Sócrates e a face oculta

Nunca houve uma campanha tão bem orquestrada e tão demolidora como a que está em curso contra o primeiro-ministro. Nem quando Portas/Cardona/Adelino Salvado nos conduziram para o abismo da intranquilidade e Ferro Rodrigues foi imolado para gáudio da direita.

Não sei se, neste episódio da luta pelo poder, o Governo foi tão perverso que urdiu uma teia colossal para se apoderar da comunicação social, conquista que legaria ao que lhe sucedesse ou se a direita, inconformada com a derrota nas urnas, teceu uma campanha para destruir o PS através dos ataques ao carácter de José Sócrates. À partida qualquer das duas hipóteses se me apresentam como verosímeis.

O que me surpreende é o facto de, em tempos, um colaborador directo do PR ter tentado destruir o PM através do plantio de uma falsidade no jornal Público e de, agora, um dos conselheiros de Estado, próximo do PR, António Capucho, afirmar que «Sócrates não tem condições para continuar primeiro-ministro».

Já nem falo nas diatribes de Alberto João Jardim, essa referência ética de ex-fascista e actual referência democrática de Manuela Ferreira Leite. Nem de Paulo Rangel que se queixou no Parlamento Europeu de que a liberdade estava em perigo em Portugal. Só um trânsfuga do CDS para o PSD, onde é mais fácil singrar, seria capaz de ver censura tão precocemente.

Não sei se Sócrates tem condições para continuar, sei que há quem o queira afastar para o acusar de ter fugido, quem o queira desonrar para atingir o partido que ganhou as eleições, quem não olhe a meios para ter um presidente, uma maioria e um Governo, com a maioria das Câmaras e a bênção do capital.

O Expresso sairá esta manhã com «As mentiras de Sócrates sobre a compra da TVI» na capa, as televisões e rádios não deixam de o fustigar. A aliança da direita mais dura já não esconde os fios com que tece a teia, os interesses que a alimentam e os homens de mão.

A liberdade de informação está salvaguardada, como se vê, a vingança está em curso e o ódio reforça-se. Aliás, os eleitores já não votam em partidos e nos seus líderes, limitam-se a punir os líderes dos partidos que detestam, votando noutro.

No futuro esta espiral há-de virar-se contra os que nutriram a campanha que começou na alegada homossexualidade de Sócrates, insinuada na televisão, por Santana Lopes (eu vi e ouvi) para nunca mais parar. Os que se alegram hoje com a violação do segredo de justiça encontrarão amanhã pulhas, de partido contrário, que reincidem no crime ao serviço de outros.

Podemos deixar de ter país mas não deixaremos de ter patifes.

Comentários

avoema disse…
Não sei se Sócrates tem pés de barro, mas sei que a montagem dos episódios de "Como destruir um gajo que nos chateia" teve bons argumentistas, embora os realizadores e alguns actores sejam medíocres, servem para que esta saga de "Xutos e Pontapés" faça rir os balofos, desdentados, incultos, incautos, simples, refinados, chico-espertos, os engravatados, os mangas-de-alpaca, os "noblesse oblige", os tristes, um país à beira do "non-sense". A cada murro, a plateia vibra e bate palmas e ficam furiosos de alguns não baterem. Como se isto fosse uma obra digna de prémio

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