As declarações de Mário Soares foram infelizes e inaceitáveis
«O Presidente Cavaco Silva devia lembrar-se da história do século XX. Por muito menos que isso foi morto D. Carlos, que, aliás, era bon vivant e chamava ao seu país piolheira».
A afirmação faz parte da retórica republicana herdada de Guerra Junqueiro e Afonso Costa, respetivamente um poeta ilustre e o maior vulto da primeira República. Nenhum deles instigou o regicídio cuja sentença foi assinada pelo próprio rei ao apoiar o ignóbil João Franco na ditadura que visava as mais vis intenções e os mais sinistros objetivos.
Seria estultícia, como pretendem os reacionários, ver nas palavras de Mário Soares o acicate à violência ou ao crime e não uma advertência infeliz e inaceitável na forma.
Mário Soares, pela sua dimensão histórica, cívica e intelectual não podia proferir uma tal afirmação. Não é pela frase que Cavaco corre perigo ou passa a ser um presidente isento, capaz e digno, de que o país precisa, mas é uma declaração gratuita de quem tem, como ninguém, o instinto, a cultura e a sagacidade que faltam ao atual Presidente.
A sua dimensão política confere-lhe o estatuto que devia impedi-lo de o colocar ao seu nível, de elevar o atual PR à sua grandeza. As condições dramáticas e a crispação que cresce no País aconselham o papel de bombeiro e não a de aparente incendiário.
Soares, por talento e acaso das circunstâncias, está condenado a ser uma figura maior da nossa História. Cavaco, por mérito próprio e falta de grandeza, está destinado a passar à história como outro Américo Tomás. Com legitimidade eleitoral, o que não é pouco.
Mário Soares voltou a cometer um erro. Errou quando se candidatou contra Cavaco, um erro colossal que deu importância a quem Jorge Sampaio facilmente derrotou. Reincidiu agora com uma frase de dois curtos períodos. Há palavras infelizes, pessoas que não as podem proferir e alturas em que são facilmente criticáveis. Soares sabia o risco e não se conteve. Prestou um mau serviço à democracia. Não há desculpa para a leviandade.
Comentários
Lembro que o tempo, esse cão, também vai deixando marcas nas canelas do Velho.
É essa a lei da vida.
Sem querer desculpar Mário Soares julgo que este estará em sintonia com a maioria dos portugueses: 'a beira de um ataque de nervos' e/ou 'à beira de perder as estribeiras'!