Greves de juízes
A greve de juízes é tão surrealista como a exótica Associação Sindical de Juízes (ASJ) – pseudónimo do sindicato –, que a convocou.
Com o pretexto da falta de independência, que alegadamente ameaça os tribunais, a ASJ não conseguiu disfarçar os interesses corporativos que a movem. Deviam os juízes ter-se recusado a julgar em causa própria.
A redução das férias visou tão-somente harmonizar de forma equitativa o período anual de descanso dos servidores do Estado e o encurtamento das férias judiciais não atingiu apenas os juízes.
O fim do generoso subsistema de saúde do ministério da Justiça não foi um acto hostil. Era um privilégio que acabou porque o Estado não pode conceder regalias diferentes consoante os ministérios. A harmonização é uma exigência ética.
Há outros benefícios a extinguir em diversos serviços públicos. Não podendo o orçamento generalizá-los, mal se compreende que continuem a bafejar só alguns.
O congelamento dos suplementos remuneratórios e das progressões automáticas de carreiras desagradou aos juízes. Mas poderiam eles constituir excepção, em tempo de crise, quando a medida afectou todos, dos funcionários mais modestos aos autarcas, deputados e membros do Governo?
Não há democracia sem juízes independentes. Mas onde interferem os privilégios perdidos ou congelados com a independência? Já as ameaças e insinuações do presidente da ASJ põem em causa a serenidade e imparcialidade que se espera dos juízes.
A greve comprometeu o regular funcionamento do Estado e transformou titulares de um órgão de soberania em meros funcionários que, se não cumprissem os serviços mínimos, não poderiam queixar-se da requisição civil.
A Justiça passa por uma fase difícil. A morosidade, prescrições e decisões contraditórias confundem os leigos. As próprias sentenças são objecto de escrutínio dos cidadãos e da avidez da comunicação social.
Foi neste período, de forte contestação social, que o poder judicial comprometeu o prestígio, tornando-se um alvo vulnerável e deixando-se enredar na onda de descrédito que varre diversas instituições do Estado.
Esta greve não deixou espaço ao Governo para recuar nem à opinião pública para a compreender.
O que sucederia se, por absurdo, se criasse a Associação Sindical de Testemunhas (AST), com todos os cidadãos que diariamente vêem as suas vidas perturbadas para cumprir o dever cívico de colaborar com os Tribunais, sem qualquer indemnização, e a AST decretasse uma greve de duração indeterminada?
Os juízes respeitariam o direito à greve ou aplicariam as sanções previstas?
As posições radicais, ao melhor estilo de um sindicato de metalúrgicos, afectaram o prestígio da classe. A duvidosa legalidade da greve e o estilo provocatório e arrogante com que a ASJ contestou o Governo, cujas medidas podem ser erradas mas a que não falta legitimidade democrática, só podem ter contribuído para denegrir a imagem da Justiça e debilitar o Estado de direito de que os juízes são garante.
Com o pretexto da falta de independência, que alegadamente ameaça os tribunais, a ASJ não conseguiu disfarçar os interesses corporativos que a movem. Deviam os juízes ter-se recusado a julgar em causa própria.
A redução das férias visou tão-somente harmonizar de forma equitativa o período anual de descanso dos servidores do Estado e o encurtamento das férias judiciais não atingiu apenas os juízes.
O fim do generoso subsistema de saúde do ministério da Justiça não foi um acto hostil. Era um privilégio que acabou porque o Estado não pode conceder regalias diferentes consoante os ministérios. A harmonização é uma exigência ética.
Há outros benefícios a extinguir em diversos serviços públicos. Não podendo o orçamento generalizá-los, mal se compreende que continuem a bafejar só alguns.
O congelamento dos suplementos remuneratórios e das progressões automáticas de carreiras desagradou aos juízes. Mas poderiam eles constituir excepção, em tempo de crise, quando a medida afectou todos, dos funcionários mais modestos aos autarcas, deputados e membros do Governo?
Não há democracia sem juízes independentes. Mas onde interferem os privilégios perdidos ou congelados com a independência? Já as ameaças e insinuações do presidente da ASJ põem em causa a serenidade e imparcialidade que se espera dos juízes.
A greve comprometeu o regular funcionamento do Estado e transformou titulares de um órgão de soberania em meros funcionários que, se não cumprissem os serviços mínimos, não poderiam queixar-se da requisição civil.
A Justiça passa por uma fase difícil. A morosidade, prescrições e decisões contraditórias confundem os leigos. As próprias sentenças são objecto de escrutínio dos cidadãos e da avidez da comunicação social.
Foi neste período, de forte contestação social, que o poder judicial comprometeu o prestígio, tornando-se um alvo vulnerável e deixando-se enredar na onda de descrédito que varre diversas instituições do Estado.
Esta greve não deixou espaço ao Governo para recuar nem à opinião pública para a compreender.
O que sucederia se, por absurdo, se criasse a Associação Sindical de Testemunhas (AST), com todos os cidadãos que diariamente vêem as suas vidas perturbadas para cumprir o dever cívico de colaborar com os Tribunais, sem qualquer indemnização, e a AST decretasse uma greve de duração indeterminada?
Os juízes respeitariam o direito à greve ou aplicariam as sanções previstas?
As posições radicais, ao melhor estilo de um sindicato de metalúrgicos, afectaram o prestígio da classe. A duvidosa legalidade da greve e o estilo provocatório e arrogante com que a ASJ contestou o Governo, cujas medidas podem ser erradas mas a que não falta legitimidade democrática, só podem ter contribuído para denegrir a imagem da Justiça e debilitar o Estado de direito de que os juízes são garante.
Comentários
Já mandei o Lech Walesa "falar" consigo...
Hoje os juizes nao passaram de mais uns funcionarios judiciais e se sao funcionarios como os outros têm de aguentar como os outros, os que pagam ao padeiro.
Prevejo uma greve dos administradores exonerados da refer e da cp para breve...ui que medo desta malta que andou anos a mamar à grande num país pequeno.
Então o Sr. agora percebe ou não que os tribunais não são órgãos de soberania?
O Sr. tem é de tirar as palas, para ver melhor.
O VB já se justificou?
Qual é o próximo "golpe" do grupo do Trianon?
Depois de ter publicado este texto, lembrei-me de o mandar para algus jornais.
Vem hoje publicado, em destaque, no DN (Tribuna do leitor).
Obrigado pela correcção.
Não consigo emendar o lapso. O texto refere «juízes» várias vezes. Creio que, com o frio, não carreguei na tecla do acento agudo.
E não consigo emendar.
Foi um lapso meu, que assumo, não sem no entanto lhe dizer que não teria sido a primeira vez que o frio lhe teria toldado os dedos.
Coisas da vida...
Zé do Boné
O frio não tolda, tolhe.
«Juízes» está com o respectivo acento agudo sem ter necessidade de emendar.
E garanto ao Zé do Boné que não sou um prevaricador ortográfico, apesar das dificuldades dactilográficas.
Espero é não ficar tolhido ao ler o seu texto mais uma vez e concomitantemente toldado pela comoção.
Um abraço
RE: Os órgãos da soberania são o Presidente da República, Governo, Asembleia da República e os Tribunais».
No meu tempo, isso aprendia-se no 7.º ano dos liceus, na disciplina de Organização Politica e Administrativa da Nação.
Apenas a AR se chamava Assembleia Nacional e os Tribunais não eram independentes (havia os Tribunais Plenários) e o PR era um lacaio do Salazar.
Sou mesmo eu.