RESPONSABILIDADE CRIMINAL DOS POLÍTICOS

Os dirigentes dos sindicatos dos magistrados, o Dr. Passos Coelho e alguns acólitos têm andado ultimamente a defender que os políticos não devem ser responsabilizados pelos seus actos apenas politicamente, perante o povo e a Assembleia da República, mas também civil e criminalmente, perante os tribunais.
 
A coisa é estranha, sobretudo vinda de juristas que deviam conhecer a lei. É que essa responsabilidade civil e criminal perante os tribunais já existe há muito tempo.
 
Desde logo porque as actividades dos políticos que envolvam gestão de dinheiros públicos são escrutinadas pelo Tribunal de Contas. 


Por outro lado, os políticos já são civil e criminalmente responsabilizados pelos crimes que cometam no exercício das suas funções.

Em primeiro lugar, são responsáveis, como qualquer cidadão, pelos crimes tipificados no Código Penal que eventualmente cometam (por exemplo: difamação, injúrias, devassa da vida privada, etc.).
Mas além disso existe uma lei especial que visa especificamente "Crimes de responsabilidade dos titulares de cargos políticos", tais como: traição à pátria, atentado contra a Constituição, atentado contra o Estado de Direito, coacção contra órgãos constitucionais, prevaricação, denegação de justiça, desacatamento ou recusa de execução de decisão de tribunal, violação de normas de execução orçamental, suspensão ou restrição ilícitas de direitos, liberdades e garantias, corrupção, peculato, participação económica em negócio, emprego de força pública contra execução de lei ou ordem legal, recusa de cooperação, abuso de poderes, violação de segredo.
  
Então que mais querem os tais sindicalistas e o Dr. Passos Coelho?
Lendo nas entrelinhas do que escrevem, o que eles querem é que a responsabilidade meramente política, que agora é escrutinada pela Assembleia da República (que pode submeter o Governo a críticas e votar moções de censura) e pelo Povo (que pode castigar o partido do Governo nas urnas eleitorais), seja transformada em responsabilidade criminal e transferida para os tribunais.
   
No fundo, querem que os políticos respondam perante os tribunais por todos os seus actos, ilícitos ou lícitos. Querem usurpar as funções da Assembleia da República e esvaziar de conteúdo a soberania popular. Isto é: querem uma ditadura de magistrados.

Isto vem na linha do que há muitos anos, sobretudo desde que o PS foi para o Governo, vem sendo a actuação dos sindicatos dos magistrados, que estão constantemente a intrometer-se nas esferas de competências dos poderes legislativo e executivo. Tais sindicatos têm uma visão unilateral do princípio da separação de poderes. Não admitem que nenhum político critique as suas decisões; mas estão constantemente a criticar as decisões do poder executivo e do poder legislativo. Não querem limitar-se às suas competências, que são as de interpretar e aplicar as leis; querem ser também eles a fazê-las, ou obrigar o poder legislativo a fazê-las como eles querem.

A única novidade é vir agora o Dr. Passos Coelho defender estas peregrinas teses. Mas, se bem atentarmos, não é grande novidade. Como é sabido, os sindicatos de magistrados sempre foram dominados pela célebre coligação vodka-laranja (PC+PSD). O Dr. Passos Coelho apenas veio confirmar publicamente esse facto. Resta agora saber o que dirá o PC. Possivelmente não dirá nada (e quem cala consente). Mas se alguma coisa disser, aposto que não será muito diferente do que disse o Dr. Passos Coelho.

Comentários

e-pá! disse…
O Dr. PPC perante rol de "crimes de responsabilidade dos titulares de cargos políticos", exaustivamente enumerados no post, quererá acrescentar mais alguns:
defice orçamental superior a 3%, endividamento excessivo, etc.
ana disse…
Óptima análise, como de resto é habitual em ahp.

Uma coisa me tem feito muita confusão: o dr. ppc nunca disse se a tal lei feita à medida teria efeitos retroactivos...
Caro e-pá!
Todos os juristas concordam que a criminalização de comportamentos é uma "ultima ratio", isto é, só deve ser consagrada se não houver maneiras menos gravosas de impedir esses comportamentos. Ora, no que toca ao défice orçamental superior a 3%, ou a endividamento excessivo, então seria necessário e bastaria que a lei (não penal) ou até a Constituição, como alguns já defenderam, prescrevesse que não poderiam ser aprovados pela AR orçamentos com défice superior a 3% ou que permitissem endividamentos superiores a um certo montante.
Feito isso, se um governante violasse essa lei incorreria no crime (já existente) de "violação de normas de execução orçamental", que pune, entre outras coisas, "contrair encargos não permitidos por lei" e "autorizar ou promover operações de tesouraria ou alterações orçamentais proibidas por lei".

Cara Ana
A lei penal não pode ter efeitos retroactivos. Tal resulta do princípio da legalidade consagrado logo no artigo 1º do Código Penal, que diz:"Só pode ser punido criminalmente o facto descrito e declarado passível de pena por lei anterior ao momento da sua prática.

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