O que se diria...


Se um Governo do PS tivesse aberto concurso para dois canais televisivos e, por acaso, fossem atribuídos um a um antigo primeiro-ministro socialista e outro à Maçonaria;

Se um PR, oriundo do PS, vetasse uma lei do pluralismo e da não concentração dos meios de comunicação social, impedindo um pasquim dócil de receber milhões de euros do Governo dos Açores, por exemplo, e outro, de um concelho continental, de sobreviver à custa da Câmara Municipal;

Se Mário Soares, perante uma votação unânime da Assembleia da República bradasse contra a má qualidade da lei e advertisse contra o seu carácter injusto;

Se Sócrates tivesse comprado acções do BPN e realizado interessantes mais valias, ele e o filho mais velho, no mesmo dia, sem que a comunicação social inquirisse como foi definido o valor de acções não cotadas em bolsa, quem era o gestor de conta ou quem os aconselhou, a ele e ao filho, a investir;

Se Jorge Sampaio ou Mário Soares tivessem acumulado reformas do Estado enquanto foram Presidentes da República;

Se Jorge Sampaio tivesse presidido à comissão de honra da beatificação de Alexandrina de Balasar por ter resistido “13 anos e sete meses em completo jejum e total anúria”, alimentando-se apenas de hóstias consagradas;

Se antigos membros de Governos do PS estivessem implicados nos escândalos do BCP, BPN e BPP, em número e qualidade suficientes para um elenco governamental;

Se um director da PJ, nomeado pelo PS, fosse a principal fonte da fuga de informações e de violação do segredo de justiça para destruir a carreira política de M. Ferreira Leite, associando-a a um bando de proxenetas;

Se este Governo, em vez de destinar verbas para um aeroporto internacional e o TGV adjudicasse submarinos (um para subir, outro para descer) a fim de vigiar pescadores furtivos e defender as costas portuguesas de barcos municiados com pílulas abortivas;

Se…, se…, se… o PS teimar em ser Governo surgirá um chefe de gabinete de Manuela Ferreira Leite a reunir com um procurador e algum elemento da PJ para combinar uma carta anónima a denunciar Sócrates nas casas de Berlusconi onde se desloca no avião oficial para orgias com menores. E, cada semana, será constituído arguido um novo piloto suspeito de o ter conduzido à Sardenha.

etc., etc., e tal.
Ponte Europa / Sorumbático

Comentários

Rui Cascao disse…
Também não me parece que o PS seja uma escola de formação de anjos...
e-pá! disse…
Caro CE:

Embora frequentemente referido com um fazedor de retratos de 'políticos', mais do que de 'políticas', Eça usou o exagero e a caricatura para esboçar situações e esculpir perfis de personagens.

Eça viveu um tempo com alguma similitude com o actual.
O progressivo conhecimemto de actividades escandalizaram a nação - essencialmente orientados pelos insondáveis interesses pessoais e económicos - reflectia um dos factos que nos sugere a política de hoje: a convicção da impunidade dos abusos, do não desmascaramento das prevaricações, o 'triunfo' das insidiosas perfídias, e o perfume das preocupações éticas distantes que na altura se apodavam de 'imoralidades'...

Estou a recordar-me de "O Conde d’Abranhos" que com a sua audácia e irreverência é um referencial de um períodp de conturbada vida política - o estertor da monarquia - chegou aos nossos dias mantendo uma actualidade da mordacidade crítica e um exímio exercício da sátira.
O 'post' ... "O que se diria..." mais uma vez provocou-me e transportou-me - como sugere frequentemente a muitos portugueses - em diferentes estadios da nossa evolução política, à época queiroziana.

E, sendo assim, não resisto em reproduzir um texto de Eça de Queiroz, publicado no jornal 'Distrito de Évora', na segunda metade do século XIX.

Política de Interesse

"Em Portugal não há ciência de governar nem há ciência de organizar oposição. Falta igualmente a aptidão, e o engenho, e o bom senso, e a moralidade, nestes dois factos que constituem o movimento político das nações.
A ciência de governar é neste país uma habilidade, uma rotina de acaso, diversamente influenciada pela paixão, pela inveja, pela intriga, pela vaidade, pela frivolidade e pelo interesse.
A política é uma arma, em todos os pontos revolta pelas vontades contraditórias; ali dominam as más paixões; ali luta-se pela avidez do ganho ou pelo gozo da vaidade; ali há a postergação dos princípios e o desprezo dos sentimentos; ali há a abdicação de tudo o que o homem tem na alma de nobre, de generoso, de grande, de racional e de justo; em volta daquela arena enxameiam os aventureiros inteligentes, os grandes vaidosos, os especuladores ásperos; há a tristeza e a miséria; dentro há a corrupção, o patrono, o privilégio. A refrega é dura; combate-se, atraiçoa-se, brada-se, foge-se, destrói-se, corrompe-se. Todos os desperdícios, todas as violências, todas as indignidades se entrechocam ali com dor e com raiva.
À escalada sobem todos os homens inteligentes, nervosos, ambiciosos (...) todos querem penetrar na arena, ambiciosos dos espectáculos cortesãos, ávidos de consideração e de dinheiro, insaciáveis dos gozos da vaidade."
andrepereira disse…
Muito bem! Análise certeira de Esperança, é-pá e Eça. O domínio avassalador da direita sobre os media e o duplo critério de avaliação está a corroer a democracia. Cavaco Silva, sobretudo, tem vindo a ser sucessivamente poupado pelos contemporâneos. Mas os futuros historiadores dirão de sua justiça.
Mano 69 disse…
«Mas os futuros historiadores dirão de sua justiça.»

A teoria da história é um ramo do conhecimento que procura compreender as diversas formulações do conhecimento histórico. Existindo várias teorias como sejam o Positivismo; a escola dos Annales (França); a Nova História; a Micro-História; a História Marxista, etc..

Agora também vamos ter a História Socialista do Sr. Pereira.

Por acaso você não se quer candidatar à presidência da câmara Coimbrã? Estou disponível para promover uma vaca de fundo!
Sepúlveda disse…
Este comentário foi removido pelo autor.
Sepúlveda disse…
Interessante verificar que a uma acusação ao PS/governo de fazer algo errado, a resposta tem sido "vocês também fizeram isto e aquilo". Ou seja, não é que não se faça coisas erradas, é sim que se os outros fizeram antes então os actuais também podem.
Muito provavelmente passar-se-á o mesmo num sistema invertido PSD/governo e PS/oposição. Seja como for, espero que "eventualmente" algum desses se lembre de travar esta tradição.

PS e PSD são muito mais parecidos do que parece e do que se quer acreditar.

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