Vitórias e derrotas

Não há vitórias eternas, nem derrotas definitivas. O processo de acumulação do capital levou à concentração da riqueza em cada vez menor número de pessoas. Há de atingir um ponto de fratura.´

Os tempos que correm, no dealbar da quarta revolução industrial, em que pela primeira vez os postos de trabalho destruídos são em maior número do que os criados, com robôs capazes de substituírem as pessoas, não tem uma resposta política para os desequilíbrios criados, e acentuados pela incontrolável explosão demográfica mundial.

Pelo contrário, com a multidão crescente de desocupados, exige-se a quem tem emprego que aumente a frequência, duração e intensidade do trabalho, fruto da ganância de quem acumula capital e do desespero do número crescente de marginalizados.

Não é apenas a riqueza que urge distribuir, é o próprio trabalho e a sua retribuição, pois acabará por ser insustentável que não se dividam ambos, para maior equilíbrio social.

Só existe uma situação em que os ricos arriscam tanto quanto os pobres, perdendo o que têm, seja pouco, muito ou nada, e a própria vida. É numa situação de guerra. E este é o cenário previsível na espiral que juntará os conflitos regionais num único e catastrófico.

Falhadas, ao longo da História, as posições conservadoras, parece um contrassenso que a deriva reacionária, xenófoba e nacionalista conquiste tão vastas camadas da população mundial.

As sementes lançadas por Bernie Sander nos EUA, durante a campanha presidencial, e a recente vitória da reeleição do líder trabalhista, Jeremy Corbyn, com 61,8% dos votos dos militantes, abrem uma oportunidade para o combate ideológico contra o imparável êxito com que o ultraliberalismo ameaça a Humanidade. A próxima batalha é favorável ao último, mas não há vitórias eternas, e só se dececionam os cobardes que desistem de lutar.

Ponte Europa / Sorumbático

Comentários

Jaime Santos disse…
Além das questões de carácter que se levantam sobre Corbyn, coloca-se sobretudo a questão da sua capacidade para tornar o Labour uma oposição eficaz e perceber que a vocação desse Partido deveria ser o exercício do Poder como condição para melhoria das condições de vida dos mais desfavorecidos. De nada vale a pureza ideológica se se está na Oposição. A longa travessia do deserto nos anos 80 e o trabalho de Kinnock, Smith e também de Blair para tornar o Labour num Partido novamente capaz de ganhar eleições, depois da derrota de Callaghan e dos anos de Foot, são a imagem do que está para vir. A esse propósito, este artigo não deixa grandes ilusões sobre o que será um novo longo reinado dos Tories na Grã-Bretanha: https://www.socialeurope.eu/2016/09/intellectuals-journalists-academics-need-move-tories-game-town/. Os marxistas de antanho que se entusiasmam com Corbyn não percebem que os Britânicos são por natureza conservadores, entre um Tory razoavelmente competente e alguém que lhes fale ao coração, preferem sempre o Tory...
Jaime Santos:

Embora não seja do meu agrado, admito que tem razão.
e-pá! disse…
Jaime Santos:

Existe uma asserção no seu comentário que discordo frontalmente e me impeliu a replicar.

Quando escreve que " De nada vale a pureza ideológica se se está na Oposição..." sou levado a suspeitar que para além da quebra circunstancial de princípios, determinada pelo exercício (ou não) do poder, poderemos não estar face a incompreensões e divergências sobre a evolução da história recente da política britânica, onde o Labour desempenhou 'vários papéis'.

Vou tentar explicar a minha visão que entra em contradição com o que está explicito no seu comentário.

Embora o Labour seja um partido criado no final do século XIX, a sua relevância política só se afirma no pós II Guerra, sob a direcção de Clement Atlee, que lança mão à construção do Welfare State, começando por redefinir direitos laborais, 'desconstruir' o império (colocando-se no caminho da descolonização), promover uma escola pública de excelência, criar o National Health Service (que seria modelo de serviço público e universal de Saúde), nacionalizar indústrias e serviços (ferrovias, energia, siderurgia, carvão, etc.)considerados estratégicos para um desenvolvimento 'sustentado' (como agora é frequente dizer-se) e cúmulo da heresia nacionalizar o Bank of England.
Esta a matriz do Labour, enquanto partido de Governo, que nos anos 60 (1964-70) e 70 (1974-79), apesar da estagnação económica (choque petrolífero) ainda avança em questões fracturantes (aborto, homossexualidade, etc.).
Comete, no entanto, a 'traição' (social, entenda-se) de, perante o espectro de recessão, inflação galopante e défices públicos elevados, cortar nos salários e divorciar-se do movimento sindical, alienando a sua base social histórica. (Comentário marginal: onde estamos a ver e sentir este chorrilho de 'ajustamentos'?).

Em 1979 o Labour é derrotado pelos conservadores, liderados pela Srª. Thatcher, que se tornou a líder da 'onda neoliberal', não só na Grã-Bretanha mas também a nível mundial.
Fiquemos por aqui porque é este período (pré-thatcheriano) que contem importantes dados matriciais da relação entre os trabalhista e o exercício do poder.

É obvio que o 'Blairismo', cria uma nova 'onda' que pouco mais será do que a acomodação dos trabalhistas aos estragos da Srª. Thatcher mas que viria a influencia a vivencia (e a sobrevivência) da social-democracia em termos europeus (pelo menos). Mas esse é outro tema.

Todo este arrazoado para quê?.
Para tentar colocar Jeremy Corbyn no seu sítio.

O actual líder trabalhista estará tão somente a alinhar-se com o período pós guerra, onde perante a devastação bélica o Labour se construiu como partido de poder, fiel aos princípios sociais-democratas.
Hoje, perante outro tipo de devastação (económica e financeira) poderá ser necessário abandonar pragmatismos endémicos e revisitar os princípios (ideológicos).
Exactamente, agora, quando está na Oposição.
Jaime Santos disse…
Meu caro e-pá, Eu não considero que os termos 'social-democracia' e 'socialismo democrático' sejam equivalentes. Os 'social-democratas', embora considerem que os Estado pode e deve intervir na atividade económica, opõem-se (como eu me oponho) a que a generalidade da indústria ou da banca fiquem nas mãos do Estado. Os 'socialistas democráticos' (no sentido do belo ensaio de Orwell, 'Why I write'), defendem a nacionalização da generalidade da indústria. Foi isto que Atlee fez a seguir à II Guerra Mundial, um caminho pelo qual a Alemanha, por exemplo, nunca enveredou. Notavelmente, o capitalismo renano é hoje bem mais participativo (os trabalhadores têm assento nos órgãos de supervisão de gestão das empresas) que o britânico ou o francês, depois da falência do modelo do socialismo democrático. Obviamente, devemos distinguir estes dois movimentos da 'Economia Social de Mercado' (a que se deve o modelo de capitalismo renano de que falei acima) e ainda mais do neoliberalismo posterior de Hayek e Friedman, a que o 'New Labour' efetivamente aderiu (assim como todos os Partidos Europeus de cariz social-democrata, PS de Guterres incluído). Feita esta ressalva, o meu ponto é que não vale a pena tentar prosseguir políticas sociais (ou económicas) se não dispusermos de meios para tal. Uma gestão fiscal prudente, algo pelo qual os alemães sempre enveredaram, é absolutamente essencial para assegurar a continuidade das políticas sociais, porque os Estados dependem de financiamento externo (exceto talvez o Japão, razão pela qual ninguém se preocupa com a sua dívida pública, imagino eu). Por causa disto, as pessoas de classe média acabarão a votar em May (e sem esses votos não se ganham eleições, chapéu). Aliás, dado que o RU tem um défice brutal da balança comercial (7%, se não estou em erro), o futuro não parece risonho os Conservadores, sobretudo se o Brexit levar a que grandes empresas se retirem do RU, ou no mínimo atrasem investimentos, como aconteceu recentemente com a Nissan... Logo, parece-me que só políticas prudentes, implementadas por políticos pragmáticos na melhor tradição de um Schmidt que dizia que se alguém tem uma visão, deve ir ao médico, podem assegurar a continuidade do Estado Social. Não haverá uma pior traição à classe operária do que deixar o poder entregue à Direita, que se encarregará certamente de transformar o que resta do Estado Social num Estado Assistencial, como assistimos em Portugal entre 2011-2015, só porque a Esquerda é incapaz de construir uma coligação eleitoral (refiro-me a uma coligação de votantes) capaz de alcançar o Poder e, alcançando-o, é incapaz de assegurar a continuidade das suas políticas...

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