O testamento político de D. Luís da Cunha
O luminoso Século das Luzes, o século em que Portugal viveu um dos poucos momentos de elevação política, de desenvolvimento e de progresso sustentado. Tal como alguns monarcas da 1ª dinastia e, principalmente, séculos depois, tal como o grande D. João II, o Maquês de Pombal foi um visionário.
Segue-se nesta hierarquia, Afonso Costa, a alma da República, e o ignorado Mouzinho da Silveira, o grande legislador do liberalismo. As restantes figuras hist+oricas, salvo honrosas exceções, reduziu-se à mediocridade, aquela mediocridade que acabou por moldar um povo atávico e passivo.
(Enviado por Alexandre Castro)
Comentários
Essa edição de 1943 reproduzia, em página interior, a capa da edição original.
Já que não é possível em comentário reproduzir imagens, vou tentar reproduzi-las em post.
Foi neste caldo político e cultural da Europa de setecentos que ocorreu o advento da primeira revolução industrial e se fomentou o aparecimento de novas conceções do comércio nacional e internacional (a globalização daquele tempo). Foi também durante a época do Iluminismo que começaram a surgir, com os enciclopedistas, as novas ideias liberais, abrindo-se assim o caminho para a grande Revolução Francesa.
D. Luís da Cunha, ao propor o nome do futuro Marquês do Pombal ao príncipe herdeiro, D. José, para ministro do Reino, e aconselhando uma investidura com ampla delegação de poderes, estava a sugerir a assunção da figura do “déspota esclarecido”, que, com a razão da Luzes e uma vontade política assente numa férrea autoridade, conduzisse o atrasado e empobrecido Reino pela senda do progresso. E Pombal desempenhou bem esse papel, apesar de ter recorrido a métodos brutais para impor a sua vontade. Mas, com a morte do Rei e com a subida ao trono da beata D. Maria I, o clero e a nobreza – portadores de um atavismo secular, de que ainda hoje sobram resquícios na sociedade portuguesa, impenitentemente avessos ao progresso económico e social, curtos de vista e de inteligência, e avaramente instaladas no cómodo e favorável sistema de rendas, que extorquiam às classes laboriosas – depressa derrubaram Sebastião José de Mello, humilhando-o publicamente, através da sua grotesca exposição aos insultos de uma populaça enfurecida, devidamente açulada dos púlpitos, para o efeito, e acabando por o desterrar para as suas terras de Pombal, onde viria a falecer.
Portugal regrediu novamente, afundando-se no seu endémico e secular marasmo e ostracismo.
O importante texto de D. Luís da Cunha também permite compreender a história política, económica e diplomática do século XVIII, a do Reino e a da Europa. É um documento longo, que se aconselha a ler faseadamente, para, ao mesmo tempo, se poder saborear o magnífico manejo da língua portuguesa por parte do autor, digno herdeiro de Vieira, na elegância e rigor das frases, na lógica discursiva e na profundidade e amplitude das ideias expressas.
Como diplomata, registe-se a sua astúcia e determinação, bem ilustrada no episódio em que o cardeal-ministro Alberoni, de Espanha, lhe voltou ostensivamente as costas durante uma audiência. D. Luís da Cunha não desarmou. Avaliando a fragilidade do governo de Madrid, a braços com um uma guerra com a França, exigiu vigorosamente públicas desculpas pela ofensa feita, na sua pessoa, ao governo de Portugal, e ameaçou com o corte de relações, o que logo foi entendido, pelos espanhóis, como uma ameaça velada ao estabelecimento de uma aliança com a inimiga França. D. Luís da Cunha acabou por obter a retificação do incidente, assim vergando a espinha do cardeal-ministro e domesticando a arrogância da orgulhosa Espanha.
Verney, Ribeiro Sanches, Luís da Cunha e o Marquês do Pombal foram, em Portugal, as figuras marcantes do século das Luzes, figuras estas que, depois, tiveram o seu contrapeso, já no final do século, no sinistro Pina Manique, o célebre Intendente-Geral, que via pedreiros-livres por baixo de todas as pedras das calçadas.