longas só ainda não avançaram por causa da campanha para as autárquicas, mas lá entrarão seguramente em jogo. O que é bom para o PSD, que necessita de sangue novo, e de uma nova geração de líderes que não tenha teias de aranha do cavaquismo. Para um partido como o PSD, qualquer resultado abaixo da fasquia dos 30% é uma derrota pesada, e não há maneira de dourar a pílula.
Parece-me que há quatro grandes conclusões a tirar deste escrutínio:
1) O eleitorado português está dividido, em partes quase iguais, entre três campos: o campo da esquerda (BE e CDU), o campo da direita (CDS e PSD) e o PS (que com Sócrates se localiza no centro liberal)
2) O PS tem que decidir, atendendo a estes resultados, qual é a sua identidade. Tem que decidir se é um partido de esquerda ou se é um partido de centro liberal. Há razões muito óbvias que levaram os eleitores de esquerda que tradicionalmente votam no PS a não votar neste PS: o autoritarismo, a promiscuidade com os grandes interesses económicos e financeiros, uma agenda social tímida e a erosão dos direitos dos trabalhadores. O PS terá que decidir se quer governar com a esquerda, negociando com o BE e com a CDU, ou se quer governar com a direita (com o CDS e/ou o PSD)
3) O eleitorado deixou claro que, pelo menos neste momento, que está farto de maiorias absolutas, de teimosias e autoritarismos, e que quer que a AR sirva para qualquer coisa. E deixa muito claro que está farto do Bloco Central, da alternância entre PS e do PSD e da promiscuidade entre estes dois partidos e os grandes interesses económicos e financeiros.
4) Há temas que têm sido evitados pelo centrão, e em que CDS, CDU e BE capitalizaram votos. Temas diversos, que têm que ser encarados frontalmente e sem tabus. À esquerda temos questões como o casamento homossexual, a transparência fiscal, a agenda social. À direita temos a política de segurança. Se se fizer uma análise aprofundada de onde é que o CDS conseguiu captar muitos votos, pode notar-se que houve uma mutação do seu eleitorado tradicional (rural e religioso) para um eleitorado suburbano bastante afectado pela insegurança. Este é um tema que deve ser discutido sem tabus- principalmente ao nível jurídico. Parece-me ser claro que o ordenamento jurídico-criminal português, quase copiado da Alemanha, já deu provas cabais de não estar adequado à realidade da criminalidade e da justiça em Portugal. Enquanto as coisas continuarem assim, Paulo Portas continuará a somar e a seguir.
Os vencedores da noite são o CDS e o BE. O CDS conseguiu canibalizar o PSD, aproveitando o descontentamento do eleitorado da direita com o PSD e a campanha sem brilho protagonizada por Manuela Ferreira Leite. Por outro lado, o BE conseguiu absorver parte do eleitorado do PS, duplicando a sua representação parlamentar, e conseguindo não só estabilizar os mandatos que já tinha conquistado nos grandes círculos eleitorais (Lisboa, Porto, Setúbal), mas conseguindo alargar a sua base geográfica a círculos menores, como Coimbra, Braga, Leiria, Aveiro e Faro. Apesar da vitória significativa, esta terá com toda a certeza sido agridoce, não tendo ultrapassado a barreira simbólica dos 10%, não se ter conseguido sagrar como a terceira força política mais votada, e finalmente de não ter conseguido o número de mandatos necessário para poder ser o único interlocutor do PS à esquerda.
O PCP sobe ligeiramente, mas cai para quinta força política.
Sócrates é um dos derrotados. Ainda que tenha ganho, perde parte da sua força política. Nota-se claramente que o PS é mais castigado por causa do estilo do seu líder do que das opções políticas do PS e da qualidade da governação. Finalmente, Manuela Ferreira Leite é a maior derrotada nestas eleições. Tendo iniciado a campanha numa situação de empate técnico, a sua campanha seca, sem brilho, sem ideias e concentrada em "fait divers" e mesquinhezas políticas conseguiu desbaratar a vantagem táctica com que partia. As facas longas só ainda não avançaram por causa da campanha para as autárquicas, mas lá entrarão seguramente em jogo. O que é bom para o PSD, que necessita de sangue novo, e de uma nova geração de líderes que não tenha teias de aranha do cavaquismo. Para um partido como o PSD, qualquer resultado abaixo da fasquia dos 30% é uma derrota pesada, e não há maneira de dourar a pílula.
Parece-me que há quatro grandes conclusões a tirar deste escrutínio:
1) O eleitorado português está dividido, em partes quase iguais, entre três campos: o campo da esquerda (BE e CDU), o campo da direita (CDS e PSD) e o PS (que com Sócrates se localiza no centro liberal)
2) O PS tem que decidir, atendendo a estes resultados, qual é a sua identidade. Tem que decidir se é um partido de esquerda ou se é um partido de centro liberal. Há razões muito óbvias que levaram os eleitores de esquerda que tradicionalmente votam no PS a não votar neste PS: o autoritarismo, a promiscuidade com os grandes interesses económicos e financeiros, uma agenda social tímida e a erosão dos direitos dos trabalhadores. O PS terá que decidir se quer governar com a esquerda, negociando com o BE e com a CDU, ou se quer governar com a direita (com o CDS e/ou o PSD)
3) O eleitorado deixou claro que, pelo menos neste momento, que está farto de maiorias absolutas, de teimosias e autoritarismos, e que quer que a AR sirva para qualquer coisa. E deixa muito claro que está farto do Bloco Central, da alternância entre PS e do PSD e da promiscuidade entre estes dois partidos e os grandes interesses económicos e financeiros.
4) Há temas que têm sido evitados pelo centrão, e em que CDS, CDU e BE capitalizaram votos. Temas diversos, que têm que ser encarados frontalmente e sem tabus. À esquerda temos questões como o casamento homossexual, a transparência fiscal, a agenda social. À direita temos a política de segurança. Se se fizer uma análise aprofundada de onde é que o CDS conseguiu captar muitos votos, pode notar-se que houve uma mutação do seu eleitorado tradicional (rural e religioso) para um eleitorado suburbano bastante afectado pela insegurança. Este é um tema que deve ser discutido sem tabus- principalmente ao nível jurídico. Parece-me ser claro que o ordenamento jurídico-criminal português, quase copiado da Alemanha, já deu provas cabais de não estar adequado à realidade da criminalidade e da justiça em Portugal. Enquanto as coisas continuarem assim, Paulo Portas continuará a somar e a seguir.
Comentários
A questão é que, neste momento e mais uma vez, as opções mais prementes são no plano económico. O orçamento está à porta. Optará o PS por virar um pouco à esquerda ou continuará a trilhar um caminho mais liberal? Política fiscal, novas privatizações (p.ex., as águas) e investimentos públicos. O momento é de clarificação.
Concordo com a análise e, também, acho que o PS, antes de enfrentar o intrincado problema político criado por estas eleições, terá de resolver, internamente, o grave problema identitário que o atinge transversalmente.
Há demasiadas vozes no ar, muitas das quais não passam do reafirmar de interesses de grupo, faccção ou, até mesmo, pessoais.
E não me parece que este importantíssimo assunto esteja na agenda política do PS, para os próximos tempos...com o risco de o PS navegar à deriva.
A noite de ontem (e as discursatas vazias de conteúdo, repetidas à exaustão nas TV, com aquelas figuras que sempre aparecem para o croquete e para o boneco) é mais uma prova de que os políticos à portuguesa acham que o Zé é estúpido.
Como é habitual, toda a gente ganhou:
a) Sócrates diz que teve uma vitória extraordinária. Perder a maioria absoluta e mais de 500.000 votos (desceu em todos os círculos eleitorais) é uma vitória extraordinária comparando com quê? Os 26% (das Europeias) referidos por Alberto Martins?
b) Ferreira Leite ganhou porque Sócrates perdeu a maioria absoluta e porque teve mais 7 ou 8 mil votos que Santana? Vitoriazinha porreira, já se vê...
c) A CDU, que de 3.º passou para 5.º, embora tenha tido mais uns 12 mil votos?!?
d) O BE, que apesar da grande subida, ficou atrás do outro Portas?!?
Parece-me que quem efectivamente pode cantar vitória é Paulo Portas, não só pelo n.º de deputados eleitos (o aumento de votos, cerca de 180 mil, não teve a mesma visibilidade), mas também pela força adquirida.
Adaptando a pergunta dos Gato Fedorento a MFL, não demorará muito temos o Portas sentado ao colo do Sócrates...
Estou em completo desacordo com a qualificação de liberal (sob o ponto de vista económico) ao PS e parece-me injusta a apreciação sobre o actual líder.
Essa etiqueta foi um pretexto que o PCP e o BE usaram para eleger o PS como inimigo principal mas desconheço os factos que a justifiquem.
Mesmo o Código de Trabalho no seu pragmatismo!
Regozijo-me, isso sim, pelo pluralismo do Ponte Europa mas não me revejo nessa análise.
Penso que o Morcego deixou claro o que eu queria dizer. Discordo profundamente do assassinato de carácter que se procurou mover José Sócrates, e penso que é uma pessoa bastante competente como PM. No entanto, para além das qualidades que certamente tem (como político e como governante), tem também algumas ideossincrasias menos positivas, que foram devidamente assinaladas pelo eleitorado. Sócrates, como pessoa inteligente que é, poderá certamente limar esses defeitos durante este mandato.
Quanto à qualificação de liberais de muitas das políticas desenvolvidas pelo PS na passada legistatura, penso que (como o Morcego devidamente assinalou), a qualificação é merecida, e não meramente uma etiqueta colocada pela esquerda por motivos eleitoralistas.
E, no meu entender, não é intrinsecamente mau o epíteto "liberal". Mas que haja clarificação. Bem sei que Guterres, e depois Sócrates tentaram aplicar medidas que se enquadram na "terceira via" e no "new labour", que procuravam combinar liberalismo económico com medidas socialistas/social-democratas. No entanto, e é necessário afirmá-lo frontalmente, que na aplicação prática deste modelo (no Reino Unido, na Alemanha, em Portugal, e mesmo na Escandinávia) o liberalismo ofuscou o socialismo, e o modelo falhou, pelo menos parcialmente, tendo que ser reavaliado. De qualquer forma, não me choca que o PS se transforme num partido de centro liberal... mas que se clarifique.