Mesmo na desgraça, faz-nos falta o Eça

Há uma página de Eça em que o romancista descreve uma reunião, num salão burguês. Anunciam-se tragédias naturais na Índia e na China, com muitos milhares de mortos, e pessoas, indiferentes, a jogar cartas. Entre as notícias, cada uma pior do que as outras, alguém informa que a D. Micas teve uma terrível enxaqueca.

Pararam de jogar e rostos ansiosos aguardavam pormenores. Há dois dias que a Micas (já não sei se era este o nome), sofria de uma violenta dor de cabeça. E o pasmo subia com minúcias sobre o início, a continuação e o fim da enxaqueca. Varreu-se a angústia, serenou a ansiedade e os parceiros recomeçaram os jogos, aliviados só quando todos se inteiraram de que a enxaqueca tinha, finalmente, sido vencida.

O critério da proximidade transformava em tragédia uma dor de cabeça e era indiferente aos milhares de mortos que aconteciam noutro continente.

Lembrei-me da difusa recordação de Eça, de que li quase tudo, com a afirmação inédita de um relatório internacional: “FMI diz que banca europeia, em particular a italiana e a portuguesa, representa um risco global”, para a economia.

O FMI esteve em Portugal em 2011 e 2015 e não produziu, por ignorância ou simpatia, esta afirmação catastrófica. Agora, esquece o Deutsche Bank e iclui a Itália e Portugal no risco global pelo “crédito malparado”.

Em Itália, o valor cifra-se em 360 mil milhões de euros em Portugal em 20 mil milhões (números do FMI). Há qualquer coisa que não entendo.

Quando eu era criança, morreu no rio Coa, afogado, um rapaz de 19 anos. Uma vizinha foi confortar a mãe e abraçando-a, para a consolar, foi-lhe dizendo “Tudo são desgraças, a si morreu-lhe um filho, a mim a cabra».

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