Irlanda - União Europeia em perigo
Pela primeira vez desde o início da campanha, o 'Não' ao Tratado de Lisboa lidera as preferências dos irlandeses que serão chamados a pronunciar-se sobre o documento no próximo dia 12 de Junho.
Nota: Para os que acreditam na Europa, e sabem que não há alternativa, esta é a mais demolidora notícia dos últimos tempos. Estão de parabéns os extremistas dos dois lados da barricada.
Comentários
Não vamos armar à volta deste referendo um estendal fundamentalista.
Aqui não há extremismos!
Se a Irlanda rejeitar o tratado de Lisboa, ao que parece à custa da passagem dos indecisos para o Não (cujo score baixou 12%), os dirigentes europeus não têm de que se queixar. Só se for da sua inépcia.
O “não-referendo” ao Tratado foi um expediente para contornar eventuais problemas e colocar as elites políticas no cerne da decisão dos grandes problemas.
O Tratado da União Europeia, em Maastricht, em 1992, orientou-se no sentido da criação de uma “Europa dos Povos”.
Instituiu a “cidadania europeia”.
Esta, inscreve-se no “modelo cultural europeu” e no “modelo social europeu”.
Para além disso, ao abrirem as suas fronteiras comuns, ao estimularem as transacções e a livre concorrência, os Estados-Membros da União pretenderam incentivar o desenvolvimento económico da Europa e a competitividade das suas indústrias.
Em Portugal, foi a negação do referendo, sob a pressão do PR, e, logo, o "rasgar" dos compromissos eleitorais de, em primeira mão, de Sócrates, mas fundamentalmente do PS. Sóctares passa e o PS fica.
Trata-se aqui de um incumprimento das promessas eleitorais. Mas os portugueses estão habituados. A isso, e à volta disso, à total perda de credibilidade da “classe política nacional”.
Os casos da França e Holanda que, democraticamente, já tinham rejeitaram o tratado constitucional, desenhado por Giscard d'Estaing, a solução encontrada de não o voltar a referendar, argumentando que era “outro documento”, foi uma grosseira burla política.
E mais situações haveriam.
Agora, vamos assistir, por parte da EU, a uma intolerável pressão sobre os irlandeses no sentido de condicionarem as suas opções democráticas. Vamos assistir ao que de pior há em democracia, i. e., à intimidação e, portanto, perda de liberdade de decisão.
E não vamos cair na tentação de catalogar os eventuais opositores ao Tratado de Lisboa de extremistas.
A democracia é isto mesmo.
O que de facto está em perigo é o futuro político dos dirigentes europeus que arquitectaram esta estratégia do “não-referendo”. Mas isso é outra coisa.
Eles não são tão essenciais que, se forem “atirados ao mar” (na expressão política”), isso signifique a morte da EU. Longe disso. Mas atenção aos casos de desespero, e ao eventual cortejo de benesses e ajudas que poderão via a ser oferecidas à Irlanda, numa desesperada tentativa de “salvar” a carreira, ferindo mortalmente princípio da equidade entre os Estados integradores da EU.
Todavia, há um aviso importante a reter:
A Europa deve ser construída de livre vontade, longe de qualquer tipo de chantagens.
Mas, meu caro CE, não há aqui lugar para extremistas. Quer de Direita, quer de Esquerda.
Quando muito haverá pessoas contentes ou descontentes com o livre exercício democrático dos irlandeses.
Você que é responsável ateu sabe que quer na religião, quer na política, não há Biblias... Existem escritos!
Mais nada!
Neste caso temos posições e sentimentos completamente opostos, eu absolutamente preocupado e o e-pá, vitorioso, com indisfarçável satisfação.
Claro que aceito o veredicto democrático mas com enorme frustração e medo.
Não considero nenhuma tragédia uma eventual (estamos nesse domínio) rejeição do Tratado de Lisboa pelos irlandeses.
Acabo de ouvir o 1º. Ministro irlandês fazer duas afirmações que considero preocupantes:
1º. Não entende o tratado já o que o mesmo se encontra escrito numa linguagem jurídica que ele considera impenetrável;
2º. Não conseguiu ler a totalidade do tratado, porque se o próprio documento, já é impenetrável, os anexos são autênticas charadas jurídicas, também insondáveis.
Portanto, aprovar um Tratado nestas circunstâncias é tudo menos um exercício democrático. Será dar “carta branca” a um grupo de elite europeia e eles que façam o que quiserem com o articulado ai constante.
Se a Irlanda, não o aprovar, será necessário re-escrevê-lo. A minha esperança é que a existir um próximo, ele seja substancialmente diferente. Um texto compreensível e legível para TODOS os europeus.
CE: não é legítima a conclusão que a rejeição do Tratado de Lisboa represente para mim uma “indisfarçável satisfação”.
Sou um europeísta de convicção. Mas o que estamos a tratar é diferente. Tive o cuidado de evocar o Tratado de Maastricht, em 1992, que se orientou no sentido da criação de uma “Europa dos Povos” e na instituição da “cidadania europeia”.
É aí que estou. É aí que aguardo um mais compreensível documento Não consegui digerir o Tratado de Lisboa, e aí estou como o 1º. Ministro irlandês. Não o consegui ler!
Em minha opinião – se tal acontecer – os irlandeses não vão rejeitar o tratado. Simplesmente não votarão a favor de uma coisa que não entendem. Não podem ser acusados por isso. Os franceses e os holandeses também não o foram.
Ora, CE, votar no desconhecido também lhe devia meter, como diz no seu comentário, “frustração e medo”.
Prefiro atrasar o percurso, mas ser cidadão europeu de pleno direito. Isto é, compreender claramente as razões porque optei por essa posição e saber os argumentos porque a defendo.
Não alinho em falsas honrarias. Pode ser gratificante haver um Tratado Europeu com o nome de Lisboa. Mas CE, nunca se esqueça que a estratégia deste documento construído em Lisboa, parte de uma inspiração liberal de Nicolas Sarkozy. E não quero acrescentar mais…
Ao fim e ao cabo, recordo-me com reverência e respeito de europeus com a envergadura, p. exº., de Jacques Delors
Defensor da democracia representativa, sempre fui contra referendos, plebiscitos e "democracias directas". Acho inadmissível que um tratado com a importância deste seja rejeitado por os leigos em matéria jurídica não o perceberem:por essa ordem de ideias, porque não fazer um referendo sobre a construção de uma ponte ou um aeroporto? A maior parte das pessoas, a começar por mim, votaria contra por não perceber nada de engenharia. O referendo é uma instituição falsamente democrática. Por causa de referendos é que na Suíça ainda há - ou havia até há muito pouco tempo - cantões onde as mulheres não têm direito de voto. De Gaulle - personalidade pela qual aliás tenho grande admiração - governou a França durante mais de uma década quase "ditatorialmente" em democracia, com base em referendos antes dos quais anunciava que se vencesse o "não" se demitiria.
Stalin, durante todo o tempo em que oprimiu a Rússia, só teve um gesto "democrático": apresentando-se dois projectos para a construção da Universidade de Moscovo, um deles modernista e que recolhia o apoio de todas as pessoas cultas, e outro um "mamarracho", resolveu fazer um referendo: claro que ganhou o mamarracho que lá está ainda hoje.
Por alguma razão os cidadãos elegem os seus representantes. Eu sei muito bem em quem hei-de votar, mas não percebo nada de economia, nem de finanças, nem de agricultura, nem de indústria, nem de turismo, nem de muitas outras matérias; por isso não quero que me peçam para dizer "sim" ou "não" a questões com elas relacionadas. Para resolver esses problemas lá estão os juristas, os economistas, os engenheiros em quem votei.
Em suma, acho intolerável que o destino da Europa esteja nas mãos dos borrachões dos irlandeses, que entre uma missinha e uma caneca de cerveja votam não porque estão mal dispostos com a vida.(Não vale chamar-me xenófobo por chamar borrachões aos irlandeses! São irlandeses os dois escritores que mais aprecio: James Joyce e Samuel Beckett; mas por alguma razão ambos se exilaram voluntariamente da católica Irlanda!).
Sex Jun 06, 10:08:00 PM
Eu evito fazer juizos de valor sobre o Tratado em qustão. Não o entendo.
Tenho as mais sérias dúvidas se a ggrande maioria dos deputados que o votaram na AR, o leram e, no caso de o terem lido, o compreenderam.
Chamar a isto uma ratificação democrática de um Tratado é o mesmo que pôr uma pedra a dar leite...
Eu acredito na democracia representativa de que o Parlamento é o expoente máximo. A Assembleia dos representados do Povo, eleitos pelos cidadãos, é o cerne da Democracia.
Mas tal facto não me demite de elogiar, criticar, contestar medidas que são produzidas pelo orgão legislativo.
O homem é um animal político. Tem sensibilidade política. Não posso aceitar ficar constrangido a expressar-me de 4 em 4 anos.
Quanto ao Tratado de Lisboa, para ser franco, não tenho qualquer sensibilidade ou opinião fundamentada. É, para mim, daquelas situações para que encaixa no estatuto da abstenção (por falta de informação e de esclarecimento suficiente).
Mas quando aceitamos a realização do referendo na questão da Regionalização e na despenalização da IVG, não podemos "ad limine" agora pôr em causa o instituto referendário que, tenho de concordar, democraticamente, é limitativo. A pergunta é quase sempre rebuscada (pode ser mesmo capciosa) e as respostas são quase sempre maniqueístas e, muitas vezes, para evitar polémicas contornam parte das questões.
A minha sensação é que o referendo deixa sempre alguma coisa por resolver. É uma decisão com um caracter muito suspensivo e pouco assertivo.
Agora, porque o Tratado têm hipotéticas perspectivas de "correr mal" na Irlanda, não vamos pôr em causa a sua legitimidade.
É preferível não cultivar essa angústia metafísica e ir beber uma Guinness...
«Agora, porque o Tratado têm hipotéticas perspectivas de "correr mal" na Irlanda, não vamos pôr em causa a sua legitimidade».
Resposta: Deixa de haver tratado.
E, assim, a Europa é um espaço em risco de desintegração. Se fosse aprovado, depois qualquer país poderia sair sem drama colectivo.
Com a devida distância e ressalvando as subtanciais diferenças a argumentação expendida fez-me lembrar a justiça militar dos velhos tempos - do conde de Lipe.
Primeiro, cumpre a pena (mesmo que injusta), depois queixa-se.
Peço desculpa a um leitor com quem, quase sempre, estou em sintomia e que, reconheço, tem uma notável preparação cultural e informação política.
Neste caso, porém, julgo que que não se dá conta da dimensão do que está em jogo.
A prática democrática conduz a estes exercícios de dialogar, estar em desacordo, polemizar.
Conduz a divergências na interpretação e visão dos acontecimentos políticos.
Todavia, há uma coisa de um valor incalculável. Conseguimos expor, civilizadamente, o nosso pensamento.
E, nestas divergências, pelo menos uma coisa ressalta: estamos ambos convictos da necessidade de uma União Europeia, temos nisso convicção, pensamos num caminho que pode ser diferente, mas desemboca sempre no espaço europeu - essse é o facto crucial.
Nestas alturas relembro-me de Gaston Bachelard que nos trouxe uma brilhante lição defendendo que o conhecimento ao longo da história não pode ser avaliado em termos de acúmulos, mas de rupturas, de rectificações, num processo dialéctico em que o conhecimento científico é construído através da constante análise dos erros anteriores.
É, esta, filosoficamente, a minha posição sobre o actual estado do Tratado de Lisboa.
Nos seus trabalhos de filósofo (a Europa precisa de doutrina filosófica), põe em contradição o trabalho científico como bom senso e remata com uma convicção que se aplica às actuais dificuldades da Europa dos 27:
"NÃO SE ENCONTRA O ESPAÇO, É SEMPRE NECESSÁRIO CONSTRUÍ-LO"
in
"Le nouvel esprit scientifique, 1934 ".
Teríamos achado o espaço em Lisboa ou será necessário dar mais tempo à Europa?
Uma mera especulação.