Manuel Alegre e o PS
No período de profunda incerteza económica e previsíveis confrontos sociais o pior que pode acontecer ao país é a paralisação do Governo graças à fragmentação do PS.
É perigoso cavalgar a onda do descontentamento sem projectos políticos alternativos, alimentando ressentimentos em clima de instabilidade social e na ausência de recursos para corresponder a expectativas criadas.
Se a crise tivesse outra origem, a direita estaria a capitalizar o descontentamento. Assim, perante a falência do neoliberalismo, vieram parar à esquerda as esperanças e angústias de parte significativa do eleitorado, como mostram as sondagens. Temo que o PCP, o BE, a Refundação Comunista e os dissidentes do PS, com fortes divergências entre si, unidos apenas por sólidos rancores, em vez de serem alternativa ao PS, por ausência de programa comum e de modelo credível, possam tornar-se aliados objectivos da direita.
Manuel Alegre defendeu no Fórum esquerdas que "É preciso quebrar outro tabu: a ideia de que há uma esquerda de governo que, quando chega ao Governo, não pratica assim muito à esquerda, e há as outras esquerdas que se refugiam no contrapoder. Esse é o grande tabu que é preciso ultrapassar". Penso que é preciso quebrar outros tabus: a ideia de que o contrapoder é sempre de esquerda e ter medo de desmascarar os que nele se refugiam sem se sentirem obrigados a apresentar alternativas, incluindo Alegre.
No passado saíram goradas as tentativas de fazerem do PS o que os seus militantes e o eleitorado recusaram. Manuel Serra, primeiro, e, depois, sucessivamente, Carmelinda Pereira e Aires Rodrigues, e ainda, Lopes Cardoso não conseguiram alterar a matriz social-democrata do partido que, com Mário Soares, salvou Portugal da bancarrota com a humilhante aliança à direita. Foi a vitória do pragmatismo contra os princípios?
Manuel Alegre não tem a grandeza política e a humildade de Salgado Zenha nem a preparação de Lopes Cardoso, podendo tornar-se num Santana Lopes da esquerda, triste epílogo para o seu passado e a sua dimensão cultural e literária.
O combate contra a co-incineração, birra de sabor bairrista, sem consistência científica, foi uma batalha infeliz que embaraçou o PS e, sobretudo, lesou o País. Manuel Alegre devia lembrar-se dessa inglória e funesta escaramuça. Se pensar mais no país, e menos em si próprio, é dentro do PS que deve lutar, sem quebra da solidariedade que lhe deve.
O PS não é o que eu desejaria mas, visto de fora, nunca o conheci diferente. Admira-me que, quem está dentro, só agora veja que é tempo de o partido ser o que nunca foi e o que nunca será enquanto os partidos à sua esquerda o considerarem o inimigo principal.
Ponte Europa/SORUMBÁTICO
Comentários
O período de profunda incerteza que se avizinha sofre com uma eventual paralisação do Governo, mas não só.
Não podemos defender que, perante a crise, a resposta seja uma fuga em frente! O que está feito está e não há nada a mudar.
Esta crise, não criada pela Esquerda, exige uma resposta de Esquerda.
Não é isso que se observa.
Ontem, José Socrates, no jantar de Natal do Grupo Parlamentar do PS, definiu o Partido como:
"um partido popular da esquerda moderada".
Uma frase lapidar, com a mesma vacuidade que a malograda 3ª via de Tony Blair e susceptível de ser subscrita por muita gente do PSD.
É esta ausência de diferenciação ideológica que, Manuel Alegre, já critica, por todo o lado: fora e dentro do Partido.
A exclusão da deputada Ana Gomes às proximas listas do PS ao Parlamento Europeu, é bem claro, sobre as inflexões internas. A linha "José Lello & Cia" vem marcando pontos na dinâmica interna e formatando a imagem do Partido.
Por outro lado, a Esquerda ou se entende como plural e diversificada em opções políticas, mas com imensos pontos de convergência, ou se cultiva um inevitável e um não ultrapassável parasitismo à volta do PS.
De facto, no Forum das Esquerdas, o que de mais importante disse Alegre foi:
"Ninguém é dono da Esquerda!"
No próximo Congresso do PS, já que não está em discussão a liderança, vamos ver qual a prioridade: abortar a discussão mantendo o pragmático status quo, se há coragem política para encetar um aberto diálogo ideológico.
Quem conhece a história da Esquerda - e quem como eu está de fora - sabe que, ao longo do seu transito histórico, existiram muitos "desvios de direita".
O PS estará, exactamente, nessa situação.
Com que direito nós, que não estamos matriculados no PS, podemos exigir que ele seja o que não quer?
Há outros partidos, à esquerda, onde podemos acolher-nos. Mas será que há algum que queira ser poder?
Ou, querendo, que modelo teríamos?
É claro que a linha política do PS é definida pelos seus militantes. Eu não estou a exigir nada!
Só que, depois, é preciso ter recato quando se apela à esquerda, ou mais abrangentemente, aos cidadãos, para um voto útil no PS, sentido de reconquistar a maioria absoluta.
Não sendo obrigado a pertencer a qualquer partido, essa situação não me impede de estar atento ao PS, e naturalmente, a todos que actuam no espaço político português.
Não posso estar mais de acordo e muito me aflige esta dimensão suicidária da "esquerda radical" que não vê mais do que a próxima hora, o minuto seguinte.
Portugal como projecto-nação nunca teve dimensão para fazer nem a revolução agrícola, ou a industrial. Sempre usou de subterfúgios coloniais e religiosos para manter umas elites de cuja má memória não se cansam de nos lembrar.
Um país onde foi a Inquisição e uns reis analfabetos que reinaram durante pelo menos 5 séculos, onde actualmente a pirâmide etária constitui só por si uma inviabilidade economioco-social, não permite leviandades de "tudo ou nada", de "revolução já!" ou de outras cenas semelhantes.
O único risco será sempre o dos fantasmas da direita trauliteira, neo-liberal e conservadora, aliada de sempre da ICR.
O PS não é excelente? Experimentem a direita trauliteira !
MFerrer
Por outro lado, parece-me impossível qualquer aliança do PS com os partidos que se dizem à sua esquerda: com o PC é impossível porque continua a ser um partido estalinista, que só se "alia" com partidos insignificantes como Os Verdes, e nunca com um partido mais forte que ele; com o Bloco também não, porque é manifestamente um partido com vocaçãó unicamente para contrapoder. O que interessa é o ELEITORADO de esquerda, que o PS tem de disputar a esses partidos, mostrando que é um partido de esquerda mais viável que os outros.
Políticas de esquerda:
Complemento solidário para idosos:Querem melhor política de combate à pobreza do que esta?
Aumento do salário mínimo: Outra política de combate à pobreza que não poderia ser mais de esquerda
Valorização da escola pública a favor dos alunos e pais: Vejam em que estado estava a escola pública, já se falava na sua falência eminente. E agora? Alargamento de horários, aulas de substituição, acção social escolar (Passe escolar)
Salvação do SNS: Que partido teria coragem para o salvar e o manter na esfera pública no seu espírito constitucional
Desburocratização da administração
Lembram-se de um dos lemas do socialismo democrático? Igualdade, poIs foi isso que aconteceu com a uniformização dos regimesde ss público e privado. Quem lutou pela manutenção das diferenças? A esquerda radical.
Outra política histórica: Salvação do Sistema de Segurança Social. Quem foi ferozmente contra? A esquerda radical.
Há uma diferença entre a poesia e a realização: Os factos
Há muita gente que não gosta de José Sócrates, pois eu atrevo-me a dizer que foi ele quem melhor interpretou e realizou políticas de esquerda em Portugal. PORQUE PENSOU NO FUTURO E NO PAPEL DO ESTADO E SALVOU A IDIOLOGIA SOCIALISTA E POLÍTICAS SOCIALISTAS!
Se fizermos um balanço global destes 4 anos, em aspectos sensíveis das políticas de esquerda, temos que dizer que foram dados muitos passos em frente com o projecto e a actuação de Sócrates.
Infelizmente o crescimento e conómico é débil e anémico, mas nem tudo depende do Governo...