E se o PS se fragmentar? E porque não?
As recentes intervenções públicas de Manuel Alegre têm criado na opinião pública a ideia de que poderia haver uma fragmentação do PS e um salto em frente de Manuel Alegre e de alguns sectores esquerdistas do PS para a formação de um novo partido, ou de aproximação ao BE.
No Ponte Europa, Carlos Esperança e André Pereira têm alertado para os riscos de tal atitude. Também no Causa Nossa, Vital Moreira tem reagido veementemente contra tal perspectiva. O argumento central é que tal fragmentação fragilizaria as possibilidades de governação por parte da esquerda portuguesa.
Seria no entanto necessariamente má a fragmentação do PS para os valores da esquerda portuguesa e para a política portuguesa em geral? Seriam as consequências de uma refundação político-partidária em Portugal? Vamos por partes.
No actual status quo, existe um Governo de maioria absoluta do PS. O sector dominante no PS, chefiado por José Sócrates, propugna, no plano teórico, uma versão bastante liberal (no sentido económico) da social-democracia, muito próxima do new labour, e com algumas ambições até agora não materializadas de social-democracia escandinava. No plano prático deixa-se ficar por uma política liberal no plano económico, continuando a privilegiar o grande capital, modernizadora no plano administrativo, moderadamente evolutiva no plano social e de costumes, mas omissiva quanto às grandes bandeiras da esquerda em geral, e da social-democracia em especial: a da redução das desigualdades. Ou seja, dificilmente se poderão qualificar como de esquerda os seus resultados práticos. O PSD, partido tudo menos social-democrata, está temporariamente fora de combate, partilhando com a clique dominante no PS essencialmente os mesmos valores políticos (o centrão dos jobs for the boys e o favorecimento dos interesses do grande empresariado). O CDS também agoniza, agora meramente reduzido ao seu caudilho e alguns sequazes, sem qualquer outro objectivo que não seja alapar oportunisticamente noutro partido que se encontre em necessidade de um parceiro de coligação, sem outra ideologia senão aquela que lhe permita chegar ao poder. O BE e o PCP continuam disputando o espaço da esquerda de resistência entre si, e recusando qualquer aproximação ao PS- também por motivos lógicos, uma vez que os valores liberais da ala direita do PS, a que está agora no poder, são irreconciliáveis com os valores do BE ou do PCP.
Desde a implosão do PRD após as eleições de 1987 que o mapa político é extremamente estático, com poucas oscilações, sendo o poder político partilhado entre a ala direita do PS e o PSD, o que muito tem contribuído para o vácuo ideológico da política portuguesa com chances de acesso ao Governo, bem como ao constante aprofundamento das desigualdades em Portugal.
Há quem entenda que as maiorias absolutas são preferíveis aos Governos de coligação. Eu entendo o contrário (apesar de reconhecer que por vezes as coligações possam criar vários casos de crise política): entendo que um país só pode ter um bom Governo se for trans-partidário, em que os interesses do partido não se confundam com os interesses do Governo, e em que o Parlamento não seja uma mera relé, uma mera correia de transmissão das decisões tomadas pelo Governo.
Uma refundação da esquerda portuguesa poderia apresentar vantagens para a prossecução dos objectivos da esquerda portuguesa. Por um lado, ao reintroduzir as preocupações ideológicas de novo na agenda do poder, atraindo quadros qualificados da sociedade civil e que hesitam em se introduzir nos pantanosos campos da tecnocracia político-partidária. Por outro lado, mitigando a promiscuidade entre antigos governantes e grandes interesses económicos. E finalmente por dar liberdade de escolha aos eleitores, que terão a liberdade de poder votar numa determinada tendência política sem a coacção de um voto útil num PS liderado pela sua ala direita para prevenir o risco de um triunfo do PSD. Uma estrutura política dinâmica permite maior mobilidade de quadros na política, contribuindo para diminuir o endémico clientelismo, caciquismo, promiscuidade e usurpação do aparelho do Estado e da administração pública pelos partidos do "centrão". Uma estrutura política dinâmica permite maior qualidade de governança e maior flexibilidade de adaptação aos desafios da convergência, da qualificação, da redução das desigualdades, e para uma melhor e mais alargada participação dos cidadãos na gestão da coisa pública. Contribui para uma democracia com mais qualidade.
Obviamente que as mutações e refundações do sistema partidário têm sempre os seus riscos (veja-se o caso de Itália...). No entanto, eu pessoalmente preferiria ter a possibilidade de votar num partido que se colocasse entre o PCP, o BE e o PS/Direita, que tivesse uma quota de votação na casa dos 10%, e que forçasse um PS em busca de parceiro de coligação à adopção de verdadeiras políticas de esquerda. Ou a possibilidade de votar num BE que fosse menos radical e mais responsável. Agora votar num PS com etiquetas trocadas, só por ser um mal menor comparado com o PSD, é algo que sempre fará muita confusão aos eleitores de esquerda moderada. Será que o PS actual tem verdadeiramente as credenciais necessárias para justificar esse voto útil? Daí muita abstenção, desilusão com o estado da política e desmotivação de muitos quadros qualificados da sociedade civil que se situam nesse quadrante ideológico.
No Ponte Europa, Carlos Esperança e André Pereira têm alertado para os riscos de tal atitude. Também no Causa Nossa, Vital Moreira tem reagido veementemente contra tal perspectiva. O argumento central é que tal fragmentação fragilizaria as possibilidades de governação por parte da esquerda portuguesa.
Seria no entanto necessariamente má a fragmentação do PS para os valores da esquerda portuguesa e para a política portuguesa em geral? Seriam as consequências de uma refundação político-partidária em Portugal? Vamos por partes.
No actual status quo, existe um Governo de maioria absoluta do PS. O sector dominante no PS, chefiado por José Sócrates, propugna, no plano teórico, uma versão bastante liberal (no sentido económico) da social-democracia, muito próxima do new labour, e com algumas ambições até agora não materializadas de social-democracia escandinava. No plano prático deixa-se ficar por uma política liberal no plano económico, continuando a privilegiar o grande capital, modernizadora no plano administrativo, moderadamente evolutiva no plano social e de costumes, mas omissiva quanto às grandes bandeiras da esquerda em geral, e da social-democracia em especial: a da redução das desigualdades. Ou seja, dificilmente se poderão qualificar como de esquerda os seus resultados práticos. O PSD, partido tudo menos social-democrata, está temporariamente fora de combate, partilhando com a clique dominante no PS essencialmente os mesmos valores políticos (o centrão dos jobs for the boys e o favorecimento dos interesses do grande empresariado). O CDS também agoniza, agora meramente reduzido ao seu caudilho e alguns sequazes, sem qualquer outro objectivo que não seja alapar oportunisticamente noutro partido que se encontre em necessidade de um parceiro de coligação, sem outra ideologia senão aquela que lhe permita chegar ao poder. O BE e o PCP continuam disputando o espaço da esquerda de resistência entre si, e recusando qualquer aproximação ao PS- também por motivos lógicos, uma vez que os valores liberais da ala direita do PS, a que está agora no poder, são irreconciliáveis com os valores do BE ou do PCP.
Desde a implosão do PRD após as eleições de 1987 que o mapa político é extremamente estático, com poucas oscilações, sendo o poder político partilhado entre a ala direita do PS e o PSD, o que muito tem contribuído para o vácuo ideológico da política portuguesa com chances de acesso ao Governo, bem como ao constante aprofundamento das desigualdades em Portugal.
Há quem entenda que as maiorias absolutas são preferíveis aos Governos de coligação. Eu entendo o contrário (apesar de reconhecer que por vezes as coligações possam criar vários casos de crise política): entendo que um país só pode ter um bom Governo se for trans-partidário, em que os interesses do partido não se confundam com os interesses do Governo, e em que o Parlamento não seja uma mera relé, uma mera correia de transmissão das decisões tomadas pelo Governo.
Uma refundação da esquerda portuguesa poderia apresentar vantagens para a prossecução dos objectivos da esquerda portuguesa. Por um lado, ao reintroduzir as preocupações ideológicas de novo na agenda do poder, atraindo quadros qualificados da sociedade civil e que hesitam em se introduzir nos pantanosos campos da tecnocracia político-partidária. Por outro lado, mitigando a promiscuidade entre antigos governantes e grandes interesses económicos. E finalmente por dar liberdade de escolha aos eleitores, que terão a liberdade de poder votar numa determinada tendência política sem a coacção de um voto útil num PS liderado pela sua ala direita para prevenir o risco de um triunfo do PSD. Uma estrutura política dinâmica permite maior mobilidade de quadros na política, contribuindo para diminuir o endémico clientelismo, caciquismo, promiscuidade e usurpação do aparelho do Estado e da administração pública pelos partidos do "centrão". Uma estrutura política dinâmica permite maior qualidade de governança e maior flexibilidade de adaptação aos desafios da convergência, da qualificação, da redução das desigualdades, e para uma melhor e mais alargada participação dos cidadãos na gestão da coisa pública. Contribui para uma democracia com mais qualidade.
Obviamente que as mutações e refundações do sistema partidário têm sempre os seus riscos (veja-se o caso de Itália...). No entanto, eu pessoalmente preferiria ter a possibilidade de votar num partido que se colocasse entre o PCP, o BE e o PS/Direita, que tivesse uma quota de votação na casa dos 10%, e que forçasse um PS em busca de parceiro de coligação à adopção de verdadeiras políticas de esquerda. Ou a possibilidade de votar num BE que fosse menos radical e mais responsável. Agora votar num PS com etiquetas trocadas, só por ser um mal menor comparado com o PSD, é algo que sempre fará muita confusão aos eleitores de esquerda moderada. Será que o PS actual tem verdadeiramente as credenciais necessárias para justificar esse voto útil? Daí muita abstenção, desilusão com o estado da política e desmotivação de muitos quadros qualificados da sociedade civil que se situam nesse quadrante ideológico.
Comentários
Quanto à redução das desigualdades, esse é um mito... Desde 2005 tem-se conseguido reduzir - significativamnete - as desigualdades e diminuir a pobreza!
Subsídios aos idosos, rendimento social de inserção, aumento do Salário míninmo, o SNS a funcionar com mais credibilidade, a escola pública a tempo inteiro e com mais qualidade...
NA Alemanha e na Áustria, o reforço dos extremos (na Alemanha, à esquerda), na Áustria, À direita, só levou à "grande Coligação". Não vejo nenhuma razão para que isso não acontecesse em Portugal...
E não se diga que Sócrates não muda de rumo ou que é teimoso. Se soubermos ler o que se vai passando, ele sabe ir mudadno o rumo quando vê que está a ir por maus caminhos e já várias vezes Manuel Alegre, Mário Soares e muitos outros o ajudaram a emendar a mão.
Se Ana Gomes não vai na lista de deputados, isso é uma péssima notícia. Péssima! E que sairá caro a José Sócrares!
As coligações no seio da Esquerda, nesta Europa histórica e ancestral e civilizacional, estão condenadas.
A Esquerda dividiu-se à muito tempo em dois caminhos completamente divergentes:
Um deu origem à extinta União Soviética, outro às sociais-democracias europeias.
Os partidos social-democratas só se coligam com partidos à sua esquerda se estiverem extremamente debilitados.
E quando o fazem, como sucedeu na Suécia, com a coligação do Partido Social-democrata, os Verdes e o Partido de Esquerda, este último, entrou em convulsão interna, desmembrou-se e deixou de ter qualquer utilidade em termos de Poder.
De certo modo, estamos condicionados por estes dilemas e, essencialmente, por mêdos.
Em Portugal, tomando por exemplo outro sector político, vimos o CDS, depois da sua coligação com o PSD (governos de Barroso e Santana Lopes) ficar de rastos. Basta recordar a confusão que estabeleceu com a substituição de Portas por Ribeiro e Castro e as intrigas permanentes que surgiram à volta da liderança.
Hoje, os caminhos políticos que foram trilhados pela Europa no século XX já não têm razão em prevalecer.
A experiência soviética morreu de morte súbita e deixou como herdeiros aberrações como a Coreia do Norte e a hetrodoxia chinesa rumo ao capitalismo de Estado. Pouco, ou praticamente nada, restou.
As sociais-democracias não conseguem, senão pontualmente, agrupar o pleno da Esquerda. Caminharam demasiado para o Centro em nome da globalização. Isto é, tomaram como certo que o Mundo seria, politicamente globalmente de Direita.
Ou, se quisermos ser mais comedidos, predominantemente de Direita. Este embuste, somado as reticências das coligações, aos falhanços das soluções frentistas da primeira metade do séc. XX, mantêm a Esquerda manietada e receosa em relação a qualquer mudança.
Entrou-se no domínio das fidelidades caninas, do carreirismo, da preponderância do aparelho partidário, e pouco importa as questões ideológicas. Quem as levantas ou as esgrime é sistematicamente excluído.
O neo-liberalismo esmagou as outras alternativas políticas!
Pior travestiu a política.
A Direita, o Centro e, inclusive, o Centro Esquerda (será a Esquerda moderada?) tornaram-se seus reféns, nomeadamente, nas políticas económicas, quando não adoptaram a sua insensibilidade social, em nome de exigências orçamentais.
Em Portugal foi preciso um Presidente da República advertir que "há mais vida para além do orçamento"...
Esta chamada de atenção é uma oportuna chamada de atenção para os danos das políticas sociais neo-liberais.
Muitos políticos deste fatal neo-liberalismo, incluindo a Esquerda moderada, quer pelo vazio de convicções, quer pela ansia de enriquecer, estão no centro das atenções pelos piores motivos.
Agora, o neo-liberalismo, que necessariamente está enfraquecido e abalado pela crise económico-financeira mundial que provocou, não será tempo de deixar de lado velhas questiúnculas e trabalhar politicamente essa maioria sociológica de Esquerda que é diariamente confrontada com autoritarismos, auto-suficiências e sectarismos?
Ou vamos desperdiçar esta oportunidade?
No fundo, esta é a impotência da Esquerda em promover a sua mudança rumo ao exercício do Poder. Não podemos ficar prisioneiros da maioria absoluta do PS para a Esquerda chegar ao Poder. Até porque, as maiorias absolutas, em Países com o método de Hondt, como Portugal, são mais a excepção do que a regra.
Não podemos viver sempre à pala disso!
Sucede às vezes escrever assim:
"A Esquerda dividiu-se à muito tempo em dois caminhos completamente divergentes:..."
e, não, como se devia:
"A Esquerda dividiu-se, há muito tempo, em dois caminhos completamente divergentes:..."