Momento zen de segunda_31-03_2014 – DN
João César das
Neves (JCN), megafone ortodoxo do clero reacionário e depositário da herança do
concílio de Trento, brindou-nos hoje com uma homilia a que deu o título de “O
fósforo e a gasolina”.
Execrou a cultura
ocidental porque, “após ter tentado (…) revolucionar religião, política
e economia”, “decidiu abalar a família”. Trocou a ordem
tradicional pela “libertinagem mais total». Ele lá saberá os meios que
frequenta e os hábitos da sua madraça, para dizer que “Foi formulado um
axioma sensual, decretando o prazer venéreo como supremo e absoluto” [sic]. Freud
veria na obsessão sexual o recalcamento que substitui pelo cilício.
Informa que “Os horrores da Revolução Francesa, União
Soviética, etc. resultaram do esquecimento da estrutura social natural”. Não explica,
basta-lhe a fé. “Também a crise financeira global ou os desastres de automóvel
vêm do descuido de velhos princípios de prudência. Nada se compara, porém, com
o arrasador mito libertino contemporâneo”, diz JCN. Talvez não seja o
substantivo que o apavora, é o adjetivo que o excita. Aceita, decerto, o mito,
adora os seus mitos, apenas execra a lascívia.
No fervor da homilia pergunta, citando o livro de cabeceira:
"Qual de vós, por mais que se preocupe, pode acrescentar um só côvado à
duração de sua vida?" (Mt 6, 27). Ignora os progressos da medicina e da
farmacologia e de como está obsoleto o livro citado.
JCN – “Os resultados da nossa experiência libertina são há
muito evidentes. Explosão de divórcios e violência familiar, queda catastrófica
da natalidade, patologias mentais, sobretudo infantis, pornografia, degradação
da mulher, insucesso escolar, marginalidade, droga, exclusão, vício, miséria,
suicídio”.
Quem imaginaria na prática do sexo, que JCN chama
“experiência libertina”, sequelas tão devastadoras e contraditórias? Nem um
pároco de aldeia! JCN parece ignorar que a castidade é a mais demolidora
atitude contra a reprodução e jamais alguém provou que a prática sexual seja
culpada do insucesso escolar e, muito menos, da queda catastrófica da
natalidade, entre as desgraças que aponta ao único prazer que não prejudica a
saúde.
JCN finda a homilia, sem a ameaça do Inferno, mas acusando o
Estado: “O propósito supremo é proteger desesperadamente o precioso postulado
lascivo. Pode dizer-se que nisto o nosso tempo confirma o famoso epitáfio
irónico: "Aqui jaz o homem que foi com um fósforo ver se havia gasolina no
tanque. E havia."
JCN ensandeceu mas continua a ser um manancial de humor num
país sorumbático.
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